(Paranã-TO) - Famílias remanescentes dos quilombolas Calunga que residem na Fazenda Santana, região de Campo Alegre, em Paranã do Tocantins, estão enfrentando ameaças de homens armados nos últimos dias. O delegado de conflitos agrários do Estado, Ricardo Moreira de Toledo Sales, afirmou à imprensa na manhã desta segunda-feira, 18, que os remanescentes ganharam o direito a propriedade daquela terra pelo Governo Federal e que fazendeiros estão em pé-de-guerra para manterem posse das terras.
Segundo o delegado, o conflito iniciou por volta do dia 13 deste mês e o maior problema é que o Incra do Tocantins não demarcou a área, deixando os fazendeiros na região achando que serão desapropriados aleatoriamente, acarretando em ameaças a comunidade. “Isso faz com que para tentarem se manter na posse, (os fazendeiros) armem pessoas para tentar espantar o povo da região”, afirmou o delegado.
Ainda segundo o delegado, o Incra manteve acordo com o Estado para manter as condições de deslocamento da delegacia, no entanto, não honra com o acordo, o que acarreta em falta de condições para cumprimento de denúncias. “Esse final de semana como nos ligaram apavorados estou mandando a minha equipe mesmo sem condições. O Incra não está nos honrando com a parte deles. O pessoal está indo sem condições nenhuma. Essas ações são de responsabilidade da minha unidade policial. Estou fazendo tudo para tentar chegar lá. Até agora não pudemos fazer nada porque infelizmente estamos com dificuldades”, salientou.
Morador da região
Um morador na região afirmou durante entrevista que foi ameaçado no dia 13 de agosto com um espingarda na cabeça. “Estava trabalhando e chegaram dois caras enfiando a espingarda em nois, dizendo que as terras eram deles e que a gente tinha que vazar porque se não ia ficar pior pra nós. Para não perder a vida tivemos que largar tudo, deixamos tudo, não deixaram levar (sic)”, afirmou.
Ainda segundo o morador, os homens armados afirmaram ser policiais, mas ao ir a delegacia ficou constatado pela polícia local que não se tratavam de policiais. “Moro perto da fazenda há 39 anos e nunca tinha visto esses homens. A situação não tá fácil, mas acredito em Deus que tudo vai ser resolvido. Pessoas nascidas e criadas na região sendo ameaçadas por fazendeiros que nunca foram vistos”, desabafou. Grande maioria dos moradores da Fazenda Santana e região trabalham nas roças.
O assessor Técnico dos Afrodescendentes do Estado, André Luíz Gomes da Silva, afirmou que as comunidades daquele entorno foram certificadas como remanescentes de quilombo, porém ainda não foi feito a titularizarão da terra. Segundo ele, os calungas envolvidos no conflito são da mesma família dos Calungas de Goiás e são da mesma família dos calungas de Mimoso de Arraias do Tocantins. “Então a família é uma só, por isso que são identificados como Calungas, mas pertencem ao município de Paranã e são certificados como remanescentes de quilombo no município de Paranã”, afirmou.
Diretor de Igualdade Racial
O diretor executivo de igualdade racial de Paranã, Enedino Benevides Neto, também ouvido afirmou que uma família composta por 5 pessoas e mais um senhor quilombola de outra família estão envolvidos no conflito da Fazenda Santana. Segundo ele, o que está havendo é uma divergência jurídica com a terra que está em litígio com um fazendeiro e que o processo ainda não terminou e as divergências estão em termos de direitos de plantar e de fazer qualquer outro tipo de trabalho na terra.
Segundo ele, a documentação mostra que os remanescentes ganharam o direito a propriedade das terras, porém, segundo ele, houve uma apelação com recurso. De acordo com Enedino Neto a família calunga habita na região há mais de dois séculos e estão lá desde antes a abolição da escravatura. “De lá pra cá houve a entrada dos fazendeiros que foram adquirindo as terras. Agora a situação dessas terras na Fazenda Santana tem haver com compra e venda de áreas dentro da fazenda, que foram vendendo, comprando e ai complicou [...] e começou a gerar essa situação de litígio. É uma fazenda dentro de uma área quilombola que já é reconhecida, ela é oficialmente quilombola, é reconhecida pelo Governo Federal e está em processo de legalização fundiária pelo Incra, está em fase inicial”, disse ele.
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