O Placar da Justiça, criado pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), informava às 09:37 do dia 25 de agosto de 2017, o total de 117.803.683 de processos em tramitação na justiça estadual, sendo que deste total 47.121.474 não deveriam estar no judiciário. E ainda, um novo processo chega às varas e fóruns do Brasil a cada cinco segundos!
O número chama atenção para alguns pontos:
1 - Ações judiciais protagonizadas por número limitado de atores nos polos ativo ou passivo como o poder público, órgãos nos âmbitos municipal, estadual e federal; pelo setor econômico-financeiro, instituições de crédito, financiamento e investimento; e, pelo setor de serviços, empresas de telefonia e comunicações, planos de saúde, dentre outros, correspondem a 51% dos processos existentes;
2 - O cumprimento da legislação, a garantia dos direitos dos cidadãos e a utilização de métodos adequados de solução de conflitos, poderiam evitar mais de 40% dos processos judiciais, que seriam resolvidos por meio de acordos e, geraria economia estimada em R$ 63 bilhões aos cofres públicos.
Apesar dos enormes esforços que estão sendo feitos no Brasil e no mundo, a demora das decisões judiciais traz um risco às partes, redundando muitas vezes em danos irreparáveis aos litigantes. A consciência da sociedade nos dias atuais passa a exigir a celeridade nos feitos; que os tribunais nacionais assegurem o acesso à Justiça, por meio da modernização do processo e de procedimentos operacionais e processuais, objetivando atender aos anseios sociais de uma Justiça equânime e justa para todos.
Solucionar conflitos decorrentes de relações jurídicas fora dos tribunais é uma tendência internacional que há uma década era quase inimaginável no ordenamento jurídico brasileiro, apesar da previsão legal de métodos para conciliação e mediação já fazerem parte do ordenamento jurídico pátrio há algum tempo. Isso se deve, historicamente, à atuação da advocacia brasileira ser motivada pelo litígio e pelo Estado/Juiz intervindo como pacificador das controvérsias.
Mas, o quadro da resolução de conflitos no Brasil está mudando.
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) contabilizou o número de processos resolvidos por meio de acordos, fruto de mediações ou conciliações, ao longo do ano de 2015, em toda a Justiça brasileira. O dado foi incluído na 12ª edição do Relatório Justiça em Números (ano-base 2015), publicado em 17 de outubro de 2017. Utilizando a base de dados dos tribunais, o órgão revelou índice médio de conciliação em 11% das sentenças, resultando aproximadamente 2,9 milhões de processos finalizados de maneira auto compositiva.
O índice de conciliação na Justiça Estadual foi de 9,4%, com 1,8 milhão de sentenças finalizadas com acordos. A Justiça do Trabalho está melhor colocada, com 25,3% das sentenças e decisões obtidas dessa forma (resultado de 1 milhão de acordos). A explicação do alto número de acordos na Justiça Trabalhista pode estar no próprio rito processual desse ramo, onde a tentativa de conciliação entre as partes ocorre em audiência antes de concluído o processo judicial. A Justiça Federal vem com apenas 3% das sentenças (105 mil casos).
Os baixos índices de conciliação apresentados pela Justiça Federal estão ligados ao perfil das demandas deste ramo de Justiça, em sua maioria conflitos que têm por objeto matérias envolvendo Direito Previdenciário, Tributário ou Administrativo, onde o poder público é um dos polos da relação jurídica processual, impondo entraves à celebração de acordos por conta da disseminação da ideia de indisponibilidade do interesse público pelo particular.
