As primeiras entrevistas dos novos ministros sinalizam que o governo do presidente interino Michel Temer deve seguir algumas das ações elencadas no documento Uma Ponte para o Futuro, lançado pelo PMDB, partido de Temer, em outubro de 2015, para o país superar a crise econômica. E, mais recentemente, em abril, o partido lançou outro documento, A Travessia Social.

O documento Uma Ponte para o Futuro dá ênfase à necessidade de ajuste fiscal e de flexibilização do Orçamento. O texto afirma que a solução do problema fiscal “será muito dura para o conjunto da população” e que, se as ações para saná-lo não incluírem medidas estruturais, “a crise fiscal voltará sempre”. Segundo a proposta, houve elevação dos encargos do Estado e, com isso, alta de despesas.
“Muitos deles [encargos], [são] positivos e virtuosos, na área da saúde, da educação e na assistência social (…) Mas esta mesma Constituição [1988] e legislações posteriores criaram dispositivos que tornaram muito difícil a administração do Orçamento”, diz o documento, que defende o fim das vinculações constitucionais e indexações obrigatórias de valores.
“Diferentemente de quase todos os demais países, nós tornamos norma constitucional a maioria das regras de acesso e gozo dos benefícios previdenciários, tornando muito difícil a sua adaptação às mudanças demográficas”, exemplifica a proposta econômica. O PMDB defende, ainda, a desvinculação dos benefícios da Previdência do método de reajuste do salário mínimo.
O Uma ponte para o futuro propõe também um “Orçamento com base zero”, o que significa que, a cada ano, os programas de Estado seriam avaliados por um comitê independente, que poderia sugerir sua continuação ou extinção.
A proposta fala também na introdução de uma idade mínima para a aposentadoria, não inferior a 65 anos para os homens e 60 anos para as mulheres. Segundo o programa, a instituição da idade mínima poderá ocorrer de forma progressiva.
Na primeira entrevista à imprensa, nessa sexta-feira (13), o novo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, disse, sobre a reforma da Previdência, que é preciso garantir a solvência, ao longo do tempo, e a aposentadoria dos cidadãos no futuro.
Meirelles também disse que é necessário reduzir a indexação (atrelação a índices de correção) na economia brasileira e afirmou que precisa trabalhar com o crescimento nominal das despesas. Segundo ele, é preciso evitar a indexação generalizada e todo o processo que acentue essas práticas. “É importante que passemos a trabalhar com a fixação de tetos e metas nominais. Existe mais de um caminho a ser seguido”, disse Meirelles na entrevista.
Na mesma entrevista, o ministro Henrique Meirelles disse que o governo terá condições políticas para aprovar as mudanças fiscais necessárias no Congresso Nacional. “A minha avaliação é que a sociedade brasileira está amadurecida para medidas de ajuste importantes. O que não é possível, na experiência de todos, é continuar como está. Congresso e população estão prontos para ouvir uma análise realista do que é preciso fazer para recompor a renda”, enfatizou.
Meirelles disse ainda que o governo não teme manifestações diante da adoção de medidas duras para corrigir a economia, porque essas manifestações fazem parte da democracia. Meirelles lembrou que o mais importante é que prevaleça o interesse maior da sociedade. “Não vemos isso com grande apreensão. As pessoas que se sentirem prejudicados vão se manifestar. Faz parte da democracia”, disse.
Em A Travessia Social, os peemedebistas falam sobre necessidade de revisão dos programas do governo da presidenta afastada Dilma Rousseff. O documento diz que o ponto fraco dos programas atuais é a falta de uma cultura de avaliação que produza consequências. “O importante é que os benefícios precisam chegar aos destinatários e os custos de administração devem ser os mais baixos possíveis”, diz o texto.
O documento defende proximidade entre governo e setor privado, com transferência de atribuições. “O Estado deve transferir para o setor privado tudo o que for possível em matéria de infraestrutura”, afirma o programa. As privatizações são citadas ainda como sugestão para melhorias nos serviços de saúde. O PMDB defende uma nova lei de licitações e mudanças em outras normas sobre o tema.
Pacto social
Para Pedro Rossi, professor do Instituto de Economia da Unicamp, o governo Temer terá “muita dificuldade” em tocar as reformas propostas, por não ter um amplo respaldo popular e político. O economista também não é a favor da desvinculação de despesas previstas na Constituição.
“A vinculação decorre de um pacto social na década de 80, que resultou na Constituição, de construir no Brasil um estado de bem-estar social. Enfrentar essas reformas tal como está colocado no programa dele [Temer] seria ilegítimo e antidemocrático”, opina. Para o professor Rossi, mudanças dessa natureza só poderiam ser implementadas por meio de acordo com a sociedade.
O economista Júlio Miragaya, presidente do Conselho Federal de Economia (Cofecon), também é contrário à retirada de garantias e ao corte de despesas. Miragaya defende uma mudança do modelo tributário, para que seja possível manter a proteção social. “Tem que mudar o modelo tributário, começar a tributar os que têm maior renda e riqueza. Por exemplo, se a cobrança de tributo sobre lucros e dividendos tivesse uma alíquota de 15%, isso significaria perto de R$ 50 bilhões”, afirma.
Já o economista Gilberto Braga, professor da Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas Ibmec, tem opinião diferente. Para ele, é positivo que o governo peemedebista esteja disposto trazer à luz as questões da flexibilização do Orçamento e da desvinculação de benefícios da Constituição.
“O mercado nunca levou com muita seriedade as propostas de reforma [da Previdência] da gestão anterior, pois foi um governo que ficou anos no poder e não fez reformas estruturais. Chega a um ponto em que o sistema [previdenciário] se torna insustentável. Acho importante que, tendo contribuído toda sua vida, [o trabalhador] tenha garantias mínimas. Mas é importante que se debatam alternativas”, afirma Braga.
Para manter a vinculação atual do reajuste das aposentadorias ao salário mínimo, o economista diz que uma possibilidade é rever o método de cálculo da remuneração básica da economia. A fórmula atual, em vigor até 2019, leva em conta a inflação do ano anterior e o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB, soma dos bens e riquezas produzidos em um país) dois anos atrás.
Segundo Braga, a fórmula torna possível o ganho real mesmo quando a economia está em recessão, o que desestabiliza a Previdência. “Talvez a manutenção das aposentadorias com o salário mínimo só seja viável se a regra for mexida para reajustar, no mínimo, de acordo com a inflação. E, quando a economia estiver crescendo, aí sim é possível dar reajustes maiores”, opina. 
Atualmente, as regras para aposentadoria levam em consideração a chamada regra 85/95 progressiva. Alcançados os pontos necessários, o trabalhador recebe o benefício integral, e não há a aplicação do fator previdenciário. É possível aposentar com 100% do benefício quando a soma da idade e tempo for igual a 85, no caso das mulheres, ou 95, no caso dos homens. 
A partir de 31 de dezembro de 2018, a fórmula sofrerá acréscimo de um ponto a cada dois anos.  A lei limita o escalonamento até 31 de dezembro de 2026, quando a soma para as mulheres será de 90 pontos e para os homens, de 100 pontos. (Agência Brasil)