Elson Araújo

É impossível um brasileiro, seja daqui ou de qualquer outra parte do País, parar um pouco para pensar criticamente e não se preocupar com o futuro. Diante das conjunturas nacional e global, ninguém sabe o que há de vir. O cenário é de uma incerteza cortante.
O Governo Federal apresenta sinais de fragilidade, facilmente detectável ao se observar as decisões açodadas ao sabor dos acontecimentos, comportando-se como quem quisesse simplesmente aplicar um analgésico. Apanhado pelo elemento surpresa, não soube até agora lidar com o imponderável, como por exemplo, a onda de protestos que tomou conta do País. Como já dizia Goeth: "É na limitação que se revela o mestre", e infelizmente hoje quem conduz a nação ainda não apresentou-se como tal.
Enquanto metade do "gigante" permanece em estado letárgico, a outra metade, a que realmente banca a estrutura do poder governamental estabelecida com seus impostos e tributos mil, inquieta-se e continua indo às ruas reclamar o que lhe cabe nesse imenso e vazio latifúndio, no chamado contrato social e que não é lhe servida como de direito.
Nos últimos anos no Brasil não tem valido a pena abrir mão de direitos a favor desse monstro chamado Estado, já que não se tem quase nada em troca. O que temos é uma máquina de poder fragilizada que não consegue mais satisfazer o cidadão nas suas condições básicas de saúde, educação, segurança e até no singular direito de ir e vir.
Evoluímos muito em termos de carga tributária, uma das maiores do mundo, e regredimos em termos de respostas do Estado ante aos anseios da sociedade.
Nas páginas amarelas desta semana da Veja, o cientista político americano Francis Fukuyama analisa que o Brasil ainda não possui as bases de uma sociedade avançada e que a desigualdade pode levar ao radicalismo. Para ele, um estado moderno como expressão maior de poder é aquele capaz de aplicar as leis e de oferecer certos serviços exclusivos para a população. Afirma ainda o estudioso que é essa pouca participação do Estado na oferta desses serviços que tem levado a classe média do Brasil e de vários outros países a reivindicar a melhoria dos serviços públicos, o fim da corrupção, respeito ao meio ambiente.
Há muitos estudiosos, assim como Fukuyama, que compartilham dessa preocupação. O brasileiro André Mauro Lacerda, jurista potiguar mestre em Direito Constitucional, adverte que diante do que se vê hoje no País "não se pode perder de vista esse cidadão cada dia mais distante dos benefícios a que tem legitimidade e direito". Enquanto parcela da sociedade vai às ruas cobrar sua parte no contrato social, no poder estabelecido detecta-se uma guerra: Executivo, Judiciário e Legislativo travam barulhentas batalhas para saber quem tem maior controle dentro dessa estrutura. É um interferindo no outro. A tão propalada independência e harmonia entre os poderes há muito deixou de existir, e isso já é visível.
Em meados de maio, antes mesmo da eclosão dos grandes protestos, o também jurista Walber de Moura Agra comentou que o Executivo não tem cumprido com fidelidade sua nobre missão, que o Judiciário tornou-se um poder absoluto, que precisa de freios e ainda o Legislativo tornou-se uma oligarquia, numa alusão a essa desarmonia havida hoje entre os poderes. Essa guerra das variáveis de poder por hegemonia termina por fragilizar o poder central, e é nessa condição que se vê emergir o mais poderoso dos poderes: o poder do povo, o poder popular.
Expressão do Judiciário Brasileiro, a ministra do Supremo Tribunal Federal (STF), Eliana Calmon, do alto da mesma tribuna de Walber Moura Agra, sem medo de qualquer patrulhamento, defendeu a necessidade de se proteger, à luz da Constituição, os direitos do cidadão. Dizia que: "Não temos segurança pública, não temos segurança jurídica, e que para se viver bem seria preciso que os que nos rodeiam também vivam bem".
A ministra defendeu o que chamou de empoderamento do cidadão, a partir de uma mobilização nacional para a tomada dessa consciência. E é essa tomada de consciência, defendida profeticamente pela ministra Eliana Calmon naquela tribuna, que se vê, com o desconto dos excessos, hoje em quase todo o Brasil.
Diante do que se ouve e vê, independente da crise que grassa diversas nações, não se pode perder a esperança. O Brasil pode, sim, ser uma grande nação principalmente se o poder estabelecido começar a combater verdadeiramente os males que o corrói, entre eles um dos mais letais: a corrupção.
O povo brasileiro, como se tem dito, acordou e tem nas mãos a oportunidade e o poder de provocar de modo real uma profunda mudança de rumos no País. O que não se pode permitir é que o Brasil retroceda.
Mesmo diante de tantas incertezas, é saudável nesse momento da vida brasileira que o cidadão consciente acolha como missão o cuidado com suas escolhas e aposte no equilíbrio de forças para, dessa forma, ajudar a manter sólida a nossa ainda incipiente democracia. Avançar é preciso com o progressivo fortalecimento das instituições, defesa e respeito à Constituição Federal. Participar é preciso. Omitir-se, jamais. O sonho de um País mais justo e de uma democracia cada vez mais forte não pode parar.

* Elson Mesquita de Araújo, jornalista.