A multidão gritava vibrante como quem acabara de vencer uma guerra. Mas ela não sabia que aquela morte comemorada era a vitória que o crucificado estava em busca. “Tende bom ânimo eu venci o mundo”. Venceu? Ele não pegou em armas! O único homem que venceu o mundo o fez em secreto, sangrando, sem posses, sem exércitos. Este herói a história não lembra, a humanidade esquece. Por isso há papais noéis e coelhinhos no lugar errado. Presentes e festas são mais interessantes que uma vida de servidão e entrega.
Este herói venceu amando e sendo odiado, recebendo calúnias e doando perdão, distribuindo vida e sendo crucificado. Resgatou o lugar da mulher, enfatizou a riqueza do pobre, a liberdade do preso e a cura do doente. Mas desse Jesus ninguém lembra, porque não é importante. Afinal, Ele não vem nem com ovos de chocolate.
Ele não veio nos trazer posses materiais – Ele veio nos arrancar delas. Nunca houve alguém tão revolucionário: Ele venceu nascido em uma estribaria; sendo coroado Rei em cima de um jumentinho; venceu recebendo uma coroa de espinhos, carregando uma cruz como ladrão; tornando-se maldição para abençoar; lavando os pés do seu traidor, sendo beijado falsamente por este; cuspido na via sacra; faminto no deserto. Assim, viveu como homem, sem se parecer com o ser humano exatamente para resgatar a humanidade que perdemos.
Ele só podia ser um lunático, um homem ambicioso e prepotente, um mentiroso! Mas que mentiras coerentes ele nos trouxe! O homem que ‘teve sua ressurreição forjada’ e mesmo assim fez questão que fossem quatro mulheres que avistassem primeiro sua tumba vazia. Esse era Jesus, o Cristo que para dar vida, morreu. Veio trazer uma nova ordem de vida, de amor, um caminho de desprendimento de sujeição ao próximo que ninguém jamais conhecera.
Aqui está a plenitude da fruição do ser: amar a Deus, amar ao próximo. Ele deixou-nos o conselho de morrermos também, junto com ele, para nós mesmos. Olhando esse cenário, parece uma piada historiográfica esconder tudo isso e pôr coelhinhos e ovos de páscoa no seu lugar. Algo que pode mudar o nosso ser, criado para fazer parte dele, trocado por símbolos quase fálicos. Isso mostra os valores que interessam nosso mundo. Como se não bastassem os que vendem Jesus em seus templos, vendemos o dia em que devíamos lembrar-nos dele, fazemos comércio de sua cara.
Jesus não está morto, mas fazemos questão de matá-lo todos os dias, todas as vezes que negamos ser como Ele nos ensinou, que negamos sua memória. Por isso, precisamos ressuscitar com Ele a cada manhã. A tumba já está vazia, mas lá é nosso lugar de retorno. Nossos dias irão sempre nos matar e é aí que precisamos nascer de novo. Nascer em Cristo, para uma nova vida. Celebremos nossa morte para vida terrena, nossa morte com Cristo, nosso ressuscitar para a eternidade.
O episódio da Cruz foi a maior expressão de fraqueza, mas não de Cristo e sim da humanidade. Não entendemos quem era aquele homem. Falam da “maldade de Deus”, mas ali foi o auge de sua bondade e a maior expressão de nossa maleficência.
A Páscoa continua sendo uma das representações dessa fraqueza, por estar escondida com símbolos e representações agregadas gratuitamente. Jesus não trouxe ovos de páscoa, não tinha cara de coelhinho. Mas ironicamente é assim que Ele é lembrado, ou melhor, esquecido.
Que neste domingo de Páscoa venhamos reconsiderar a proposta de Cristo para a humanidade. Lembrar que Ele morreu para vencer a morte, que Ele morreu na morte que o mundo forjou para poder viver e dar a vida que só passou a existir a partir da sua expiação. No seu último suspiro, estava consumado, fomos reconciliados com Deus.
Que esta esperança de nova vida nos invada a cada amanhecer, que Cristo reine em nós. Que nosso velho homem morra e um novo homem seja ressurreto. Que este Jesus, este herói servo esquecido seja resgatado em nosso ser e a esperança de vida ressurja neste dia de Páscoa.

NATALIA MENDES
GRADUANDA EM CIÊNCIAS HUMANAS
BOLSISTA PROEX CIDADE DAS MEMÓRIAS
INTEGRANTE DA ALIANÇA BÍBLICA UNIVERSITÁRIA (ABU) - GRUPO DE IMPERATRIZ