Elson Araújo
No princípio, o clima de comoção popular. Entrevistas sofridas e revoltadas de parentes, amigos, testemunhas e de autoridades prestando contas do trabalho da Polícia. Mais um crime com requintes de crueldade registrado pela crônica policial da cidade. Crime elucidado em tempo recorde. Com muita calma, um visível olhar de satisfação beirando o riso e um tom de voz linear, o acusado confessa o crime diante da autoridade policial e das câmeras de TV.
Alcino Vilarins de Oliveira, “rapaz velho”, de 49 anos de idade - evangélico daqueles de não faltar a um culto, sujeito introspecto, entretanto antenado com as coisas do mundo globalizado. Um quase filósofo. “Depois do crime, não tive paz. Fiquei sentado no Tribunal da minha própria consciência”, disse ele numa entrevista primeira com o diretor regional de segurança, Eduardo Galvão, que se repetiu numa elucidativa e estarrecedora entrevista ao repórter Raimundo Roma, da TV Difusora.
A autoridade policial enquadrou Alcino Vilarins no crime de estupro de vulnerável com resultado morte, que prevê uma pena entre 12 e 30 anos de reclusão. Feito isto, é aguardar os procedimentos da Justiça até que saia a sentença. Como é de praxe, o caso ainda vai merecer alguns esparsos registros, talvez por no máximo uma semana, depois fatalmente cairá no esquecimento - a não ser que surja um fato novo.
Enquanto isso, “sentado no tribunal de sua consciência”, o até então insuspeito Alcino permanecerá recolhido, talvez imaginando quantas outras Kaylane Ferreira Frazão poderiam ainda ser mortas pelo “monstro” que declarou existir dentro dele, caso não tivesse sido preso.
Alcino matou Kaylane e queria que o mundo soubesse disso. O delegado regional Eduardo Galvão, sobre essa tese, declarou à imprensa: “Ele queria ser encontrado. Ele poderia ter dispensado o corpo no riacho Capivara, que passa próximo, mas deixou-o em local à vista, para que a população tivesse facilidade de encontrá-lo”. Todos hão de convir, trata-se de um comportamento nada ortodoxo para quem acabara de praticar um crime bárbaro contra uma ainda quase criança.
Embora não se possa afirmar ainda, não precisa ser nenhum especialista para se chegar à conclusão que Alcino Vilarins, “o açougueiro da JK”, como chegou a ser chamado num dos textos publicados sobre o caso, se enquadra dentro de algumas das formas de psicopatias descritas pelos estudos psiquiátricos e que algum “gatilho” deve ter “libertado o monstro” que ele disse que estava preso dentro dele. Talvez esse fato nem seja aventado durante a instrução processual, ou objeto de algum estudo mais aprofundado acerca da personalidade do acusado, entretanto, pelo modo de ele agir, parece que matar a menina foi apenas a extensão de algo que, na verdade, ele queria matar dentro dele. Os estudos freudianos talvez expliquem melhor esse meu arremedo de teoria. Não vou me arriscar nessa seara, no entanto “abriremos diálogo” com a psiquiatra Ana Beatriz Barbosa Silva, autora de Mentes Perigosas. O Psicopata mora ao lado.
A descrição de Beatriz Barbosa do que é um psicopata se enquadra, pelo menos até agora, no que se percebeu no comportamento de Alcino Vilarins externado após o crime.
Diz a autora: “Inteligentes, envolventes e sedutores, não costumam levantar a menor suspeita de quem realmente são. Podemos encontrá-los disfarçados de religiosos, bons políticos, bons amantes, bons amigos. Visam apenas o benefício próprio, almejam o poder e o status, engordam ilicitamente suas contas bancárias, são mentirosos contumazes, parasitas, chefes tiranos, pedófilos, líderes natos da maldade”.
A estudiosa ressalta ainda que os psicopatas apresentam níveis variados de gravidade: leve, moderado e severo. Os primeiros, segundo ela, se dedicam a trapacear, aplicar golpes e pequenos roubos, mas provavelmente não sujarão a mão de sangue ou matarão suas vítimas. Diferente dos últimos, que põem “a mão na massa”, com métodos cruéis sofisticados, e sentem um enorme prazer com seus atos, no que se parece emoldurar Alcino Vilarins.
Ana Beatriz escreve ainda que a parte racional dos psicopatas é perfeita, diferente dos sentimentos, sendo estes, na descrição da autora, “deficitários, pobres, ausentes de afeto e profundidade emocional”. Assim, ressalta ela, “concordo com alguns autores que dizem que os psicopatas entendem a letra de uma canção, mas são incapazes de compreender a melodia”.
O cruel, quando a autora se refere a “esses seres”, é que a maioria deles está do lado de fora das grades, convivendo com todos, morando ao lado e, por vezes, dormindo na mesma cama. Dissimulados, são difíceis se serem identificados, exceto quando “libertam o monstro” que habita dentro deles e cometem atrocidades, como o assassinato da menina Kaylane Ferreira Frazão.
Não sei, nem vou arriscar a teorizar a respeito de como surge um psicopata, isso fica para os especialistas, no entanto fica o registro e o alerta que de fato, como diz Ana Beatriz Barbosa, eles {os psicopatas} estão em todos os lugares com seus demônios prontos para serem liberados, felizmente, pelo menos no caso de Alcino Vilarins este foi identificado e preso antes que fizesse outras vítimas além da jovem Kaylane.
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