A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) das Fake News ouviu ontem (29) autoridades e especialistas em nova audiência para discutir o assédio e a incitação a outras práticas prejudiciais na internet, bem como formas para combatê-las. O problema é um dos objetos de avaliação da comissão, para além de medidas contra as notícias falsas e a apuração de campanhas de desinformação nas eleições de 2018.
O professor de Direito e diretor da Organização Não Governamental SaferNet, que recebe denúncias de crimes de violações de direitos humanos na web, Tiago Tavares, ressaltou que especialistas e autoridades de diversos países discutem os problemas relacionados aos conteúdos que circulam na rede, que chamam de "desordem informacional".
A desordem informacional é composta por notícias falsas, consideradas "desinformação", mas também por outros tipos de mensagens voltadas a provocar dano, denominadas de "má informação". Entre essas mensagens, estão desde a incitação à violência e a outros crimes a conteúdos que visam intimidar, humilhar ou afetar a dignidade de outras pessoas.

Assédio
Tavares diferenciou dois tipos de modalidade do assédio online. Um primeiro teria caráter político e seria utilizado para, em disputas eleitorais e entre grupos partidários, atacar seus opositores. Esse tipo de conduta se beneficia do modelo de negócios de empresas que coletam dados dos internautas e traçam seus perfis, direcionando publicações específicas de acordo com suas características e sentimentos.
O diretor da ONG mencionou relatório recente do Instituto de Estudos sobre Internet da Universidade de Oxford, no Reino Unido, que identificou práticas de campanha de manipulação na internet, incluindo notícias falsas e assédio, em 70 países nos últimos anos. Diversas táticas analisadas no estudo foram identificadas também no Brasil.
Uma outra forma de assédio, disse o professor, seria a realizada entre crianças e adolescentes, também chamada de cyberbulling, no termo em inglês adotado também no Brasil. Nesse caso, jovens promovem ações na internet para constranger colegas, conhecidos ou terceiros. Segundo o docente e ativista, as respostas são diferentes para esses problemas.
"Não existe bala de prata. A experiência internacional tem mostrado isso. As tentativas açodadas de criminalizar o envio de conteúdos têm se revelado um grande tiro no pé. Isso põe em risco a liberdade de expressão. O foco deve ser em estratégias multissetoriais, procurar aumentar a capacidade de instituições em detectar inferências, responder em tempo hábil e fortalecer accountability [mecanismos de transparência e fiscalização]", explicou Tiago Tavares.

Investigações
O delegado da Polícia Civil e coordenador do Laboratório de Operações Cibernéticas do Ministério da Justiça, Alessandro Barreto, abordou os desafios dos investigadores para punir os crimes realizados na internet. Ele relatou crimes graves cometidos na rede, como registro e compartilhamento de imagens envolvendo crianças.
Na avaliação do delegado, as penas para abuso e exploração sexual no Brasil são insuficientes. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) estabelece o tempo de reclusão de quatro a oito anos para produção ou difusão de foto de sexo ou de caráter pornográfico envolvendo crianças. Barreto comparou com outros países da América do Sul, onde haveria casos de até 20 anos.
O delegado reclamou de dificuldades para a investigação dos crimes. Uma delas é o uso de tecnologias de IP (espécie de identidade de um dispositivo, como computador ou smartphone), que reúnem milhares de pessoas. Essas tecnologias, segundo o policial, atrapalham, pelo fato das investigações usarem o IP para tentar chegar aos autores.
Ele defendeu a transição para o modelo de IPv6, com maior número de IPs. .(Agência Brasil)