O governador Mauro Carlesse (PHS) assinou nessa segunda-feira, 11, o decreto que institui o novo Estatuto dos Policiais Civis do Estado do Tocantins. O governo fala em modernização da atuação da PC, mas o documento traz dispositivos que representam um verdadeiro retrocesso, obrigando que operações em repartições públicas sejam antecipadas aos dirigentes, por exemplo.
É o que prevê o artigo 75 do novo estatuto: "A busca em repartições públicas, quando necessária, será? antecipada de contato com o dirigente do órgão onde será? realizada, aplicando-se, no que couber, o previsto nesta Seção".
Mas não para por aí. No título VIII, "Da comunicação social do policial", o artigo 205 prevê que "toda e qualquer operação que possa gerar repercussão nos meios de comunicação deverá ser informada ao delegado-geral da Polícia Civil". O objetivo, segundo o documento, é, "juntamente com o órgão de comunicação próprio", decidir "a estratégia de comunicação relacionada à divulgação e repercussão decorrentes do interesse público envolvido na investigação".
No inciso X, o estatuto diz que é "proibida, em entrevistas, a referência depreciativa às autoridades e atos da administração pública, qualquer que seja o meio empregado para esse (…), devendo toda e qualquer informação prestada à imprensa ser feita de forma técnica, objetiva e imparcial".
OAB acusa estranheza
O presidente da Seccional Tocantins da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-TO), Gedeon Pitaluga, convocou uma reunião para sexta-feira, 15, às 14 horas, com os presidentes de subseções e conselheiros do Estado para analisarem em conjunto esse decreto do governador. Conforme material da assessoria de imprensa da entidade, "o decreto causou estranheza à classe jurídica, pois traz limitações impostas pelo governo do Estado ao trabalho da Polícia Civil em procedimentos investigatórios.
Para o presidente da OAB-TO, o decreto pode ferir dispositivos legais e constitucionais e é papel da entidade "analisar, como guardiã da Constitucionalidade e representante da sociedade civil organizada".
"O governo não pode fazer o que bem entender no Estado Democrático de Direito, e a OAB tem como missão garantir a aplicação da régua constitucional, que estabelece limites aos Poderes, ao Estado. Vamos analisar o decreto e se houver qualquer ilegalidade ou inconstitucionalidade no documento, a OAB-TO tomará medidas cabíveis para fazer garantir o Estado de Direito", avisou Pitaluga.
Estado mais seguro
Na solenidade do Palácio nessa segunda, foram assinados dois projetos de lei que tratam da cumulação de responsabilidades administrativas pelos delegados de polícia do Tocantins mediante indenização, assim como da instituição do novo Estatuto dos Policiais Civis do Estado do Tocantins.
De acordo com o governador Mauro Carlesse, as mudanças propostas mostram um governo mais organizado e resultarão em um Estado mais seguro. "Fico feliz com o comprometimento da instituição e seus servidores com o aprimoramento de suas funções. Tenho a convicção de que os procedimentos serão mais justos e corretos. Estou à disposição da Polícia Civil e sei que vamos fazer a mudança do Tocantins para melhor", afirmou o governador.
De acordo com o secretário da Segurança Pública, Cristiano Sampaio, todos os três documentos são embasados em projetos e estudos já desenvolvidos no âmbito da Polícia Civil do Tocantins e da Secretaria da Segurança Pública, buscando aprimorar e melhorar os serviços prestados à comunidade. "Identificamos que os procedimentos precisavam de atualização. Então buscamos modernizar a atuação da Polícia Civil, tendo como referência os padrões já utilizados por outras instituições de Polícia Judiciária", ressaltou.
Moderniza
Para o governo, "o aprimoramento do Manual de Procedimentos de Polícia Judiciária do Estado moderniza, traz celeridade e reduz gastos com intimações realizadas pela Polícia Civil, ao regulamentar o uso dos Correios, além de mecanismos avançados de comunicação, como aplicativos de envio de mensagens, arquivos e imagens (whatsapp); realização de oitivas por videoconferência; regulamentação de serviços de inteligência disponíveis para as unidades policiais, como Laboratório de Lavagem de Capitais; regulamentação de buscas e apreensões em órgãos públicos e padronização das informações encaminhadas aos veículos de comunicação e disponibilizadas à comunidade".
De acordo com o delegado-geral da Polícia Civil, Rossílio de Souza Correia, a uniformidade das informações garante a sua fidelidade e consistência. "A normatização do Manual representa a padronização, modernização e efetividades no trâmite dos procedimentos de Polícia Judiciária e ainda proporciona maior fidelidade dos dados apresentados ao público e a otimização dos cuidados para a preservação dos direitos à intimidade e à honra de pessoas investigadas em procedimentos realizados pela Polícia Civil. Podemos falar que assistimos ao nascimento de uma nova Polícia Civil", defendeu.
