A história tem também as suas histórias. Assim é com Imperatriz desde a sua fundação, com seus personagens, mitos e a capacidade humana de criar heróis, fantasias e uma realidade extraordinária que está sendo consumida pelo tempo, que está sendo sepultada com seus autores porque ainda hoje, com toda a evolução social, política e tecnológica, a cidade continua esperando a criação do seu museu, e com ele o tombamento do patrimônio histórico de velhos casarões que estão de forma vil cedendo seus espaços (terrenos) para a edificação de áreas de diversão ou de modernos edifícios residenciais. A visão míope dos políticos não vai além da ganância do voto, e por isso a história perde o seu valor, a sua essência como arcabouço dos migrantes e pioneiros que construíram a cidade. Eles perderam a importância, de tal maneira que nem eles, os políticos, são capazes de declinar o perfil desses heróis "anônimos" que cederam seus nomes para ruas, avenidas, praças e logradouros públicos existentes desde o passado de Imperatriz. Hoje o importante é a bajulação barata, que sem constrangimento algum, negocia a consciência das ainda existentes "cabeças pensantes" da cidade. A história tem também as suas histórias? Claro que sim, e elas são contadas por velhos pioneiros que ainda se encontram no mundo dos vivos. Mas, até quando?
Wilton Alves
Possivelmente nenhuma outra rua teria tantas histórias para contar como a Rua Maranhão, pois nela está sepultada grande parte da memória da cidade, e lamentavelmente, no mais completo ostracismo, uma vez que as lembranças da velha cidade do período em que existiam apenas as ruas de Dentro, do Meio e de Fora, seguindo-se por um pequeno "trieiro" aberto no meio do brejo para alcançar o grande areal então existente a partir da atual Rua Maranhão, era o destino final de migrantes e pioneiros que iniciaram a construção de Imperatriz.
Nesse aspecto histórico é preciso lembrar que nesse período todo o município de Imperatriz era constituído de terras devolutas da União, e que com a chegada do primeiro morador, o migrante Amaro Bandeira, para formar a Fazenda Fortaleza, ensejou a vinda de novas pessoas que investiram na formação de outras fazendas, e assim, o perímetro urbano da cidade (atual Praça da Metereologia), era cercado de propriedades rurais, até que elas começassem a ser substituídas por novas ruas e avenidas, como foi, por exemplo, com o bairro Juçara.
É evidente também que o povoamento da Rua Maranhão se deu em consequência do crescimento de Imperatriz em dois sentidos que foram fundamentais para o seu desenvolvimento: do Entroncamento no sentido Rio Tocantins, e da Avenida Getúlio Vargas no sentido Entroncamento, uma "espinha dorsal" para que as ruas transversais tivessem o mesmo impacto, em especial, na área da construção civil. Historicamente este processo teve início na segunda metade dos anos 50 como resultado da construção da Rodovia Transbrasiliana e do trabalho desenvolvido por Mundico Barros delimitando uma nova área urbana para Imperatriz, que passou a ocupar as antigas fazendas existentes desde a sua fundação.
Revendo o passado
Quando o povoado que deu origem a Imperatriz estava apenas nas primeiras e poucas casas, além das "sedes" das fazendas existentes na região, o sepultamento das pessoas não tinha um local definido, um cemitério. A maioria dos entes queridos era sepultada nas proximidades de sua moradia, ou nas fazendas onde moravam e trabalhava, o que resultou na ausência de importantes informações sobre cada pioneiro, cada migrante que aqui deu sua vida, e hoje não tem sequer um túmulo para ser lembrado.
O povoado cresceu e tornou-se vila, e com o consequente aumento da população, foi necessária a demarcação de uma área para servir de cemitério. Não há registro da data em que a área foi demarcada, mas o primeiro cemitério de Imperatriz existiu pelo menos até 1959, conforme relata o migrante Deocleciano Pereira Araújo (Dió), que chegou à cidade neste ano, "e que o cemitério ainda estava recebendo novos sepultamentos."
Segundo o relato de Dió, este cemitério estava localizado no atual quarteirão da Rua Maranhão com a Avenida Getúlio Vargas, indo até os limites onde hoje está localizada a Rua Dorgival Pinheiro de Souza. No meio, relata Dió, "havia um grande pequizeiro, que foi cortado quando as novas ruas de Imperatriz foram abertas."
