O Consultório de Rua é um projeto do Ministério da Saúde, surgido no fim da década de 1990, na cidade de Salvador (BA), para atender à população em situação de risco e vulnerabilidade social, principalmente crianças e adolescentes usuários de álcool e outras drogas. Em Imperatriz, possui um plano de execução de 12 meses e o início dos trabalhos aconteceu em agosto de 2011.
Segundo a coordenadora do Consultório de Rua de Imperatriz, Nara Siqueira de Baptista, existe ainda um agravante em todo o sistema: além de toda essa fragilidade social e de saúde, os moradores de rua ainda têm uma grande dificuldade de acesso ao serviço. São pessoas que circulam na cidade, mas não entram nos espaços, ficam à margem do sistema.
O programa surgiu para que as pessoas necessitadas fossem atendidas nos locais onde elas permanecem. Uma van circula pela cidade para fazer a abordagem, que é o primeiro passo. A estratégia de abordagem é inspirada na ONG francesa Médicos do Mundo, que atende moradores de ruas e prostitutas em um ônibus equipado como se fosse uma clínica. Após um mapeamento para descobrir onde estão concentrados os usuários de drogas, os profissionais fazem a chamada aproximação, intervenção com a população local que pode levar de semanas a meses. “É preciso dar um tempo para as pessoas se sentirem seguras, entenderem que essa equipe de rua está lá para ouvi-las, orientá-las e cuidar delas”, revela Nara Baptista.
Após ganhar a confiança dos frequentadores do local e distribuir kits com preservativos, curativos, medicamentos, cartilhas e material de conscientização sobre o uso de drogas, a equipe do Consultório de Rua faz um intenso trabalho educativo e psicossocial com os frequentadores da região. “Quem conduz essa intervenção é o próprio usuário. As negociações levam em consideração se a pessoa quer ou não receber informações e orientações dos profissionais. Se houver confiança e vontade, surgem dúvidas, assuntos sobre família e drogas, sempre com respeito às escolhas do usuário”, disse a coordenadora.
Recolhimento e tratamento
“O nosso principal instrumento de trabalho é o vínculo e o desenvolvimento da confiança”, revela Nara Baptista. Pelo fato de serem pessoas que estão em atividades marginais, como o uso de drogas ilícitas, é preciso ganhar a confiança delas. “Muitas vezes chegamos a presenciar a venda, uso e tráfico de drogas, então, o contato deve ser cuidadoso para colher a história da pessoa e identificar a real necessidade da pessoa”, afirma a coordenadora. Segundo ela, o Consultório de Rua não tira a pessoa da rua, não recolhe.
O trabalho do Consultório de Rua em Imperatriz está muito bem embasado e segundo Nara Baptista, o projeto prevê o aprofundamento da questão, cobrando das autoridades um local de referência para os necessitados. Paliativamente, a equipe tenta inserir as pessoas em serviços assistenciais, fazendo uma ponte entre elas. Já foram encaminhadas pessoas para tratamento de HIV, de tuberculose e serviços da Secretaria de Desenvolvimento Social (Sedes). Além do encaminhamento, o projeto prevê também o acompanhamento.
Estrutura social do paciente
As pessoas que estão em situação de rua são encontradas em um leque bem variado de situações. Segundo Nara Baptista, é muito comum perceber nas abordagens transtornos psiquiátricos instalados. Nestes casos, os encaminhamentos são feitos para os Centros de Atenção Psicossocial (CAPs) para a assistência psiquiátrica. São pessoas que invariavelmente apresentam doenças como esquizofrenia e outros transtornos psiquiátricos, além de dependência química. Algumas pessoas, embora não apresentem esse transtorno psiquiátrico, estão afundadas em situação de violência, que não é apenas física, mas engloba aí um ambiente familiar muito ruim. Há pessoas que preferem viver nas ruas a enfrentar uma convivência familiar conturbada. Curiosamente, existem pessoas que gostam de viver nas ruas. Elas afirmam que ali é sua casa, que elas têm companheiros, filhos, mas por incrível que pareça, é nas ruas que elas encontram um espaço de acolhimento. Isso é curioso, é polêmico, mas retrata uma situação ilógica.
“Na rua, nós encontramos um pouco de tudo”, relata Nara. Para ela, o que fica muito marcante nas histórias que são ouvidas é a vulnerabilidade social, financeira, de desemprego, de um ambiente familiar muito tumultuado, de uso de drogas e transtornos psiquiátricos. Enfim, há uma série de fatores que vão se entrelaçando até chegar às ruas e aí a assistência também requer uma gama de complexidade da rede de atenção social.
Poder público trabalha com a construção de relações
A maioria dos moradores de rua que estão em Imperatriz é de outros municípios. As estatísticas confirmam essa afirmativa em abordagens feitas três vezes por semana na cidade.
A equipe do Consultório de Rua de Imperatriz é formada por dez pessoas, distribuídas pela coordenação, uma enfermeira, uma psicóloga, uma assistente social, dois redutores de danos, uma agente de saúde, uma técnica de enfermagem, um motorista e uma psicóloga supervisora.
Além das abordagens no campo, semanalmente a equipe se reúne para discutir o trabalho e desenvolver o planejamento de ações e supervisionar o suporte clínico do trabalho realizado. Além disso, são feitas reuniões com representantes de outros setores públicos para discutir casos específicos, como por exemplo, a incidência de tuberculose sem tratamento e o contato amplo com a Sedes. E assim, o caráter de política municipal de saúde se amplia, ganhando um caráter sócio-cultural. (Comunicação)
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