Minha pranteada mãe costumava dizer que “quem tem muita manteiga, assa no dedo”. Eu não conseguia entender. E só mais tarde, com as lições da vida, entendi a lição. Tenho alguns textos inéditos e, portanto, “muita manteiga”. E, ainda assim “asso no dedo”, porque ao invés de publicá-los, recorro aos velhos ou surrados alfarrábios.
Um apresentador da Band, numa entrevista com o Cacique Juruna, lembra?, aquele que se destacou por usar um gravador para tudo, então Deputado Federal pelo Rio de Janeiro, comentou que ...
Ando doidinho de vontade de voltar à minha terra natal, naqueles capoeirões do meio do mundo e fim do mundo, de onde eu vim. Mas não posso. Estive lá em agosto do ano passado. O inverno lá, estica-se de novembro até aqui, e lá se vão mais de oito meses “encarreados”. E segue firme. De conseguinte não tem estrada de chão por lá. O jeito que tem é esperar. Enquanto isso... vou aqui relembrando uma lenda viva do meu lugar.
Anos 50 e mais adiante, por aí assim. E então morávamos todos lá no mato, longe de tudo e de todos. Ninguém conhecia uma bicicleta, nem luz elétrica, nem geladeira. E só os poucos mais abastados possuíam um rádio. E uma casa de telha? Quase todos eram analfabetos e viviam de uma roça de sobrevivência, em poucas “tarefas”. O terreiro era de plena pobreza, luta e sofrimento, nas terras onde deixei o umbigo e o chão da minha primeira identidade. Ficar doente ali, era um deus nos acuda! O grande temor de ...
Nunca pensei que aquela curva do caminho viesse a exercer tamanha influência na minha vida. Nunca pensei que aquela curva do caminho viesse a ocupar por incontáveis noites o meu imaginário: atravessa-se no meu sono, implica em meus anseios; me faz retroceder no tempo, faz de mim um menino; por vezes sentimento de culpa, lembranças tantas; reconstruções incríveis da minha vã imaginação. E eu ali, no epicentro desse pequeno mundo gigantesco que é... A CURVA DO CAMINHO.
É bem ali, na curva do caminho que ficava a CASA DO MEU ...
EM TEMPOS DE COCO E TUCUM (este texto faz exatos sete anos que escrevi ou, no mínimo, reescrevi)
Naquele esticadão de meio de mato e fim do mundo, o povo se virava mesmo era na roça bruta, no sol quente, na dura luta do roçado, no pilão e na mão de pilão, no machado, foice e facão e de resto na “mancepa”, que é o porrete para a quebra do coco babaçu, ao machado - isso de janeiro a dezembro, o ano inteiro. E quando lhe veio o direito ao “aposento”, aquilo sim, benefício e justiça ...
(Este texto foi escrito e publicado em O PROGRESSO há mais de vinte anos. Certo dia, do nada, recebi um telefonema de uma figura que jamais a vi nesta vida: era a filha do personagem que se manifestava interessada em publicá-lo num livro que acabara de escrever EM MEMÓRIA ao seu pai. Pedia autorização. Não me fiz de rogado, porém nunca recebi sequer um exemplar da obra. A vida tem dessas coisas).
Início dos anos 50. Eu deveria ter uns seis anos de idade “aprendia a ler” na Escola do ...
José de Maria era filho de Maximiano de Adesilha e de Maria de Aurora. Era conhecido por ZÉ DE MARIA ou ZÉ DE ORORA. Morava com a sua família, em terras de Vai-Quem-Gosta, uma “geba” encravada naquela fim de mundo, de descentes quilombolas, perto das terras do Vai-Quem-Quer, de “Domingo de Ogenha”. Zé de Maria (ou Zé de Orora) era um negrote forte, disposto, corajoso e trabalhador. Seus irmãos Bonifácio e Agnelo e João Damasceno moravam na cidade (na capital) e trabalhavam na estiva marítima. Então desde cedo Zé já ...
Sim, mas o nome mesmo é AÇAÍ OU JUÇARA? De minha parte eu acho que é tudo igual, a mesma coisa, e muda apenas de nomenclatura, conforme a região, a linguagem e os costumes. Uns aceitam a ideia de que açaí e juçara são a mesma coisa, mas outros questionam e apontam diferenças. Apontam que a juçara “perfilha”, faz-se em moitas, desenvolve-se à beira de aguadas ou terras frias, ao passo que o açaizeiro é de uma palmeira individuada, solitária, de sobrevivência em terra seca, sendo, porém, que os frutos guardam as mesmas ...
Viegas, Clemente Barros. (São Clemente papa e mártir). CLEMENTE vem do Almanaque de Bristol, antiga publicação do laboratório farmacêutico. Estudou as primeiras letras na escola da palmatória e dos joelhos ao chão, no sertão. Concluiu o curso primário (na terra natal), no tempo em que a escolaridade era levada a sério. Foi menino de recado e de mandado. Nos cursos Secundário e Técnico no internato da Escola Federal, onde ingressou via do “Exame de Admissão”. Cursou Direito, num tempo em que não havia celular, nem internet, nem FIES, nem as vantagens atuais. Não tinha livros, escrevia em papéis avulsos, taquigrafava as aulas ao verbo dos professores. Morou em casas de estudantes e cortiço, andava a pé, driblou o bonde, poucas roupas, curtiu a “Zona” e jamais dirá que “comeu o pão que o diabo amassou”. Trabalha desde os cinco anos, com intervalo dos onze aos vinte anos. Está na casa dos 73. Não brincou quando criança ou adolescente e na vida adulta tem três brinquedos que os leva a sério: 1 - Escreve a coluna CAMINHOS POR ONDE ANDEI; 2 - Escreve a crônica PÁGINA DE SAUDADE, Rádio Mirante/AM, domingos, há mais de dez anos; 3 - Tem uma “rádio”, com antena de 300 mm de altura, 1.000 a 1500 mm de alcance, com dois ou três ouvintes que, como você vê, “um que pode ser você”. É o rastro e a sombra de si mesmo. É o filho que veio e os pais que se foram. Superou milhares de concorrentes para nascer. É mais um na multidão e considera-se a escrita certa por linhas tortas, na criação do CRIADOR. Cumprimenta os seus interlocutores com votos de “saúde”! E diz aos semelhantes todos os dias que “...a vida continua”. (•) Viegas questiona o social.
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