Desembargador José de Ribamar Castro abriu voto divergente

 Por 4 votos a 3, os desembargadores das Primeiras Câmaras Cíveis Reunidas do Tribunal de Justiça do Maranhão (TJMA) decidiram que uma candidata a vagas do cargo de Procurador do Estado não comprovou o direito à reserva destinada aos negros, de 20% das vagas oferecidas em concursos públicos de cargos efetivos, estabelecida pela legislação. A decisão reconheceu o direito de a candidata concorrer apenas às vagas de ampla concorrência e manteve o entendimento da comissão instituída para verificar a veracidade da declaração dos candidatos, que, por unanimidade, avaliou que a candidata não atende ao critério de cotas.

O entendimento da maioria do órgão colegiado do TJMA é de que a comissão é formada por especialistas em questões étnicas raciais e tem competência para decidir quem atende ou não à condição. Já a divergência entende que o artigo 2º da Lei Federal nº 12.990/14 condiciona o direito de concorrer às vagas aos que se autodeclararem pretos ou pardos no ato de inscrição, conforme o quesito cor ou raça utilizado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A candidata ajuizou mandado de segurança, apontando ato violador de direito líquido e certo seu, não amparado por habeas corpus ou habeas data a cargo do secretário de Estado da Gestão e Previdência do Maranhão, na condição de presidente da Comissão Central de Concurso Público, que resultou na sua desclassificação no concurso.

Voto do relator
O relator do mandado, desembargador Kleber Carvalho, votou pela concessão da segurança à candidata, ao argumento de que a comissão de concurso não pode, subjetivamente, estipular critérios para desclassificar candidato em certame público, nem sequer se omitir em indicar, de forma explícita, clara e congruente, os motivos de fato e de direito em que está fundado o ato, violando, assim, o princípio da vinculação ao instrumento convocatório e o dever de motivação dos atos administrativos enquanto elemento de sua validade.
O desembargador afirmou que a candidata juntou comprovação, em sua petição inicial, de que é negra/parda, por meio de critérios permitidos por lei e pelo STF, ou seja: Certidão de Cútis do Estado de Alagoas, na qual se declara que a impetrante é parda, além de fotografias pessoais e exame dermatológico.
Kleber Carvalho acrescentou que a leitura do “item V” do edital do concurso leva à mesma conclusão da Lei Estadual nº 10.404/2015 e da Lei Federal nº 12.990/14, quanto à adoção do sistema de autodeclaração para que o candidato venha a concorrer nas cotas de negro/pardo em certame. Para ele, a comissão do concurso não poderia vencer a presunção da declaração da candidata. O magistrado citou precedentes do Superior Tribunal de Justiça (STJ). O entendimento dos desembargadores Guerreiro Júnior e Nelma Sarney foi o mesmo do relator.

Voto divergente
Em sessão passada, o desembargador José de Ribamar Castro abriu voto divergente, entendendo que a candidata não pode concorrer às vagas destinadas às cotas, mas apenas às de ampla concorrência. Ele frisou que a comissão que fez a avaliação é instituída por lei e se faz necessária em todo concurso, por recomendação do STF. O magistrado registrou que, se apenas um dos três votos da comissão fosse favorável à candidata, ela teria mantido o direito às vagas por cotas, mas lembrou que a decisão que a eliminou foi unânime.
A desembargadora Angela Salazar, que pediu vistas dos autos, concordou com Castro na sessão seguinte. Ela destacou que a comissão do concurso indeferiu pedido feito em recurso administrativo da candidata, afirmando que o decreto estadual nº 32.435/2016 determina que serão avaliados somente os aspectos fenotípicos do candidato – conjunto de caracteres visíveis para considerá-lo negro - os quais serão verificados obrigatoriamente na presença do mesmo. Para a comissão, a ausência das características fenotípicas verificadas por estudiosos das relações raciais no Brasil descaracteriza a autodeclaração.
Angela Salazar lembrou que o edital previu, expressamente, que a autodeclaração seria confirmada por uma comissão e que não se consubstancia em presunção absoluta de afrodescendência, cuja veracidade pode ser atestada através de critérios de heteroidentificação - a confirmação, por terceiros, da raça autodeclarada pelo candidato. Ela citou entendimento do STF e jurisprudência de outros tribunais.
Ao analisar a declaração da candidata, de que é filha de pai preto e mãe branca, Angela Salazar advertiu que os critérios de ancestralidade ou consanguinidade constituem genótipos, e não foram contemplados na lei nem no edital do concurso. Por essa razão, entende que não são critérios válidos para definir se determinada pessoa é ou não negra, para que faça jus ao sistema de cotas.
O desembargador Raimundo Barros acompanhou o entendimento divergente, deixando o placar da votação em 3x3. O voto que desempatou o julgamento, contrário ao pedido da candidata e de acordo com a avaliação da comissão de concurso, foi do desembargador Ricardo Duailibe. Ele também entendeu que a comissão tem competência e formação suficiente sobre o assunto para decidir sobre quem tem ou não direito ao critério de cotas. (Processo nº 0802877-31.2017.8.10.0000). (Asscom TJMA)