Deocleciano Pereira Araújo, o Dió, como é conhecido, veio para a cidade em 1959, integrando-se à equipe de trabalhadores da Rodobrás, além de por muito tempo estar sob o comando de Bernardo Sayão, com quem manteve laços de amizade até a morte do engenheiro nas proximidades de Açailândia, quando uma árvore caiu sobre sua barraca de trabalho.
Esta é apenas uma parte do passado de Imperatriz que não foi registrada para a história, o que torna quase impossível revivê-lo, a não ser por poucos sobreviventes daquela época que poderiam registrá-lo se a cidade tivesse um museu histórico e geográfico... Mas esta responsabilidade é dos políticos, e eles não se importam com isso.
Maranhão
Conforme vários dicionários da língua portuguesa, a palavra maranhão significa grande mentira; mentira bem tramada, bem urdida; assim como uma designação de flamincos (aves) e de tainhas (peixes); nas expressões mais modernas (em dicionários), maranhão passa a designar o Estado, que pode ser em razão de outra terminologia; terras baixas ou alagadas.
Imperatriz está inserida neste contexto, no entanto, desde a sua fundação, sem qualquer afinidade com a Capital ou o norte do Estado, pois existem diferenças sociais, políticas e culturais intransponíveis, em especial porque as autoridades políticas do Estado, em todos os tempos, parecem ter ignorado a importância de Imperatriz, inclusive para toda a Região Tocantina.
Apesar do significado da palavra maranhão, o território do Estado, suas terras e população, são de valores imensuráveis. O Maranhão tem terras férteis, chuvas regulares e potenciais turísticos invejáveis, desde o pantanal no Oeste às dunas dos Lençóis Maranhenses, no norte, assim como a potencialidade do turismo ecológico representado por vários municípios do sul, como Carolina, Riachão e Sítio Novo, além da capacidade extraordinária na produção de grãos, entre eles o soja, nos municípios de Balsas, São Domingos do Azeitão e Alto Parnaíba, onde está localizada a Serra do Penitente.
Apenas o processo migratório poderia explicar tantas divergências e diferenças existentes, pois Imperatriz foi e continua sendo construída por culturas de todos os estados brasileiros, e daí também as diferenças sociais e políticas, uma vez que a "tradição" cultuada na Capital do Estado e municípios a ela subordinados, não é a mesma em relação a Imperatriz, que tradicional e historicamente, sempre teve vida própria e voltada aos seus próprios valores, considerando que a cidade é forjada por um padrão econômico que necessariamente não passa pelo "cordão umbilical" do funcionalismo público, mas por investimentos empresariais e da construção civil que a tornaram como "capital econômica do Estado", e principalmente pela sua localização geográfica excepcional como o verdadeiro Portal da Amazônia, por onde também chegaram imigrantes italianos, americanos, espanhóis, japoneses, portugueses, chineses, sírios e libaneses.
Dimensão urbana
A Rua Maranhão desde a década de 60 não foi diferente das demais ruas transversais, embora tenha sentido o impacto de estar localizada em meio a um grande areal, o que para os céticos, inviabilizava qualquer investimento, em especial na construção civil, porque a visão daquela época era a de que no imenso areal era "impossível" qualquer construção. No entanto, migrantes e pioneiros haveriam de comprovar o contrário, como aconteceu, por exemplo, com a construção do Hospital São Raimundo.
No final dos anos 70 e início dos anos 80, a Rua Maranhão parece ter iniciado um novo ciclo histórico, mormente em relação a novos investimentos, inclusive públicos, que proporcionaram oportunidades imensuráveis para o desenvolvimento social e cultural da cidade. Foi em 1980, por exemplo, que a professora Maria Carmem Columbí, acreditando nas potencialidades e oportunidades oferecidas, abriu as portas da Escolinha Trenzinho do ABC, que é hoje uma referência para a educação em Imperatriz e para o Estado, porque hoje ela é o Complexo Educacional Dom Bosco, exatamente no local temido pelos céticos e medrosos, o antigo cemitério.
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