A avenida que liga Imperatriz a João Lisboa, que recebe nome do professor Pedro Neiva de Santana, ex-Governador do Maranhão pelo dedo indicador do Governo Militar, a quem conheci pessoalmente a distância, aquilo de há muito me traz seguidos questionamentos e incômodos. Em princípio, eram os acidentes que ali ocorriam, envolvendo animais soltos na pista. Cheguei a acompanhar vários deles, ora na imprensa, ora nos processos de reparação indenizatória, ora em ações judiciais.
Nos canais por onde passei - rádios, jornais e TV, sempre abordei sobre aquilo ali: os riscos, os fatos reais e os braços cruzados dos "quem de direito" que nunca tomaram providências enérgicas e objetivas em busca de solução. E assim carroceiros e outros donos de animais têm ficado tão à solta quanto os seus bichos. Acidentes, danos materiais, danos morais, mortes, ignorados donos de animais e vai ficando por isso mesmo - quem sabe até um dia talvez; quem sabe pelo resto da vida. E assim a Avenida Pedro Neiva de Santana segue o seu famigerado destino, a sua trilha, a sua sina.

Velório e morte no velório
Dia desses, rodando na Pedro Neiva, a própria avenida sobressaltava-se sobre a minha mente. Em lado a lado as mansões, os chãos que valem milhões, a estratosférica especulação imobiliária. Ora o risco sobre o canteiro; ora um veículo inesperado que me cruza à direita; ora a pista livre e esticada que por si só enseja a velocidade; ora de olho naquela "faixa intermediária" ao centro, acho que destinada a viandantes e bicicleteiros e o risco que se me parece; ora aqueles acessos em acostamento para manobra, que não raro ocorrem e sugerem acidentes. Ora mal-feitos aqui e ali.
Nesse voo rasante do pensamento, eis que de repente... ali, naquela baixada, pouco adiante da NATIVA, jazia um animal morto no meio da pista. E, logo ao lado, um poste igualmente esticado ao chão, como que motivado por uma pancada seca, certeira, fatal. Aquilo me disparou em adrenalinas e confirmação dessa tétrica e tenebrosa Pedro Neiva de Santana de sempre. Ela mesma, cenário de tantos acidentes - como sempre!
Pude observar ainda naquele momento - e foi isso que mais me chamou a atenção - que dois animais, um cavalo e um jovem potro,  estavam ali, naquela faixa do meio, tão estáticos quanto aquele que jazia ao chão. E tive a nítida impressão que eram parceiros de um mesmo "grupo familiar". Companheiros de infortúnio, da indigência e da vida solta - ali sem cabresto e sem dono. E nessa interpretação, vi que pai e filho ali em pé, quietos, parados, velavam ao seu. E segui dali, ainda que sem parar por um só instante, refletindo sobre as respostas amargas e doídas que me sobressaltavam a mente. E segui "escrevendo" e, qual uma lente fotográfica, retratando tudo aquilo na mente.
Na volta, sempre com aquela cena no imaginário, ao me aproximar daquele tétrico local, com poste caído e animal ao chão, o que vejo?! Vejo para sangrar a minha dor que aquele jovem potrinho, há pouco órfão de mãe, agora era mais uma vítima caída ao chão, morto, ao lado de sua mãe. Aquilo me doeu cruamente. E se a vida para nós os "racionais" é o bem mais precioso e o que dizer dos "irracionais"? Eles também nascidos e criados sob um sistema nervoso, sangue nas veias, coração a palpitar. Eles que também sentem a dor, a tristeza, o abandono, a fome, a doença, a miséria, o suor, o serviço. Eles mesmos que também sentem a morte. E assim a Avenida Pedro Neiva segue o seu famigerado destino, a sua trilha, a sua sina.

Tem mais sobre a Pedro Neiva
Conheço aquilo faz 40 anos. De lá para cá, tenho acompanhado a trajetória dos altos e baixos da Pedro Neiva. Nos penúltimos tempos (digamos penúltimos tempos), a PEDRO NEIVA era uma buraqueira terrível. Faziam um tapa-buraco aqui, outro ali numa semana e no mês seguinte estava tudo lá. Enfim, uma constante e inacabável buraqueira. E eu me punha a observar aquela corda-bamba, aquele quebra-galho, aquele lambe-e-cospe e aquela rotina de sofrimento dessa via de ligação Imperatriz/João Lisboa. Até que um dia... até que um dia... quando dei por mim, começa ali um serviço de "duplicação" do trecho. Um servição! Abrindo tudo, escancarando tudo. Aí eu pensei: nisso tem "maracotico".
Ora! Um trecho que ao longo de tantos anos e mais anos nunca deram conta nem de tapar os buracos?! De repente, vão fazer e fizeram uma "wal-street" milionária?! Quase cinematográfica?! Aí, na conversa com os meus botões, eu me perguntava era sobre a "manutenção", a consistência desse mesmo trecho que durante um século e meio de história sempre esteve aos pandarecos. É evidente que fazer um trecho daquele exige, além de uma  famigerada "vontade política", também uma fortuna dos cofres públicos, ainda que na conta ou na visão de plebeus que não têm noção do dinheiro, assim como eu. Sim, mas e daí, não é o progresso tão sonhado neste chão Tocantino?! Claro! Agora sabe-se lá o "faturamento" e as "empreiteiras" e outras mumunhas que disso resulta...
E assim a Avenida Pedro Neiva segue o seu destino, a sua trilha, a sua sina. Agora, uma tremenda vitrine, uma estupenda janela! E, certamente nela, sobre ela ou debaixo dela - tanta coisa que sequer imagina a nossa vã imaginação... por conta dessa janela... da riqueza dela... da beleza dela... dos gastos que fizeram com ela... da "manutenção" que há de vir  (ou não)... para ela...

* Viegas é advogado e questiona o social -
E-maill: viegasadv@ig.com.br