Crônica da Cidade

Crônica da Cidade

O Amor se Repete

Aureliano Neto*

Estavam numa roda de conversa. Não de conversa-fiada. Era conversa séria. Na verdade, trocavam ideias. Não bem ideias, ideias, no sentido de conter algo substancioso, que exigisse reflexão mais profunda. Circulavam, entre um rápido silêncio, meras impressões pessoais ou da vida amorosa e desamorosa. Uma dizia, sem muita ênfase: - Dávamo-nos muito bem. O tempo foi passando e, um dia, éramos apenas grandes amigos. O amor diluiu-se no excesso de amizade. Meu primeiro marido era de uma dedicação ímpar. Mas, amigo, amigo, negócios à parte, ou melhor, amores à parte. E concluímos ...

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Depois do Natal, 2013

Aureliano Neto*

Depois do Natal, continuo na minha casa - quase tão antiga quanto ao meu casamento -, feita e subvencionada por muito dos honorários advocatícios, auferidos no trabalho nesta cidade que me acolheu quando aqui cheguei em 1975, para o exercício da advocacia pública no INCRA. De lá para cá, alguns bons anos se passaram. Novos anos e que logo tiveram a ousadia de envelhecer rapidamente. A crueldade do tempo, essa eternidade móvel, não deixa pedra sobre pedra. Para mim o Natal nunca se vai. O ano novo é que vem e vai, ...

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Então é Natal!

Cara amiga Nicole:

Aureliano Neto*

Escrevo-te ansioso por notícias. O Natal se aproxima com uma celeridade espantosa. Ainda outro dia, nada havia no ar que o anunciasse. Nem uma leve música como o hino natalino Anoiteceu, de Assis Valente. Pois é: - Anoiteceu / O sino gemeu / A gente ficou / Feliz a rezar / Papai Noel... As ruas não tinham um mísero enfeite, desses que nos chamam atenção a nos convidar para ir à loja mais próxima, ali pelas imediações da Praça de Fátima. Em casa, nada. Olha, ia ...

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Obsessão das Frases

Aureliano Neto*


Uma boa frase, bem construída, me contamina, exorta, me revive. Retira-me da letargia da inércia. Rubem Braga fez uma crônica, em que relata o drama da mulher ao seu lado e o temor lacinante, vivido num avião, que sem teto e balançando por torrencial chuva, circulava em escuras nuvens, sem poder aterrissar no aeroporto de São Paulo. Ao seu lado, uma mulher, cujo sedutor braço direito se apegava ao seu, com medo de que o avião viesse a espatifar-se daquelas alturas. Braga, com o seu jeitão arredio, tentava dar garantia ...

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O Circo Chegou

Aureliano Neto*

Não sei por que do circo a gente quase sempre só pensa no palhaço. O espetáculo como um todo esvai-se no tempo de nossas lembranças. Talvez porque nos encha de alegria a sua figura bonachona, rosto pintado, um quê de tristeza de ter que fazer rir, roupa colorida, voz rouca, a espargir um sentimento paradoxalmente sofrido. Por mais moderno que seja, circo sem palhaço é de uma tristeza mórbida. Fui daqueles que acompanhei o palhaço nas suas andanças para divulgar o espetáculo. O refrão era cantado ao megafone e repetido: - Hoje ...

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Da Maçã ao Casamento

Aureliano Neto*

Maçã já foi uma fruta rara e muito chique, mesmo metida à besta. Não que ela se metesse à besta. As pessoas é que lhe davam esse ar de importância, porque poucos tinham acesso a ela. Comer maçã era sinal de que, quem a saboreava em fatias ou por bocanhadas - e aí não escapava nem a casca -, ostentava status privilegiado onde morava. Era degustada na sala, fazendo jus à sua ostentação de nobreza. Não lembro ter visto ou sentido a presença sequer de uma reles maçã na casa do meu ...

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Amar é tão Bom

Aureliano Neto*

Amar não é apenas tão bom quanto é necessário. Uma pessoa sem amor é como um perfume sem fragrância. É um nada. Quem ama, tem em si toda a força da vaidade de bradar a todos, para que todos saibam, que ama. Nisso está a vaidade de amar e de se acreditar que se está sendo amado. O filósofo Nietzsche diz - não sei se ele está certo ou errado, mas longe de mim contestá-lo - que, quando amamos, queremos que nossos defeitos permaneçam ocultos; não por vaidade, mas para que o ...

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O Livro, as Palavras e as Emoções

Aureliano Neto*

Meado dos anos 70 e os anos 80, como advogado, fazia longas e cansativas viagens para acompanhar processos ou realizar audiências. Muitas e muitas vezes para Goiás, atual Tocantins, outras para Carolina, Riachão, ainda termo judiciário, e Balsas. Para Balsas, saía da rodoviária de Imperatriz às cinco ou seis horas da manhã, ainda escuro, para chegar por volta das dez ou onze horas da noite. A audiência no dia seguinte. Como sempre, o trajeto, até o destino, era bem doloroso, mas necessário o enfrentamento. O exercício da profissão exigia a presença do ...

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