Quando recebi a triste notícia da morte de Roberto Chaves (fato corrido no domingo, 22/02), revivi, quadro a quadro, o longo tempo de trabalho vivido ao lado dele na Rádio Mirante AM, onde eu exercia a função de redatora e repórter do noticiário principal da emissora, o Jornal da Mirante AM, ao lado de Régina Santana, Marilene Almeida, João Rodrigues, Elson Araújo, Coló Filho, Aldeman Costa (in memorian) e outros não menos conhecidos e talentosos.
Parece que foi ontem. A rotina estressante - porém infinitamente compensadora - da redação do departamento de jornalismo da rádio voltou à minha mente e com uma imagem inesquecível: aquele locutor chamado de peso pesado, de voz forte, físico igualmente avantajado e talento exageradamente superior. A cena era a mesma, todos os dias e no mesmo horário: às 11:55h. Ele encerrava o programa matutino (Conversa Franca), se despedia dos ouvintes e fazia a chamada para o jornal, sequência da programação.
Ao sair do estúdio, impreterivelmente passava-se em frente à redação, cuja parede era dividida ao meio por uma grande vidraça, que dava visibilidade ao largo corredor que acessava os estúdios das rádios AM/FM, a discoteca e sala de áudio, onde o jornal era editado. Ao passar em frente à redação, ele acenava em silêncio com a mão aberta, informando que faltavam só cinco minutos para a abertura do jornal. O gesto parecia automático. Ele acenava mesmo sem olhar para dentro da sala, sem conferir se sua mensagem havia sido receptada.
Cinco minutos era apenas o tempo de a gente intercalar as laudas do noticiário e lá vinha ele, depois de um gole de água para hidratar a garganta, retornando ao estúdio para apresentar o jornal, que iria ao ar, ao vivo, pontualmente às 12:00h. Ao passar em frente à redação, acenava outra vez. Agora eram só dois dedos, como se faz para sinalizar a vitória. Faltavam apenas dois minutos. O velho rádio ligado, como convém a toda redação que se preza, rodava a última música.
Nesse ínterim, com adrenalina a mil, eu e Régina saíamos correndo com as laudas nas mãos, passávamos por ele em frente ao estúdio da FM, entrávamos no estúdio da AM e colocávamos as laudas sobre a bancada de apresentação em frente aos microfones daqueles direcionados. A essa altura já estava no ar o prefixo de abertura do jornal, geralmente sob o comando de Mano Santana, que exercia a função de operador de áudio. Eu olhava para o alto da parede, no fundo do estúdio e o clássico relógio a pilha já marcava 11:59h. Faltava só um minuto.
Naquele momento, Roberto Chaves apontava na porta do estúdio, com sua inseparável agenda apoiada no antebraço, acomodava-se na reforçada cadeira de madeira, apoiava os cotovelos sobre a bancada e, com voz inconfundível e o sotaque paraense, anunciava a hora certa, pontualmente: 12:00h, dava o seu cordial boa tarde, iniciava a escalada de notícias. Só então, eu e Régina voltávamos à redação e respirávamos aliviadas com a certeza do dever cumprido e a disposição de nos preparar para uma nova batalha, e no dia seguinte fazer tudo outra vez. Depois da luta e do leão de cada dia, mal sabia eu que, dentro de pouco tempo, além de redigir eu também estaria ali, ao lado dele, apresentando o noticioso maior da emissora AM.
Bons tempos aqueles! É com saudade que recordo tudo isso, inclusive aquele locutor, que não por acaso era o diretor da rádio, portanto o chefe. E na condição de chefe, parecia, às vezes, intolerante. Tinha fama de durão, mas era, sem dúvida, um grande ser humano. Sabia reconhecer o trabalho e o talento de seus colaboradores. Um comunicador nato. Dava brinde até de sabão em pó. Para ele, valia tudo para cativar e agradar o ouvinte.
O grande radialista Roberto Chaves era daqueles que fazia de um limão uma limonada. Precisava apenas de uma cadeira forte, um microfone, uma linha telefônica (celular era uma novidade recente, na época) e não mais do que uma ou duas horas para ele vender a publicidade de uma transmissão de futebol, de um bingo ou mesmo de quatro longas noites de carnaval de clube (tradição ainda viva na segunda metade dos anos 90) e “engordar” o saldo do departamento comercial da rádio.
Como Tim Maia, Roberto Chaves era exagerado: no peso, na voz e no talento. Que Deus o ampare à sua destra.
Bom domingo e uma semana tranquila.
* Dijé Guedes – Jornalista (dije.rb@hotmail.com)
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