“Vim de Passagem Franca com destino ao Tocantins, em 1961. Passei por Imperatriz, mas minha vontade era de ficar aqui, aí em 1966 eu voltei pra cá, pra morar”. Há 46 anos trabalhando no Mercado Municipal Bom Jesus, na rua 15 de Novembro, o comerciante Antonio Fernandes Sousa, 74 anos, conta histórias que vivenciou e presenciou.
“Seu” Antonio diz que sempre desejou morar em Imperatriz. No início da década de 1960, ele saiu de sua terra natal – Passagem Franca – a convite de parentes para morar em Olho d’Água do Coco-TO. A viagem feita em pau-de-arara, durante quatro dias, fez uma parada em Imperatriz, em frente ao mercado municipal, onde cinco anos mais tarde “Seu” Antonio Fernandes voltaria para trabalhar.
“Era um mercadozinho muito fraquinho, só a frente era construída, tinha uma casinha na frente pra cortar carne, aqui pra trás era tudo aberto, os boxes eram fechadinhos, mas no meio era tudo aberto, era tipo um quintal”, descreve.
“Seu” Antonio lembra que o “mercado velho”, como se refere ao local, era movimentado e diz sentir saudades daquela época: “Aqui era muito movimentado, Imperatriz era só da Praça de Fátima pra cá, não tinha nada. Eu vendia secos e molhados, a mercadoria vinha, para os armazenistas, de Goiânia, São Paulo... até onde, hoje, é o Entrocamento. Lá a mercadoria era descarregada e trazida em lombo de animal até o mercado, em Imperatriz não tinha carroça. Lá no Entroncamento era como um povoado pequenininho, tinha um posto e um monte de caminhão. Mas tinha mercadoria que chegava pelo rio Tocantins, vinda de Recife. Essa, como era aqui pertinho, no Porto da Balsa, os amigos traziam no ombro. Tenho saudade, demais da conta, era movimentado, todo mundo era meu amigo”.
Hoje o estabelecimento de Seu Antonio vende mercadorias variadas e comida caseira. A cozinheira e esposa, dona Raimunda, em meio às refeições servidas, trata de “ajudar” ao marido a lembrar de alguns detalhes das histórias. Volta e meia, ele diz: - Como é dona Raimunda... me ajuda aí!
Ele me chama assim, diz ela, a sorrir. Dona Raimunda conta que chegou em 1980, vinda de Estreito. Separada, conheceu no “mercado velho” o futuro marido. “Vim para trabalhar, aí conheci seu Antonio e logo logo nós casamos... Ele também era separado, a outra esposa ficou no Tocantins. Nós temos três filhos, tudo criado com o trabalho daqui do mercado”.
No box de “Seu Antonio e Dona Raimunda” são servidos, diariamente, cozidão, assado de panela, frango frito e panelada. O casal diz que, ao longo de todos esses anos trabalhando ali, os clientes se tornaram amigos, os mais antigos trazem os filhos e netos e todos os dias chegam novos clientes. Seu Antonio conta que na década de 1960 chegavam caminhões e paus de araras com pessoas vindas de vários lugares do país. Segundo ele, um “pé de manga” abrigava a quem chegava: “Vinha gente que passava pro Pará, pro Tocantins... pra um monte lugar, e tinha muita gente que resolvia ficar. Tinha um pé de manga aqui na frente [do mercado] e eles ficavam aí debaixo... Pensar que não, arrumava um cantinho, ia conversando e já arrumava um barraco por aí, até a década de oitenta ainda passava muita gente que ia para os garimpos”.
O bem humorado comerciante comenta que os filhos já “saíram” de casa e hoje, sozinho com a mulher, passa a manhã trabalhando. “Trabalho de mais aqui, falto me arrebentar de trabalhar...”. A mulher emenda: “É... sentado aí nessa cadeira”. Seu Antonio ri e diz: “É desse jeito, aí de tarde a gente vai pra casa... cansado de trabalhar”.
Seu Antonio retoma as memórias: “Eu achava que o movimento era grande aqui. Quando foi se elevando mais um pouco, inventaram um mercado bem ali na Praça de Fátima, era cheio lá e aqui... E mais tarde fizeram lá o Mercadinho, e hoje é tanto mercado que não dá nem para saber”, conclui.
Seu Antonio relembra as pessoas ilustres que viu em Imperatriz. “Já veio muta gente importante aqui, tanta gente que nem dá para lembrar. Veio o presidente Castelo Branco, o Figueiredo, o Zé Sarney” – neste momento, Dona Raimunda completa: - É, ele veio aqui, ele morava bem aí em São Luís! Seu Antonio continua: - O Lula veio várias vezes, a Dilma ainda não veio não, mas o Fernando Henrique veio... vi esse povo todo”.
No Mercado Municipal, hoje, existem oito boxes. Segundo o casal Antonio e Raimunda, alguns “proprietários” trabalham desde a inauguração do mercado, outros são filhos dos primeiros donos.
Publicado em Cidade na Edição Nº 14245
Memórias de Seu Antoniao e Dona Raimunda
Antigos comerciantes do “mercado velho” de Imperatriz
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