BRASÍLIA - Em outubro, o Brasil recebeu os primeiros Jogos Mundiais dos Povos Indígenas (JMPI). Sediado em Palmas, o evento reuniu cerca de 1,7 mil atletas indígenas de 24 etnias brasileiras e 23 estrangeiras. A interação e respeito entre culturas tão diferentes foi a tônica dos jogos, que mesclaram esporte e efervescência cultural.
A capital tocantinense ficou em evidência durante os dez dias de evento e reuniu mais de 1,1 mil indígenas brasileiros. Foi um momento especial para as etnias nacionais, que puderam se unir em prol de suas bandeiras.
A maior delas é, sem dúvida, o combate à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215, que transfere o poder de decisão sobre demarcação de terras indígenas para o Congresso. Na opinião do cacique Darã Tupi-Guarani, os indígenas souberam aproveitar os jogos para se mobilizar, apesar de frisar que não houve contribuição do governo ou dos organizadores dos jogos nesse engajamento político.
“Acho que os jogos foram para tirar a tensão dos indígenas enquanto a votação [da PEC] acontecia em Brasília. Os jogos não ajudaram em nada na questão das políticas públicas. O que ajudou foi o movimento que fizemos por iniciativa própria. Os jogos foram importantes para nos unir e o governo viu que nos unimos”, disse o cacique Tupi-Guarani, de São Paulo.
Em Palmas, as manifestações contra a PEC cresciam ao longo dos dias e chegaram ao ápice em uma noite de quarta-feira, um dia depois da aprovação da PEC na comissão especial destinada a analisar o tema na Câmara. Um grupo de 100 indígenas invadiu a arena dos jogos, paralisou as competições e fez um forte protesto, com apoio do público presente.
Após o encerramento dos jogos, com todas as etnias de volta a seus estados, um outro grande ato ocorreu, com bloqueio de rodovias em vários estados. “Os movimentos que fizemos nos jogos ajudaram, deram impacto, porque teve o retrocesso da PEC. Depois que voltamos de Palmas, fizemos um ato no dia 11, em nível nacional, contra a PEC 2015”, disse Darã. No mesmo dia os indígenas foram recebidos pelo ministro da Secretaria de Governo da Presidência, Ricardo Berzoini, em Brasília.
Um dos principais articuladores dos JMPI, o indígena Marcos Terena, considerou o sucesso dos jogos ao integrar indígenas de tantos estados diferentes. “Uma das estratégias dos jogos indígenas foi justamente unir os povos por meio da cultura, dos jogos, mas, ao mesmo tempo, para levantar a voz dos indígenas. Do ponto de vista do grande público, era preciso demonstrar essa força não por meio dos problemas, mas da alegria, da aliança, da questão ambiental. E creio que conseguimos atingir isso em 2015”.
Apesar da invasão da arena e da manifestação dos indígenas ter sido uma momentânea “perda de controle” da organização dos jogos, Terena reconheceu que o evento foi uma oportunidade para que um grande ato político ocorresse. “É muito difícil para o Brasil ter uma espécie de ‘sindicato indígena’, por conta dessa diversidade de etnias. Mas existem alguns grupos que se organizam em algumas delas. E isso fez com que eles se movimentassem e vissem o espaço aberto para levantar as vozes. E o grande gancho foi a PEC 215, que unificou todos os povos”.
Próximos Jogos Mundiais Indígenas
O Canadá foi o país escolhido para receber a segunda edição dos jogos, em 2017. Terena é consciente de que não será possível contar com tantos brasileiros desta vez. Ele estuda a possibilidade de o Brasil ser representado por cerca de 50 a 70 atletas e quer qualificar ao máximo os indígenas que irão à América do Norte.
“Já estamos iniciando negociação com o próprio ministro do Esporte, George Hilton, para criarmos um projeto que vai nascer com as vilas olímpicas que ele quer instalar nas aldeias. Com isso a gente vai formando a ideia entre as comunidades indígenas de que é preciso termos quadros bons para representar não só os indígenas como também o Brasil”.
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