A conciliação tem sido adotada em várias áreas, como por exemplos em precatórios no Estado do Rio Grande do Sul, apresentando como resultado o pagamento de mais de R$ 10 milhões em dois meses. No primeiro semestre de 2017 atingiu 223 acordos junto à Câmara de Conciliação de Precatórios da Procuradoria-Geral do Estado (PGE-RS), oriundos do 3º Ato Convocatório. Os acordos reduzem em R$ 42 milhões o estoque da dívida de precatórios, mediante o pagamento de R$ 23 milhões aos credores. Apenas de, nos meses de junho e julho, período em que houve a reestruturação da Câmara de Conciliação e a designação de procuradores e servidores para atuação exclusiva, foram acordados R$ 10 milhões. A terceira rodada contou com 1.033 precatórios convocados, conforme lista fornecida pelo Tribunal de Justiça do Estado (TJ-RS). Em cerca de 60% das manifestações de interesse não foi possível apresentar propostas. Os principais impeditivos para isso são: pendência de habilitação de sucessores e definição dos respectivos créditos; precatórios já quitados; interessados não constarem mais como titulares, em virtude de cessão de créditos; irregularidade na habilitação de cessionários; e, inviabilidade de apresentação de proposta, pois o valor devido será quitado pelo pagamento preferencial. A PGE-RS, com o objetivo de ampliar o resultado positivo nas negociações, orienta os escritórios de advocacia e as partes a regularizarem os impeditivos antes de os precatórios ingressarem na Câmara para análise da manifestação do interesse. O 4º Ato Convocatório deve ocorrer na segunda quinzena de agosto, com previsão de chamamento de 300 precatórios, referentes ao ingresso nos orçamentos de 2001 a 2002, além daqueles que foram convocados em atos anteriores e, que não manifestaram interesse.
Outra situação que nos chama a atenção é a utilização de conciliação entre empresas em recuperação e credores.
Discussões sobre valores de créditos, nas recuperações judiciais, poderão ser resolvidas de forma mais simples e rápida em São Paulo. As empresas devedoras passaram a ter um caminho alternativo: em vez da abertura de incidente (que são pequenas ações dentro do processo), a companhia poderá realizar sessões de conciliação e tentar um acordo direto com os credores quando discordarem sobre a quantia devida.
O pioneiro na modalidade foi o grupo de infraestrutura Inepar - em recuperação desde 2015. São aproximadamente 14 mil credores sujeitos ao processo e há divergências relacionadas ao pagamento de aproximadamente 1,2 mil deles, o que demandaria uma análise individual das mais de mil ações e o tempo médio de seis meses a um ano para resolver.
As sessões de conciliação são realizadas fora dos tribunais, com as partes tratando diretamente dos problemas e cabendo a elas a tomada de decisão. As sessões são marcadas para 20, 30 dias e, lá se busca solucionar. O valor é alterado no quadro geral de credores já no dia do acordo. O processo de recuperação ganha em eficiência e, a empresa que está em crise ainda economiza com os custos que teria para resolver judicialmente essas pendências.
Outro bom exemplo é o da operadora Oi.
No dia 26 de junho, cerca de 20 mil credores do Grupo Oi, de telefonia, começaram a ser atendidos por meio de mediação extrajudicial no estado do Rio de Janeiro. Os interessados poderão receber valores de até R$ 50 mil. O processo será possível por meio da Plataforma de Solução de Conflitos da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
O Grupo Oi, que entrou em processo de recuperação judicial em junho do ano passado, tem cerca de 55 mil credores. Os pequenos são 85% dos credores da operadora, que está em recuperação judicial, mas, representam menos de 5% da dívida da companhia de R$ 65,4 bilhões e, a utilização da conciliação pode trazer celeridade e efetividade na solução do processo de recuperação judicial do Grupo Oi.
Diante do atual quadro brasileiro, portanto, devemos considerar os benefícios que as técnicas alternativas de solução de conflitos podem trazer para toda a sociedade, principalmente no que diz respeito ao acesso à Justiça. São métodos que não vêm para subtrair o trabalho dos advogados, nem reduzir a competência do Judiciário e, sim para, como são consideradas por vários profissionais da área jurídica, auxiliar, somar, incrementar a promoção da Justiça.
José Sales Ribeiro Júnior
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