*Roberto Wagner
A nossa experiência como Estado Democrático de Direito, como se sabe, é relativamente curta. Alternando períodos de apenas quase normalidade e outros de profunda instabilidade, o Brasil nunca experimentou, de verdade, um ciclo, por pequeno que fosse, em que os poderes da República tenham realmente convivido, entre si, com absoluta independência e harmonia, para usar o célebre binômio empregado pela Constituição Federal.
Não faltará quem diga, focando somente esse parágrafo inicial, que este humilde e despretensioso escriba perdeu o juízo e que, portanto, não sabe o que está dizendo, já que, institucionalmente, o nosso país não apresenta qualquer sintoma que possa ser interpretado como eventual sinal de grave desorganização político-social, como a que hoje vive, por exemplo, a vizinha Venezuela.
É verdade, mas também não significa verdade menor ou menos relevante dizer que nunca (enfatizo: nunca) tivemos um momento, desde que Deodoro pôs a Monarquia abaixo, em que um presidente da República tenha deixado de se sentir mais importante e mais poderoso, agindo como tal, do que os outros chefes de Poder. Nem Fernando Henrique Cardoso, com toda a sua conhecida polidez e senso de medida, comportou-se de forma diferente. É que, pelas peculiares características de nosso presidencialismo, o exercente do cargo termina se transformando, às vezes até ao arrepio da própria vontade e/ou dos valores pessoais que efetivamente respeita e cultiva (caso de FHC), numa espécie de tiranete.
Os mais velhos sabem muito bem que, até um tempo não muito distante, o chefe do Poder Judiciário (falando-se aqui no Judiciário Federal), exatamente, talvez, por se sentir menor ou menos importante do que o do Poder Executivo, costumava se manter de boca fechada, só se dando ao luxo de abri-la em ocasiões verdadeiramente especiais. Eram tempos, enfim, em que não se via o presidente do Supremo Tribunal Federal, muito menos nenhum de seus ministros, reclamando de coisa alguma ou exigindo para a Corte o papel de protagonista disso ou daquilo.
Pois a coisa, cara leitora, caro leitor, mudou. Notadamente a partir da Lava-jato, embora trate-se de operação que se desenrola no âmbito da Justiça de 1º Grau, o STF, seja colegiadamente, seja pela manifestação individual de seus ministros, passou a falar e falar muito e falar grosso, como que dizendo aos demais poderes da República que, no bule deles, também tem café. Numa frase: diferentemente da passiva atitude de outrora, o Supremo está dizendo que, sem que se respeite o Judiciário, não há Estado Democrático de Direito, não há democracia, não há nada. Isso é bom. Torçamos para que o Executivo e o Legislativo saibam entender o recado dado, nesse momento, pela nossa mais alta Corte de Justiça. Até a próxima.
Advogado*
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