Depois de um ano cobrando punição para evolvidos na morte de seu filho Marcelo, o presidente da Embratur, Flávio Dino, decidiu criar uma organização não governamental para debater e prevenir erro médico.
“Se eu, advogado de formação, com todas as condições possíveis, tenho dificuldade de ver a Justiça feita, imagine pessoas em situações menos privilegiadas, sem tempo ou recursos para buscar seus direitos”, afirma.
“A entidade, batizada de Centro Brasileiro sobre Crimes para Saúde, deverá iniciar sua atuação neste mês. Com sede em Brasília, a ONG deverá manter um site com orientações para vítimas de erro médico.
Além desse serviço, a entidade deverá promover debate sobre as causas estruturais que levam às falhas e monitorar a aplicação de recursos públicos na área de saúde. “Temos organizações ambientais, de defesa do consumidor. Mas nada para defender o paciente dos abusos que são cometidos”, afirma.
Marcelo, na ocasião com 13 anos, morreu em fevereiro do ano passado, menos de 24 horas depois de ser internado na Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) de um hospital de Brasília, com uma crise de asma.
Dino conta que pouco antes de receber alta, o jovem recebeu uma medicação e passou mal. A médica de plantão não estava na sala, pois ajudava um colega a fazer um parto.
Ele sustenta que o medicamento foi aplicado de maneira inadequada, o socorro demorou e a médica estava nitidamente atordoada, porque vinha de uma jornada de trabalho de 23 horas.
“Disseram que meu filho não tinha resistido. Não resistiu a quê? Claro, a uma sucessão de erros”, afirma.
Batalha - Desde então, Dino ingressou com sete ações distintas. Até agora, apenas uma punição ocorreu - uma multa de R$ 10 mil para o hospital, aplicada pela Vigilância Sanitária. “A fiscalização atualmente é feita apenas quando provocada. Não há um monitoramento periódico. Um erro, sobretudo numa área tão sensível quanto a saúde”, diz.
O presidente da Embratur defende a criação de um sistema de avaliação constante, a exemplo do que existe na educação. “Quem fiscaliza quantos médicos o hospital tem de ter e quantos efetivamente tem? Quem fiscaliza quantas horas um médico tem de trabalhar?”.
Para Dino, há uma lógica mercantilista: hospitais ampliam o atendimento, mas não as equipes. Recrutam profissionais muitas vezes sem a capacitação adequada e os submetem a jornadas de trabalho excessivas. “Com esse quadro, o risco de erro no atendimento é enorme”.
Meses depois da morte de Marcelo, o chefe de gabinete de Dino, Paulo Guilherme de Araújo, enfrentou situação semelhante. Sua filha, de 2 meses e meio, morreu por infecção generalizada, consequência de uma coqueluche diagnosticada tardiamente.
“Foram cinco médicos até que o diagnóstico foi feito. A indicação era de UTI, mas um hospital não aceitou a internação. No outro, foram nove horas de espera até que o tratamento fosse iniciado”, conta Araújo.
Dino cita outros casos que marcaram 2012, como a morte do secretário do Ministério da Planejamento, Duvanier Paiva, por omissão de socorro e a de uma paciente depois de ter sopa injetada na veia. “São todos episódios que trazem causas comuns: condições inadequadas de trabalho, ausência de profissionais em número adequado, equipe com capacitação inadequada. Isso precisa mudar”.
Duas perguntas para Flávio Dino, presidente da Embratur:
O que precisa mudar?
Há uma fragilidade na fiscalização, uma burocracia que impede a punição dos culpados. Sem uma mudança, os erros vão continuar acontecendo. E responsáveis vão continuar colocando a culpa nas famílias.
O senhor sente culpa?
Já ouvi que, se não tivesse levado meu filho ao hospital, ele estaria vivo. Como alguém pode dizer que alguém erra por ser cauteloso? Ele entrou andando, saiu morto. Eu vi o que aconteceu. Algo que não sai da minha cabeça. Quanta gente que não sabe o que de fato aconteceu com seus familiares? Que ouve apenas “foi uma fatalidade, chore seu morto em casa”? Isso tem de mudar. (Assessoria)
Publicado em Política na Edição Nº 14644
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