Nessa semana, diversas cidades do país organizaram manifestações contra a aprovação da Proposta de Emenda Constitucional 37, que limita o poder de investigação do Ministério Público. Para o advogado da União Luciano Dutra, autor do livro Direito Constitucional Essencial, da editora Elsevier, a proposta “É um retrocesso social. Ao invés de retirarmos competências do MP, deveríamos nos preocupar em cobrar resultados, a partir de uma lógica do cumprimento de metas, nos valendo, por exemplo, do Conselho Nacional do Ministério Público. Minha opinião é que não deveríamos estar nesta fase do amadurecimento das instituições nacionais nos preocupando em debater se o MP deve ou não investigar, até porque, como afirmei, esse poder advém da interpretação constitucional. Deveríamos, ao contrário, cobrar o aperfeiçoamento das instituições brasileiras”, afirmou Dutra.
Boa parte da sociedade acredita que a aprovação da PEC possa contribuir para a impunidade no país. Luciano afirma que não há diferenças no tipo de trabalho feito pelo Ministério Público ou por um órgão policial e defende um modelo de investigação compartilhado. “Sob a ótica do Direito, notadamente o Direito Constitucional, não vejo o porquê da investigação realizada pelo MP ser mais eficiente daquela realizada pelos órgãos de segurança pública, especialmente a polícia federal e as polícias civis. Creio em um modelo de exercício compartilhado da função investigativa, de modo que o MP pudesse centrar sua atividade nos casos mais complexos”, comentou.
Uma das competências do Ministério Público, atualmente, é exercer o controle externo da atividade policial, onde o órgão requisita diligências e instaura inquéritos policiais. Alguns constitucionalistas acreditam que, por conta disso, a Constituição também propicia o direito do MP de investigar casos mais complicados. Luciano explica como funcionam os deveres da instituição. “Na verdade, o poder de investigação do Ministério Público advém de uma interpretação do texto constitucional que estabelece que o Ministério Público tem a competência privativa para promover a ação penal pública (art. 129, I). Segundo o princípio dos poderes implícitos, onde a Constituição delimitou os fins, atribui, implicitamente, os meios necessários para o cumprimento dos mandamentos constitucionais. Ou seja, se o MP pode o mais - promover em grau de privatividade a ação penal pública -, pode o menos - investigar, colher diretamente a prova na busca da formação da justa causa”, explicou.
Alguns constitucionalistas defendem a ideia de que a investigação feita pelo MP obedece ao regime democrático. O especialista discorda da afirmação. “Não vejo em que ponto a investigação realizada pelo MP se inseriria no postulado democrático. Se assim fosse, poderíamos pensar num regime em que diversos órgãos pudessem exercer a atividade de polícia investigativa. Creio não ser essa a intenção da Constituição, que atribuiu à polícia federal o poder de exercer com exclusividade as funções de polícia judiciária da União (art. 144, § 1º, IV) e às polícias civis as funções de polícia judiciária nos Estados/Distrito Federal (art. 144, § 4º). A atuação do MP vem, como dito, da interpretação das funções institucionais cabíveis à instituição, tendo como referência o postulado dos poderes implícitos”, disse.
De acordo com Dutra, o que pode impedir o aumento da impunidade no país é a convivência harmônica dos órgãos de segurança pública e o MP, de tal forma que o Ministério se limitasse às investigações mais relevantes, sobretudo quando envolver, por exemplo, crimes contra a Administração Pública.
Publicado em Política na Edição Nº 14736
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