PALMAS - Insatisfeitos com os recursos do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) e com o atraso de repasses pelo Estado, 131 prefeituras tocantinenses iniciaram nessa segunda-feira, 28, a semana de paralisação dos serviços públicos. O objetivo da ação é conscientizar os governos e população sobre as dificuldades financeiras que as cidades estão enfrentando. Durante coletiva de imprensa, gestores reivindicaram a alteração do pacto federativo e anunciaram programação de reuniões para debater a crise econômica.
O presidente da Associação Tocantinense de Municípios (ATM) e prefeito de Brasilândia, João Emídio de Miranda, apresentou à imprensa dados sobre o efeito da desoneração de impostos pelo governo federal que impactou as contas das cidades. Conforme os números citados, a redução dos dois impostos partilhados da União – que formam o FPM - fizeram com que as prefeituras do Estado deixassem de receber R$ 1,745 bilhão, de 2008 a 2014; levando em consideração todo o País, o valor chega a R$ 121,4 bilhões, no mesmo período.
“Falência”
“A situação é de falência dos pequenos municípios. O governo federal, para equilibrar as contas, começou a desonerar o IPI [Imposto Sobre Produtos Industrializados] e congelar o imposto de renda. Com a queda de receita, frustra-se o orçamento”, argumentou João Emídio de Miranda, explicando ainda que o crescimento das atribuições das prefeituras e o aumento de constante de salários do funcionalismo agravam a situação financeira.
Como exemplo, João Emídio citou deficiências no programa de valorização dos vencimentos. Segundo o gestor, de 2010 a 2015, o piso do magistério passou de R$ 1.024,00 para R$ 1.917,00, crescimento de 87,9%. No mesmo período, a inflação calculada pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) foi de 35,3% e a receita do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) acresceu apenas 59%. O presidente da ATM também questionou o “aumento exorbitante” do salário mínimo.
“Reconhecemos que é uma conquista, mas infelizmente vamos chegar ao momento que vai travar. O salário tem aumentado acima da inflação, e os repasses estão todos abaixo”, explicou João Emídio, que também condenou os restos a pagar (RAP) da União, que chegou a R$ 35 bilhões em 2014, sendo R$ 3,4 bilhões processados e R$ 31,6 bilhões processados.
Pacto é injusto
João Emídio defendeu a alteração do pacto federativo. “É injusto, é desonesto o que acontece: os municípios receberem 15% do que arrecada, enquanto o governo federal fica com 60%. A situação vai se agravar muito mais”, garantiu o presidente da ATM, caso a repartição de tributos não seja revisada.
Presente na coletiva, o prefeito de Palmas, Carlos Amastha (PSB), fez coro à posição de João Emídio. “Está na hora de rediscutir o pacto federativo. O governo federal gastou o dinheiro que tinha para coisas que não eram para os municípios. Não é possível que os municípios vivam de esmolas”, afirmou.
O pessebista estendeu as críticas ao Congresso Nacional, onde defende que a maioria dos parlamentares são favoráveis à revisão do Pacto Federativo, mas não iniciam o debate. “Por que não fazem? Por ser melhor para eles [deputados e senadores] que a gente dependa das emendas. Temos que ser firmes”, afirmou Carlos Amastha, elencando a necessidade de levar a reivindicação à bancada tocantinense.
O prefeito da capital não deixou de cobrar o repasse do governo do Estado referente ao imposto sobre serviços de qualquer natureza (ISS). Amastha garante que o Palácio Araguaia deve ao município R$ 7 milhões e instigou novamente entrar na Justiça, garantindo que a medida visa apenas garantir o direito de Palmas. “Não tem política nesta história. Não estou brigando com ninguém”, disse.
Reuniões
João Emídio destacou que os prefeitos não vão se limitar à paralisação e anunciou série de reuniões para debater a crise dos municípios. O primeiro a receber os gestores será o presidente da Assembleia Legislativa, deputado Osires Damaso (DEM). Na ocasião, será solicitada a compreensão da Casa de Leis para que não aprove nenhuma matéria que impacte as cidades sem antes iniciar o diálogo com os administradores. A reunião está prevista para esta terça-feira, 29, às 11 horas.
Os munícipes têm a intenção de conversar com o governador Marcelo Miranda (PMDB) na quarta-feira, 30, para discutir sobre a agenda mínima. “É urgente a situação. Não podemos mais esperar”, disse João Emídio. Os recursos da saúde também serão cobrados pelos prefeitos. Conforme dados da ATM, o Palácio Araguaia deve cerca de R$ 40 milhões aos municípios.
Preocupados com a possibilidade de não fechar a conta em 2015, os prefeitos ainda irão pretendem visitar o Tribunal de Contas do Estado (TCE) na quinta-feira, 1º de outubro. “Não fizemos uma semana de mobilização para cruzar os braços, mas um movimento para sensibilizar governos. Queremos externar para a sociedade a situação em que vivem os municípios”, afirmou João Emídio.
Dificuldades
Os gestores presentes na coletiva citaram as dificuldades enfrentadas por cada município. Frederico Henrique de Melo, prefeito de Miranorte, afirmou que está com dificuldades para garantir os medicamentos, através da farmácia básica. O administrador disse que recebe pouco mais de R$ 5 mil para atender 14 mil pessoas. “Não é preciso matemático para entender que isto não vai resolver coisa alguma”, afirmou.
Representando o prefeito de Gurupi, o secretário de administração da cidade, Gutierres Borgues Torquato, reclamou da queda de 50% nos repasses do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), de março para setembro. “O governo federal tem que entender que vivemos na ponta. É preocupante a situação de cada município”, disse.
O prefeito de São Valério, João Jaime Cassoli, comentou que o município já realizou três cortes de funcionários, em dezembro de 2014, fevereiro e junho, para tentar equilibrar as contas, mas ainda assim terá de efetuar mais demissões. “A crise não é nossa. Não há vandalismo, má gestão dos prefeitos, mas gastos que foram impostos de cima para baixo e nós estamos pagando”, disse o gestor, acrescentando que a situação econômica está forçando corta dois dos três médicos que atuam na cidade.
Paralisação
O protesto dos municípios consiste em paralisar todos os serviços a partir dessa segunda-feira, 29, e durante toda a semana, as pastas administrativas não funcionarão.
Em relação à comunicação do procurador-geral de Justiça do Tocantins, Clenan Renaut de Melo Pereira, que pediu a vigilância sobre a possível descontinuidade na prestação dos serviços públicos, o que pode configurar prática criminosa, João Emídio de Miranda disse estar seguro de que a população não será prejudicada com a mobilização e garantiu o funcionamento dos serviços essenciais. “Nenhum direito será cerceado. Não vamos ter problema com o Ministério Público”, disse.
A paralisação segue até esta sexta-feira, 2 de outubro.
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