Uma cidade sem história se constitui na formação de um povo sem tradições, sem costumes e não tem como deixar uma herança cultural às gerações vindouras, pois a história é escrita diariamente, resgatando vultos e se transformando no arcabouço do patrimônio da comunidade, na alma de sua gente e como manancial de informações à sociedade.
Registrar cada fato, cada movimento cultural ou de cidadania nunca foi uma tarefa fácil, em especial quando não existem fontes de informação... mas é exatamente assim que a história de Imperatriz, desafiando tempo e espaço, tem sido escrita e certamente ficará como um grande legado às gerações que estão por vir.
Wilton Alves
Poder-se-ia afirmar que Imperatriz é o resultado de um conjunto de fenômenos naturais.
Quando o assunto é o seu crescimento na horizontal, considerando-se os seus primórdios a partir das primeiras ruas (ou avenidas) que foram abertas, destacando-se as atuais XV de Novembro, Coronel Manoel Bandeira e Godofredo Viana. O fenômeno principal está relacionado com a visão de homens que acreditavam no futuro, em especial com a notícia de que a rodovia Belém-Brasília estava em construção e passaria pela cidade. Era preciso, portanto, "povoar" de maneira ordenada as áreas existentes entre a BR e a Imperatriz existente naquela época.
O primeiro passo foi dado pelo prefeito Raimundo Moraes Barros, que delineou o prolongamento da Travessa Sul em direção ao hoje entroncamento da cidade, abrindo o que seria a "espinha dorsal" de Imperatriz, a Avenida Getúlio Vargas, bem como outras ruas e avenidas que possibilitariam à cidade ser dotada de um projeto transformando-a em um centro devidamente planejado ao longo de toda a Belém-Brasília. A cidade seria o entroncamento que interligaria três importantes regiões geográficas do País: Centro-Oeste, a partir de Goiás, e todo o Norte/Nordeste, assim como as cidades mais importantes do sul do Maranhão naquela época: Carolina, Barra do Corda e Grajaú.
Com a iniciativa do prefeito Raimundo Moraes de Barros, um cidadão fazendeiro conhecido como Antonio Galinha, também abre seus olhos para uma nova realidade que estava surgindo nestas paragens, e assim, contrata os serviços profissionais do único topógrafo existente na cidade, o senhor Vicente Bezerra Fialho, para planejar e transformar a sua fazenda em um dos setores imobiliários mais importantes de Imperatriz, que é hoje o Setor Juçara. Ruas foram abertas e o crescimento horizontal da cidade seguia seu rumo ao progresso e ao desenvolvimento.
Registro histórico
Existem poucas informações confiáveis sobre a história de Imperatriz. O acervo existente, em sua maioria, é fruto isolado de alguns pesquisadores, dentre eles Adalberto Franklin. No entanto, um dos depoimentos mais importantes sobre o período de crescimento da cidade de Imperatriz, na horizontal, se deve a uma carta redigida pelo ex-prefeito Gumercindo Milhomem e endereçada à Câmara Municipal, pois ele, ainda novo, aos 23 anos de idade, foi o primeiro prefeito da cidade emancipada.
Gumercindo Milhomem era o que se pode chamar de um "arquivo vivo" da história de Imperatriz. O relato-documento de sua carta à Câmara Municipal sobre a trajetória da cidade em seus momentos mais importantes não pode ser postergado ao esquecimento. Na verdade, constitui-se em um dos mais extraordinários depoimentos à própria história da cidade, que ao longo dos anos tem sido defenestrada por aqueles que nunca assumiram um compromisso sério com o seu progresso e desenvolvimento.
Mundico Barros era um visionário e em sendo assim, com o avanço da Belém-Brasília, tratou logo de elaborar um plano urbanístico para a cidade, que na época foi pensado por ele em sua própria visão: as ruas e travessas já se tinham prolongado o que podia. O ramal da Rodobrás ameaçava transformar-se numa rua sinuosa quando o prefeito Raimundo de Morais Barros sentiu que era necessário e urgente traçar um plano urbanístico para a cidade. Como a prefeitura não dispunha de engenheiros nem de dinheiro, traçou ele mesmo o plano da nova cidade, que teve como eixo uma avenida partindo da chamada Travessa do Sul, na cidade velha, cruzando o leito da Belém-Brasília. Dessa avenida central partiriam, de cem em cem metros, as ruas transversais.
