Por muitos motivos vale a pena conversar com os moradores mais antigos da cidade. Há sempre boas histórias para serem contadas, muitas delas já perdidas; outras eventualmente conseguem ser resgatadas. É claro que se houver provocação aparecerão as ruins, mas da nossa parte, preferimos as boas histórias das quais Imperatriz é riquíssima.
A professora aposentada Maria Luísa Brandão mora aqui há 50 anos. Percebe-se, pelo entusiasmo vocabular como a mesma se refere às coisas da cidade, que tem paixão por essa terra, por essa região, por nossa história. A aposentadoria não conseguiu afastá-la do trabalho. Com a morte do marido, Mário Brandão, assumiu o comércio da família ali na Simplício Moreira esquina com Antônio de Miranda, onde diariamente recebe com uma alegria contagiante a freguesia. Só fecha mesmo na hora do almoço.
Quem é rainha nunca perde a majestade! Pois basta uma simples provocação para a dona Maria Luísa, com aquele jeito de “normalista”, aparecer com as muitas histórias que guarda na memória. Uma delas esses dias nos despertou a atenção: a de um benfeitor, um quase santo italiano que por anos fez história na região como religioso e médico. O franciscano Alberto Beretta.
Conta a professora que entre as décadas de 1960 e 1970, do século passado, quando o termo “célula tronco” ainda era pouco ou quase nem mencionado no Brasil, em Grajaú, o franciscano Alberto Beretta (1916-2001) já desenvolvia uma técnica de tratamento para diversos tipos de doenças a partir do uso da placenta, que hoje, sabe-se, é largamente usada pela ciência em pesquisas com células tronco, esperança de tratamento para inúmeras enfermidades.
Como hoje se sabe, as células-tronco, também conhecidas como células estaminais, são indiferenciadas (não possuem uma função determinada) e se caracterizam pela capacidade de se transformar em diversos tipos de tecidos que formam o corpo humano.
A dona Maria Luísa diz que conheceu bem de perto frei Alberto. Uma vez, recorda ela, levou o filho Francisco Brandão, na época com quatro anos de idade, para se consultar com ele em Grajaú. Estava com problemas na garganta. Ela conta que já havia recebido a recomendação para que o menino fosse operado para retirar as amígdalas, mas não se precipitou preferindo antes um contato com o religioso. “O Frei tratou meu filho, não foi preciso operá-lo”, rememora.
“Até paralítico ele fez andar com suas injeções de placenta”, recordou no meio da conversa com a dona Maria Luísa, o funcionário da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), antiga Sucam, Joaquim de Jesus. Ele diz que não chegou, como a professora, a conhecer o médico/frei, mas quando foi trabalhar em Grajaú se deparou com a fama dele. “Na cidade o que se falava é que vinha gente até de outros países se tratar com o Frei Alberto”, conta.
Antes de cair doente e voltar para a Itália (morreu em Bergamo em 10 de agosto de 2001), o religioso confiou a fórmula a auxiliares mais próximos, o que nos faz depreender que esse trabalho médico realizado na época, certamente em condições adversas, pode ser considerado um elo perdido das pesquisas com células tronco, e se houver interesse dos cientistas brasileiros há chances de ser resgatado, podendo auxiliar nas diversas pesquisas sobre o tema em andamento em todo o mundo.
Passados os anos, hoje os pesquisadores afirmam que graças ao desenvolvimento da chamada terapia celular, com células tronco, será possível, nas próximas décadas, restaurar células nervosas, ajudar na regeneração de órgãos como fígado e o coração e até a chegar à cura do diabetes tipo 1 e de doenças degenerativas como o Alzheimer.
O Frei Alberto, segundo relatos dos grajauenses mais antigos, parece que já sabia de tudo isso e durante anos curou muita gente nas barrancas do Grajaú.
Exibindo um “santinho” biográfico do frei Alberto, a professora Maria Luísa encerrou a história dizendo que não eram poucas as pessoas da cidade que saíam de Imperatriz enfrentando as dificuldades de transporte e a precariedade rodoviária da época para chegar até Grajaú com a esperança de encontrar a solução dos seus problemas de saúde com o religioso.
A conversa com a professora foi encerrada com um agradecimento, um abraço e a garantia de um breve retorno, e quem sabe o relato de novas histórias.
* Elson Mesquita de Araújo, jornalista.
Publicado em Cidade na Edição Nº 14854
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