Illya Nathasje

Perdemos o direito de ir e vir e de conviver socialmente. De nos abraçarmos. As medidas de contenção do novo coronavírus impõem essa sensação. De ausência da liberdade. 
Sem presença física, como celebrar o Pessach, a Páscoa Judaica? Não teremos famílias reunidas em volta da mesa nas duas primeiras noites durante a realização do Seder, mas o Hagadá, livro usado na noite de Pessach, não nos deixa esquecer do Êxodo: em toda geração deve o homem se sentir como se ele tivesse saído do Egito, ou seja, da escravidão para a liberdade. Mais que lembranças, é fazer dessa meia volta no tempo, um elo de geração que não se quebra, que não se rompe e mantendo vivo, nossos costumes e nossa fé. 
- "Por que esta noite é diferente de todas as outras noites?". 
Existente no Hagadá, essa não é mais uma pergunta somente para nós, a ser feita do dia 8, quando começou, até o dia 16, quando termina a Pessach. É um desafio pensar que toda a humanidade pela primeira vez, enfrenta um inimigo impiedoso, que de maneira instantânea cerca todas as cidades, invade todos os rincões. Não há portas nas favelas, nem porteiras nas mansões. Se a COVID-19 terrivelmente trouxe a sentença: na enfermidade ou na morte, somos todos iguais; trouxe também, a certeza: o mundo não será mais o mesmo. 
Nesses tempos de quarentena estamos presenciando atos de cooperação e solidariedade. E quando o sol sair, celebrando a vida, seremos todos iguais? Afastaremos de nós a exclusão e o egoísmo? Como tirar do sofrimento e da privação, também o privilégio, o preconceito e a violência?
A distância imposta pela quarentena se tornou nosso principal gesto de carinho. Tempos de coronavírus, quem diria, nos exige viver na fé e preencher o tempo, com os caminhos da reflexão. 
Superado esse vírus, como outros foram, isso será passado. Ressignificar a vida, será nosso futuro. - Essa, definitivamente será, uma outra travessia. Que nossos dias sejam sempre, mais longos.