Venho de um lugar da minha infância em que a crendice, a superstição, qual a água das cheias "encobre um homem de mão para cima". Os relatos eram tantos e eu, moleque, caminhos ermos, casas distantes, veredas sombrias, matagal solitário, morria de medo. "Currupiro" era o ente da minha grande tormenta. Contavam estórias tenebrosas de "Currupiro". Fazia gente perder-se no mato; açoitava cachorros; punha as vítimas no "olho do espinheiro", provocava dores de cabeça... Zé Bicudo - "diziam todos por uma boca só" virava porco nas noites, nas encruzilhadas. Ele que morreu com "cento e tantos ...
O meu avô Doca Barros foi um homem que conheceu apenas as beiradas de sua casa e não andou por mais do que quatro ou cinco léguas fora do seu terreiro. Tinha uns poucos gados "pé duro" que os entregou à vaqueirice de um certo ZUZU que os vigiava em campos abertos, em terras do "Bacabá". E então, de tempos em tempos, "ir até aonde o ZUZU" era o caminho mais longo a que fazia. De resto outras ocupações que porventura exigissem um percurso, ele delegava a seus dois filhos: Tio Pedro e meu eterno e inesquecível ...
A avenida que liga Imperatriz a João Lisboa, que recebe nome do professor Pedro Neiva de Santana, ex-Governador do Maranhão pelo dedo indicador do Governo Militar, a quem conheci pessoalmente a distância, aquilo de há muito me traz seguidos questionamentos e incômodos. Em princípio, eram os acidentes que ali ocorriam, envolvendo animais soltos na pista. Cheguei a acompanhar vários deles, ora na imprensa, ora nos processos de reparação indenizatória, ora em ações judiciais. Nos canais por onde passei - rádios, jornais e TV, sempre abordei sobre aquilo ali: os riscos, os fatos reais e os braços ...
Caminhar e correr na orla da Beira-Rio é um exercício que exige disciplina, renúncia, determinação. Logicamente que ninguém é obrigado a nada, mas se o viandante não tiver determinação e renúncia, a tentação pela interrupção e o abandono do exercício está sempre presente. O outro lado dessa moeda é que o exercício frequente e constante, em caminhada ou em corrida, rende ao indivíduo exercente um "plus" de condicionamento físico e psicológico - até porque "mens sana in corpore sano". Na Beira-Rio, nas caminhadas do amanhecer ou do anoitecer - eu que estou ora numa ora noutra ...
Rolava o final dos anos 60, pipocava a Revolução de 64 e eu, morador implacável da Casa de Estudante, sozinho no mundo e dono do próprio nariz, fui cursar o pré-vestibular. Fui para o noturno pré-vestibular CASTRO ALVES, do Professor Alberico Carneiro, que funcionava num vasto salão do então quieto e nada disputado CONVENTO DAS MERCÊS, ali na praça Antônio Lobo, do lado da tradicional e famosa ESCOLA MODELO. No Castro Alves éramos uma turma de uns sessenta entre rapazes e moças. Era eu ali, diário, vindo de dois expedientes na repartição pública, mais um na multidão. leia mais +
Lembro com uma saudade e uma paixão avassaladora aquele meu tempo colegial. Foram dez anos lá dentro. Aquela escola dourada e prateada e encantada, foi um rio que passou em minha vida. Isto é, que continua passando em minha vida. E jamais imaginei que aquele “palácio” que um dia cheguei ali, vindo do mato, aos onze anos em calças curtas e pé de chinelo, em que cheguei apenas à portaria, viesse a ser esse oceano que inunda a minha vida, a minha realidade, os meus devaneios até hoje. Até hoje! A minha Escola foi o berço ...
De vaga lembrança, ainda moleque, acho que li um texto ou ouvi um ditado que dizia que "o homem dos sete instrumentos não toca bem a nenhum dos sete". Não entendia o recado, mas fiquei com isso na cabeça. Já "grandinho", um dia ouvi do meu pai onde ele dizia que não queria que eu fosse um "tocador" (um músico). Por que pai? Perguntei. É que o "tocador" marca vários tratos ao mesmo tempo. Foi o quanto me disse. Hoje eu penso que era o meu pai aborrecido com algum "tocador" que lhe passou a perna, descumpriu ...
Lembra-se você de uma luta chamada CANA-DE-BRAÇO? A cana-de-braço era uma luta simples de gente simples. Gente de periferia, estudantes, estivadores, recrutas, braçais, desocupados - muitas que aconteciam sobre as mesas dos bares da vida ou sobre carteiras das salas de aula. Por vezes consistia numa aposta até. Pequeno valor. Por vezes simples exibição ou disputa dos contedores e, em volta, os olheiros na torcida, no palpite e na "zueira". A cana-de-braço não tinha segredo: perseverança, resistência e... força mesmo! Cruzados os braços com os cotovelos sobre a mesa, perdia a disputa e a aposta aquele cujo ...
Viegas, Clemente Barros. (São Clemente papa e mártir). CLEMENTE vem do Almanaque de Bristol, antiga publicação do laboratório farmacêutico. Estudou as primeiras letras na escola da palmatória e dos joelhos ao chão, no sertão. Concluiu o curso primário (na terra natal), no tempo em que a escolaridade era levada a sério. Foi menino de recado e de mandado. Nos cursos Secundário e Técnico no internato da Escola Federal, onde ingressou via do “Exame de Admissão”. Cursou Direito, num tempo em que não havia celular, nem internet, nem FIES, nem as vantagens atuais. Não tinha livros, escrevia em papéis avulsos, taquigrafava as aulas ao verbo dos professores. Morou em casas de estudantes e cortiço, andava a pé, driblou o bonde, poucas roupas, curtiu a “Zona” e jamais dirá que “comeu o pão que o diabo amassou”. Trabalha desde os cinco anos, com intervalo dos onze aos vinte anos. Está na casa dos 73. Não brincou quando criança ou adolescente e na vida adulta tem três brinquedos que os leva a sério: 1 - Escreve a coluna CAMINHOS POR ONDE ANDEI; 2 - Escreve a crônica PÁGINA DE SAUDADE, Rádio Mirante/AM, domingos, há mais de dez anos; 3 - Tem uma “rádio”, com antena de 300 mm de altura, 1.000 a 1500 mm de alcance, com dois ou três ouvintes que, como você vê, “um que pode ser você”. É o rastro e a sombra de si mesmo. É o filho que veio e os pais que se foram. Superou milhares de concorrentes para nascer. É mais um na multidão e considera-se a escrita certa por linhas tortas, na criação do CRIADOR. Cumprimenta os seus interlocutores com votos de “saúde”! E diz aos semelhantes todos os dias que “...a vida continua”. (•) Viegas questiona o social.
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