Além dos estudos internos de atualização do manual, os procedimentos que deverão ser adotados têm como fundamento leis e regulamentações utilizadas por outros órgãos de Polícia Judiciária. "Utilizaremos os mesmos padrões de comunicação e de procedimentos de busca e apreensão adotados pela Polícia Federal, visando a excelência e padronização dos procedimentos realizados pela Polícia Civil do Tocantins", afirmou o titular da SSP, Cristiano Sampaio.
Os projetos de lei seguem, agora, à Assembleia Legislativa do Tocantins para estudo, deliberação e aprovação. O decreto que atualiza os procedimentos de Polícia Judiciária foi publicado no Diário Oficial do Estado, desta segunda-feira. (Com informações da Secom TO)
Sindepol diz que é "Mordaça"
O Sindicato dos Delegados de Polícia Civil do Estado do Tocantins (Sindepol-TO) chamou, por nota, de "decreto da mordaça", o documento do governador Mauro Carlesse (PHS) que que institui o novo Estatuto dos Policiais Civis do Tocantins.
Confira a íntegra:
"Nota do Sindepol/TO contra o Decreto da mordaça
O Sindicato dos Delegados de Polícia Civil do Estado do Tocantins (Sindepol/TO), por meio do seu Presidente, Mozart Felix, manifesta repúdio ao Decreto nº 5.915/2019, publicado no Diário Oficial do Estado, nesta segunda-feira, 11, pelo Governo do Estado do Tocantins. O decreto surpreendeu à toda a classe, eis que cria um Manual de Procedimentos a ser adotado pela Polícia Civil do Estado do Tocantins, do qual consta uma série de dispositivos ilegais, inconstitucionais ou que ferem a jurisprudência pátria pacífica.
Um dos dispositivos questionáveis é o artigo 74 que menciona que o cumprimento de mandados especiais em órgãos públicos deve ser previamente informado aos seus respectivos dirigentes e caso a comunicação venha prejudicar a diligência em si, deve ser solicitada autorização do Delegado-Geral para dar sequência à operação. Tal afirmação entra em conflito com o nosso ordenamento jurídico, pois o artigo 116 da Constituição Estadual do Tocantins relata que o Delegado de Polícia possui independência funcional, tendo o Delegado-Geral a função administrativa. Em relação às investigações, cada Delegado é seu próprio chefe, atuando dentro da legalidade e com independência funcional.
Em relação ao dispositivo que menciona que o "inquérito ou procedimento investigativo que acompanhará o Termo Circunstanciado de Colaboração Premiada para decisão quanto à homologação, mediante tramitação em sigilo 2 (dois) no e-proc, com solicitação de manifestação do Ministério Público", declaramos que esse dispositivo se torna ilegal, pois o sistema é de acesso à todas as polícias, bem como aos gerenciadores e Servidores da Secretaria de Segurança Pública que podem ter contato com todos os procedimentos, ferindo assim o artigo 20 do Código Penal que diz que o sigilo da investigação fica a cargo do Delegado de Polícia, presidente do inquérito. Um recente fato público investigado pela Delegacia Especializada de Repressão a Crimes Cibernéticos - DRCC nos prova a incapacidade sigilosa do sistema que vazou informações confidenciais, ocasionando a prisão de um Advogado e uma servidora do Tribunal de Justiça.
Com relação ao que se refere à Comunicação Social no artigo 204 e seguintes que prevêem, dentre outras coisas, "a preservação da intimidade e a garantia da presunção de não culpa constitucional, além de sigilo necessário à elucidação do fato e interesse da sociedade", percebe-se o objetivo claro de dificultar tanto o acesso dos Delegados à imprensa como da imprensa aos Delegados, impossibilitando que as informações de interesse social alcancem à população.
Os dispositivos contrariam um dos princípios maiores da administração pública, o da publicidade. O trabalho da Polícia Civil deve ser levado ao conhecimento de todos, pois o dinheiro público, além de pagar os salários dos servidores, deve ser revertido em benefícios para toda a sociedade. Assim, todo e qualquer governo deveria zelar pela publicidade de seus atos e não pelo sigilo dos mesmos.
Para encerrar, deixamos claro que esse decreto em momento algum levou em consideração o interesse público, eis que tolhe inúmeras prerrogativas da Polícia Civil do Tocantins, quando ela é nacionalmente reconhecida em razão do intenso e frutífero trabalho de combate à corrupção e aos crimes contra a administração pública.
O Sindicato junto à assessoria jurídica está tomando medidas com relação a esse decreto que é ilegal e inconstitucional.
Mozart Felix
Presidente do Sindepol/TO"
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