O novo mapa constou de 23 vias públicas, 5 quadras destinadas a construção de praças e um estádio. E tão logo terminou o seu traço foram iniciados os trabalhos. A Avenida Getúlio Vargas foi a primeira a ser traçada. A Avenida foi aberta, destocada e loteada. A Rodobrás veio em ajuda. Construiu o bueiro da lagoa do Murici e piçarrou os trechos mais necessários.
A carta
Imperatriz, 7 de maio de 1994
Exmo. Sr. Presidente e mais membros da Câmara de Vereadores de Imperatriz
Nesta Cidade
Tenho a honra e satisfação de dirigir-me a essa Egrégia Câmara para pedir providências no sentido de ser sanada uma falta, que a cidade de Imperatriz, por intermédio de seus dirigentes, ainda não o fez.
Refiro-me a dívida que esta cidade tem para com um dos seus mais dignos e ilustre filho. Trata-se do ex-prefeito Mundico Barros. O seu nome completo é Raimundo de Moraes Barros, mas no coração de Imperatriz daquela época era ele o prefeito Mundico Barros, inteligente, honesto, corajoso, trabalhador e inteiramente dedicado a causa pública. Não mediu esforços no sentido de traçar e implantar a estrutura daquilo que é hoje a nossa querida Imperatriz.
Permitam-me os membros desta Augusta Casa que eu enumere aqui algumas que ele fez neste sentido.
Quando Brasília estava sendo construída, o Prefeito Mundico Barros participou de um Seminário Nacional de Prefeitos, no Rio de Janeiro, ainda Distrito Federal. Na ocasião também prefeitos maranhenses foram recebidos pelo grande Presidente Juscelino Kubitschek. Cada um falou de suas cidades, de suas pretensões. Ao falar de Imperatriz e região tocantina o Prefeito Mundico Barros, cumprimentou o Presidente e disse:
"Senhor Presidente, com certeza Vossa Excelência ligará Brasília ao mar. Para isso fará uma estrada cujo trajeto será senão aquele que obrigatoriamente passará por Imperatriz, pois ela está no caminho."
Surpreso Juscelino o olhou de soslaio e perguntou-lhe interessado:
"Então terei eu de obrigatoriamente construir esta estrada?"
"Com certeza". Respondeu Mundico.
E Juscelino, sorrindo enigmático:
"Você está certo."
Regressou à sua cidade confiante de que o Presidente faria a estrada. Recebeu meses depois com satisfação os primeiros homens e grandes máquinas que imediatamente a iniciaram. O trajeto realmente passava por Imperatriz, mas distante da cidade velha, como hoje uns três quilômetros.
Para ordenar a urbanização, capaz de receber o surto de progresso que deveria vir, como veio, traçou ele pessoalmente o plano urbanístico da nova cidade. O traçado saiu de sua mente privilegiada e a abertura a machado e a facão foi feita por ele, pelos fiscais da Prefeitura auxiliados por dois sobrinhos seus, e auxiliares de topógrafos da Rodobrás. Pessoalmente ele alinhava as ruas usando varas de Pindaíba, na falta de instrumentos adequados. Para que fiquem bem lembradas passo a citá-las.
No sentido perpendicular ao rio: Avenida Getúlio Vargas (já havia um início na cidade velha com o nome Travessa do Sul); Avenida BR 14 (hoje, Dorgival Pinheiro de Sousa); rua Luís Domingues; rua Benedito Leite; rua Aquiles Lisboa; rua Monte Castelo; rua Tamandaré; rua Tupinambá; rua José Bonifácio; rua Henrique Dias; rua Euclides da Cunha e rua Ana Nery (hoje, Henrique de La Roque).
Partindo da Praça Tiradentes: rua dr. Antonio de Miranda; rua João Lisboa; rua Bom Futuro (continuação da rua Benjamim Constant da cidade velha. Caminho da Farra Velha. Impedida por muito tempo de crescer por causa da Lagoa).
