A Constituição Federal de 1988, no artigo 45, parágrafo 1º, delegou ao Congresso Nacional a tarefa de editar lei complementar sobre a distribuição de cadeiras da Câmara dos Deputados, de forma proporcional à população de cada unidade da federação. No entanto, passados 30 anos, a única norma em vigor sobre o assunto (Lei Complementar 78/1993) define apenas o número máximo de deputados na casa (513), o teto para o número de deputados para o estado mais populoso (70) e o patamar mínimo de oito políticos por estado. Não leva em conta mudanças demográficas, nem define regras para a inclusão ou exclusão de cadeiras.
Por causa dessa omissão do legislador, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, em parecer enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF), nessa quarta-feira (17), opina pelo recebimento da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO), apresentada pelo estado do Pará. Também requer a fixação de prazo pelo Supremo, para que o Congresso inicie o processo legislativo, delibere e aprove nova lei.
Ao justificar o posicionamento, a procuradora-geral ressalta que a negligência ou desídia na discussão e aprovação de leis são potencialmente lesivas à ordem constitucional. "Considerando o entendimento recente dessa Suprema Corte no que se refere às omissões inconstitucionais, é cabível o estabelecimento de prazo para que o Congresso conclua o processo", disse Dodge na peça.
Se, após estabelecimento do prazo pelo Supremo, ainda persistir a inércia do Legislativo, Raquel Dodge sugere a adoção da Resolução 23.389/2013 do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A norma - que, com base no censo de 2010 do IBGE, alterou o número de cadeiras na Câmara, foi declarada inconstitucional em 2014 por inovação indevida e usurpação da competência legislativa. "Não parece haver obstáculo à adoção, como parâmetro normativo, do regramento contido na Resolução 23.389/2013 do TSE, na hipótese de o Congresso deixar de cumprir o seu dever constitucional e não editar a norma que exige o mencionado preceito constitucional", pondera.
Justiça de paz - Em outro parecer enviado ao STF, a PGR defende o recebimento parcial de outra Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) relativa à criação das justiças de paz, que têm competência para celebrar casamentos, fazer conciliações, entre outras atribuições previstas em lei. O pedido foi feito por tribunais de Justiça e assembleias legislativas da maioria das unidades da federação e pelo Congresso Nacional.
No parecer, Raquel Dodge esclarece que a Constituição de 1988, no artigo 98-II, define que juízes de paz devem ser escolhidos por voto direto, universal e secreto, para mandato de quatro anos, porém, nunca houve esse tipo de eleição no país. Ao final, a PGR opina pela ocorrência de omissão por parte do Poder Judiciário nos estados de Alagoas, Goiás, Maranhão, Paraná, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rondônia, Rio Grande do Sul, São Paulo e Tocantins, pela demora em iniciar o processo legislativo; e por parte do Poder Legislativo da União, da Bahia e do Pará, pela morosidade em aprovar leis para instituir as justiças de paz no Distrito Federal e nos mencionados estados.