Crônica da Cidade

Crônica da Cidade

O Simples Complicado

Aureliano Neto*

Não era dia de sol nem de chuva. Nublado. Com alguns tímidos raios solares a chegarem com intermitência, com aspecto marrento de quem não estava gostando de ser. As pessoas vinham ou passavam sem dar-se conta de nada disso. Pouco lhes interessava a fisionomia agradável ou não daquela manhã. Ele chegou para reclamar, mas com ar voltado para dentro de si mesmo. Preocupado em ter vindo buscar lã e não sair, no final de tudo, tosquiado. A sua demanda, no seu modo de ver, tinha sentido. Já consultara alguém, um amigo habituado ...

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SIOGE Era uma Festa

Aureliano Neto*

Garoto. Calças curtas. O bonde era o transporte utilizado por muitos, dos mais pobres aos remediados. Também a caminhada, sem tanta pressa. Da Praça do Cemitério, depois da Saudade, ao Mercado Central, ia-se batendo as canelas. Mesmo de alguns dos bairros periféricos ao centro. A cidade não era tão grande, a não ser quando se ia para o Monte Castelo, Cavaco, João Paulo ou Anil. Lugares considerados distantes. Pegava-se o bonde, ou os escassos ônibus, que faziam linhas. Mas o bonde era essencial e preferido, porquanto arejado, com ar de tranqüilidade, sem ...

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Mercado da Vida

Aureliano Neto*

Ele espera casar o mais rápido possível. De forma afoita, com grande esperança, reverbera a sua ânsia casamenteira, em repetição exaustiva, aos que lhe são mais próximos: - O quanto antes, quero casar. Para realizar seu sonho, sai à procura de uma parceira, - bem, sem distinção de cor, ou statu social, apenas uma mulher -, embora sua preferência fosse apenas unir-se a um companheiro. Mas, foi aconselhado que melhor seria o casamento. Pôs anúncio em jornal, usando um nome fictício para atrair a interessada. Recebeu, sem muito tardar, a resposta. Uma ...

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DPVAT e o STJ

Aureliano Neto*

Não tenho a pretensão de transformar este espaço numa tribuna jurídica, e muito menos política, em que os assuntos amenos, de mero diletantismo, portanto mais estéticos que técnicos, venham dar lugar a filigranas, próprias dos conflitos que assolam os nossos tribunais, e que já nos enchem a paciência todos os dias no noticiário de nossa mídia tupiniquim. Nem quero gerar desse tema um debate, às vezes inconsequente. Mas, se vier a ocorrer, não resta outra alternativa a não ser enfrentá-lo. Uma das minhas virtudes é não ter coragem, o que leva à ...

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"Somos o que nos Falta"

Aureliano Neto*

Acordei. Um sonho me fez despertar. Sonhava com meu avô. Fora um sonho provocante e estranho: a sua morte e seu sepultamento, como se ele tivesse se despedindo de todos nós às pressas. Felizmente, o dia estava rompendo a madrugada. Rezei para aquele homem, que, ainda criança, vi, no pequeno quarto da casa dos meus tios, na Belira, despedir-se de todos que estavam em torno do seu corpo estirado no catre e inerte. A partir dele, que deixou pedaços de vida, salpicados na minha existência, muitos se foram. De repente, a luminosidade ...

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Assim é, se lhe Parece

Aureliano Neto*

O título acima não é de minha autoria. Muito longe de ser. E gostaria tanto que fosse, até porque a frase é muito citada em várias circunstâncias, dependendo da situação vivenciada. A frase é do poeta e dramaturgo siciliano Luigi Pirandello, grande inovador do teatro, autor da peça Seis personagens à procura de um autor, encenada em todos os palcos do mundo. Mas, o que me chamou a atenção não foi o criador da frase, porém a própria frase em si, que denota certa ambiguidade. Se fizermos a inversão, teremos: se lhe ...

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Vingança Privada

Aureliano Neto*

A maior vítima da prática de um crime é a sociedade. Essa é uma conclusão que, em si, não traz nada de novo, porquanto de uma obviedade primária. Apenas constata um fato social, a ter reflexo na fenomenologia jurídica, em vista da necessidade de ser erradicado ou amenizado o ilícito pelos instrumentos legais de prevenção ou repressão sociais. O delito, forma mais grave de transgressão da ordem jurídica, quer se queira ou não, faz parte da vida em sociedade. Durkheim, em Las reglas del método sociológico, elucubra o entendimento de que "o ...

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Cultura da Ilegalidade

Aureliano Neto*

Fazendo algumas leituras aleatórias, mesmo despretensiosas, muito mais para divagar do que para refletir, deparei-me com um texto do antropólogo Roberto DaMatta, publicado na revista semanária Época, edição de março de 2012, n.° 723, em que, ao discorrer sobre a ilegalidade no Brasil, asseverou que "em nosso país, tudo que é legal ou ilegal tem uma zona cinzenta, onde as coisas vazam e o ilegal vira legal (e vice-versa)". E, a partir dessa premissa, questiona a legalidade ou não do jogo do bicho, que considera uma instituição popular nacional e de origem ...

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