Partindo da Belém-Brasília: Avenida Babaçulândia; no sentido horizontal ao rio Tocantins, rua Coriolano Milhomem; rua Sousa Lima; rua Amazonas, rua Pará; rua Maranhão; rua Piauí; rua Ceará; rua Rio Grande do Norte; rua Paraíba; rua Pernambuco; rua Alagoas, rua Sergipe; rua Bahia; rua Minas Gerais e rua Rio de Janeiro. As praças Tiradentes (antigo campo de futebol), Praça Brasil; Praça Boa Esperança (mais tarde loteada por outro prefeito); Praça 7 de Setembro (mais tarde construído o mercadinho); Praça Lino Teixeira (Entroncamento, mais tarde cortada por outro prefeito pela abertura da rua Guanabara.
Outro trabalho de grande valor feito pelo prefeito Mundico Barros foi a escolha da área do novo aeroporto - Aeroporto Guilherme Cortez. Para efetuar o levantamento da área contratou ele o topógrafo Beijamim Rondan, filho do grande sertanista Cândido Mariano da Silva Rondan. Estava ele aqui acompanhando a abertura da Belém-Brasília. Fez o nosso prefeito diligências junto aos órgãos competentes e deu entrada no projeto que resultou na construção do nosso aeroporto.
Trouxe para Imperatriz, o SESP, serviço de primeira linha no apoio da saúde pública, que aqui ficou muitos anos fazendo diminuir a taxa de mortalidade infantil e a taxa de morte da parturiente que era realmente lamentável. Foi no SESP realizada a primeira operação cesariana de Imperatriz, pelo comitê medido do dr. Arnóbio. Foi também através do SESP que Imperatriz ganhou de presente o médico Carlos Gomes de Amorim (outra história muito digna).
Citar as realizações de Mundico Barros, como homem público, é tarefa longa que aqui pretendo resumir. Mundico Barros foi escrivão, Promotor Público, Vice Prefeito, Prefeito, Vereador, Presidente da Câmara, jornalista, redator do jornal "O Alicate" (década de 30), advogado provisionado, por muitos anos, o único fixo na cidade, advogando de graça as causas dos menos favorecidos. Sertanista, conhecia "in loco" todos os acidentes geográficos de importância deste município e adjacências e muitas e tantas coisas a que se dedicou tendo sempre o bem de Imperatriz como meta.
Como disse, senhor Presidente, senhora vereadora, senhores vereadores, são estes alguns dos grandes serviços que grande idealizador e homem público Mundico Barros fez por esta comuna. Ele é merecedor portanto de que o seu nome seja para e sempre perpetuado na memória dos imperatrizenses.
Como já fiz no passado através do vereador José de Ribamar Veiga, meu genro, renovo agora o meu pedido pela voz do jovem vereador e meu neto, Jorge Ney Bandeira.
Recorro a esta Câmara para que seja feita uma Lei mudando o nome da rua Bom Futuro para PREFEITO MUNDICO BARROS. E que seja também por Lei autorizado o novo plaqueamento da rua. Que a imprensa seja informada, bem como os moradores daquela artéria, mostrando-lhes a razão da mudança. Tenho certeza, todos estarão de acordo.
Escolhi este para fazer o meu pedido, por ser para mim um dia especial. Completo hoje 93 (noventa e três) anos de amor contínuo a Imperatriz. Agradeço a Deus tudo o que sou, tudo o que tenho e espero que ele me ajude nesta minha pretensão. Se eu conseguir ver transformado em realidade este meu velho sonho, será para mim, talvez a última vitória de minha vida.
Muito cordialmente
Gumercindo de Sousa Milhomem
(fonte da carta do senhor Gumercindo de Sousa Milhomem: livro Focalizando Imperatriz, editora Gráfica e Editora Amazônia Ltda. - rua Piauí, 153 - Juçara - Imperatriz-1995 - autores: alunos da Escola Rui Barbosa - Simone Azevedo Bandeira de Melo, Walterley Moreira de Jesus Júnior, Daniela Patrícia Silva Rocha, Fernanda de Oliveira Couto, Thony Elcen Leite Santos e Carla Fregona).
(a matéria de hoje é dedicada aos notáveis médico Mário Cortez e jornalista Coló Filho)
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