“PRINCÍPIO DA IGUALDADE”

O instituto da família tem previsão na Constituição Federal, a qual, em seu artigo 226, conceitua como sendo a base da sociedade e que, por isso, possui especial proteção do Estado. Em face deste interesse o STF interferiu na extensão da união estável, associando os mesmos direitos aos casais homossexuais que vivem nesse regime.
Durante muito tempo, a união prolongada entre o homem e a mulher, sem casamento, era conhecida por concubinato, também chamada de união livre, onde os casais viviam sob o mesmo teto, tendo a ausência do casamento formal. Visto que naquela época não havia nenhuma regulamentação sobre o assunto específico.
Segundo o grande doutrinador de Direito Civil, Carlos Roberto Gonçalves, “a primeira regulamentação da norma constitucional que trata da união estável, adveio com a lei nº 8.971/94, que definiu como companheiros o homem e a mulher que mantinham união comprovada, na qualidade de solteiros, separados judicialmente, divorciados ou viúvos, por mais de cinco anos”.
No entanto essa regulamentação foi alterada, gerando um novo conceito através da Lei nº. 9.278/96, omitindo os requisitos da pessoa natural, um tempo estipulado de convivência do casal e existência da prole, caindo em desuso a expressão “companheiros”, passando a ser conhecidos como “conviventes”.
Contudo, essas leis regiam que a união estável não poderia ter ligação a uma pessoa adulterina, não se admitindo a união entre pessoas que não estavam separadas de fato.
Com a inclusão da matéria no Código Civil de 2002, as leis mencionadas foram revogadas, sendo inseridos títulos referentes ao assunto no Livro de Família, incorporando-se em cinco artigos (1.723 a 1.727, CC), resguardando também o efeito patrimonial sucessório (art.1.790 do Código Civil).
A grande característica para a configuração da união estável é a falta de formalismo para constituir-se a mesma. Sendo que esta independe de qualquer solenidade, ao contrário do casamento, sendo como suficiente o requisito da convivência.
Um dos pressupostos da união estável era a diversidade de sexos, pois, como se assemelha ao casamento, diferenciando-se com os trâmites e formalismo da celebração, esta só poderia decorrer de relacionamentos entre pessoas de sexos diferentes, ou seja, homem x mulher. Tais regras foram quebradas com o reconhecimento da união estável homoafetiva.
A realidade atual impõe uma visão mais ampla na estrutura familiar, tornando imperioso inserir no conceito como entidade família os vínculos afetivos, que merecem a proteção do Direito das Famílias, pelo fato de envolverem sentimentos, direitos e livre arbítrio de sua orientação sexual.
O julgado do STF veio a consagrar os direitos em regras legais, sendo a maneira mais eficaz de derrubar preconceitos. Através desta decisão o Judiciário tende a suprir as lacunas legislativas, por meio de uma visão plural das estruturas familiares.
Para o STJ (Revista Jurídica Consulex, Ano XIV-Nº323, p.27), “os que vivem em uniões de afeto com pessoas do mesmo sexo estão enquadradas no rol dos dependentes preferenciais dos segurados, no regime geral, bem como dos participantes, no regime complementar de previdência, em igualdade de condições com todos os demais beneficiários em situações análogas”.
Tal decisão serve para amparar os direitos de todos os casais homoafetivos, assegurando-lhes igualmente todos os direitos inerentes aos casais heterossexuais, inclusive para fins de sucessão e de direitos previdenciários, podendo ser feita a inclusão de companheiros (as) como dependentes em plano de assistência médica.
Consoante o voto do Ministro Carlos Ayres Britto, ao julgar a ADIN 4277 e a ADFP 132, “tudo que não está juridicamente proibido, está juridicamente permitido. A ausência de lei não é ausência de direito, até porque o direito é maior do que a lei”.
O Supremo Tribunal Federal julgou tal decisão constitucional, baseado nas lacunas lei, pois, o que não está expresso não quer dizer que seja inconstitucional ou proibido.
Para Vecchiatti (manual da homoafetividade, 2008, p.368-369), “os princípios constitucionais da isonomia e da dignidade da pessoa humana, que possuem as qualidades de efetivas normas de eficácia plena, devem ser usados como paradigma na interpretação tanto das normas constitucionais quanto das infraconstitucionais. Afinal, ditos princípios demonstram a vontade primordial do constituinte, a saber, a proibição de discriminações arbitrárias, donde só se pode ter como possível a extensão dos regimes jurídicos do casamento civil e da união estável aos casais homoafetivos.”
No entanto, como é sabido, a ausência de previsão legal não implica na impossibilidade de aplicação dos princípios constitucionais da pessoa humana, sem distinção de raça, sexo ou preferência sexual, estando o princípio da igualdade atrelado ao princípio da antidiscriminação.
No ponto de vista da jurista Maria Berenice Dias, ao se manifestar sobre o assunto na sua obra, Direito Humanos e Afetividade, esclarece que “a sexualidade integra a própria condição humana. É um direito humano fundamental que acompanha o ser humano desde o seu nascimento, pois decorre de sua própria natureza. Como direito do indivíduo, é um direito natural, inalienável e imprescritível. Ninguém pode realizar-se como ser humano se não tiver assegurado o respeito ao exercício da sexualidade, conceito que compreende a liberdade sexual, albergando a liberdade da livre orientação sexual. O direito igualitário independe da tendência sexual. A sexualidade é um elemento integrante da própria natureza humana e abrange a dignidade humana. Todo ser humano tem direito de exigir respeito ao livre exercício da sexualidade. Sem liberdade sexual o individuo não se realiza, tal como ocorre quando lhe falta qualquer outra das chamadas liberdades ou direitos fundamentais”.
O Estado Democrático representa o reconhecimento de direitos, permitindo que os endereçados pela justiça se sintam como os seus autores e, nesse sentido, desconsiderar o outro como portador dos mesmos direitos é violar condição de legitimação essencial da democracia.
Essa nova concepção de entidade familiar baseia-se na perspectiva constitucional do afeto, da igualdade e da dignidade da pessoa humana, que está previsto no art. 5º da nossa Constituição Federal de 1988 – “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”; tais como no seu art. 1º, inciso III – “resguardando os princípios da dignidade da pessoa humana”, e também no seu art. 3º, inciso IV – “da vedação de discriminações odiosas”.
 É com base na Constituição Federal, que o STF se pronunciou, quando julgou a ADIN (Ação Direta de Inconstitucionalidade) 4277 e a ADPF (Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental) 132 regulamentando a União Homoafetiva, equiparando-a à união estável.

Janaina Reis – Acadêmica de Direito da FEST.