O tema não é novo, contudo no momento é pertinente que se volte a ele. Uma cidade não é só o prefeito, os vereadores, os juízes de direito, promotores de justiça; as lideranças eclesiásticas, os presidentes de associações, as lideranças com ou sem mandato político partidário. Uma cidade, uma sociedade é todo mundo junto e misturado, cada um com sua responsabilidade, seja institucionalizada, ou não.
Para se viver em sociedade é necessário que se siga normas, sejam as positivadas, as sociais, éticas, morais ou religiosas. Sem regras mergulharíamos num anarquismo total; doutrina, que segundo os estudiosos, é típica de países atrasados e que pugna pelo direito de usufruto de toda a liberdade, sem limitação de normas, de espaço e de tempo. É linda do ponto de vista teórico, mas impraticável, e nociva a qualquer sociedade.
Impossível viver sem regras, sem normas que conduzam as sociedades pelas vias do equilíbrio, respeito mútuo, respeito às instituições, ao meio ambiente e a própria vida.
As normas, num sentido amplo, funcionam como barreiras para infinitas impropriedades ou desatinos humanos. Desde o simples ato de não aumentar o volume do aparelho do som para não tirar o sossego dos vizinhos, ao de não falar alto, nem utilizar o celular em bibliotecas, igrejas, reuniões; avançar os sinais de trânsito, ou mesmo não matar alguém porque este pisara no pé de uma pessoa, deixou de pagar uma dívida, ou olhou outrem com "a cara feia".
As barreiras éticas e morais, bem como as tipificadas pela legislação vigente, são necessárias para que haja o chamado equilíbrio social. As primeiras são produtos do meio, adquiridas, ás vezes, naturalmente por meio dos costumes transmitidos de pai para filho, da igreja, da escola; as segundas, foram aos poucos positivadas pelo legislador.
Uma parcela considerável do povo brasileiro, com tristeza se admite isso, apresenta dificuldade para cumprir regras e obedecer normas, sejam as morais ou as constantes na legislação. Falta de fiscalização e ação das autoridades, dirão uns. O problema é cultural afirmarão outros. Pelo que se depreende, a partir da observância do dia a dia das cidades e das gentes do Brasil, pode-se se arriscar mais uma teoria para esse comportamento, com viés anarquista, cada dia mais presente na sociedade: seria esse problema uma questão puramente ética subjetivista, partindo-se do principio que cada um costuma encarar as coisas por um ângulo estritamente pessoal em detrimento dos outros. Os outros, as autoridades, as instituições que se danem, o que importa é o meu pirão.
O conhecidíssimo dito popular "farinha pouca, meu pirão primeiro", ao ser analisado no sentido, talvez elucide o comportamento egoístico dessa parcela da sociedade, que ao tempo em que se nega a seguir regras e a defender, em detrimento dos outros, seu "pirão primeiro", se omite de dar sua contribuição para que se tenha uma sociedade um pouco mais harmônica. Dito isto, encerro a coluna de hoje com uma citação do desembargador do Estado de São Paulo e secretário-geral da Academia Paulista de letras, José Renato Nalini: "Depois de milhões de anos de existência sobre a Terra, continua a criatura humana a defrontar-se com os mesmos problemas comportamentais que sempre a afligiram: o egoísmo, o desrespeito, a insensibilidade e a inadmissível prática da violência". (Naline, 2005).
Elson Mesquita de Araújo, jornalista.
Publicado em Cidade na Edição Nº 14966
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