Ex-Presidente José Sarney

José Reinaldo Tavares*

José Sarney comemora, hoje, 24 de abril, 90 anos de idade. Qualquer que seja a avaliação de seu legado, a história registrará a incontestável liderança surgida na política brasileira, que foi seguida e admirada por um grande número de jovens idealistas. Todos queriam participar do governo que transformaria o Maranhão em um promissor estado. 

Quando foi governador, o povo o adorava e acreditava nele. Ainda jovem, tinha o poder de se comunicar muito bem e sintetizava o trabalho que fazia em frases curtas e bem assimiladas pela população. Na época, manteve boas relações com o presidente Marechal Castelo Branco, também um idealista que tentava dar rumos diferentes ao Brasil, criando o BNH (Banco Nacional da Habitação) e o Banco Central. Sarney aproveitou essa amizade e conseguiu que fossem feitas obras muito importantes e estruturantes, preparando o Maranhão para o futuro. Como exemplos, podemos citar o Porto do Itaqui, que só conseguiu corrigir os seus problemas e dificuldades construtivas quando, já no governo de Médici, veio para o Ministério dos Transportes, o Coronel Mario Andreazza, um grande benfeitor do Maranhão e do Brasil. Com ele, veio também a delegação do DNER para o DER do estado executar a pavimentação da BR-135, trecho São Luís a Teresina. Castelo já havia autorizado, a pedido de Sarney, a Hidroelétrica de Boa Esperança, no Rio Parnaíba, que permitiu ao Maranhão ter energia elétrica firme durante todo o tempo. E conseguiu apoio financeiro federal para fazer a ponte do São Francisco, assim preservando a cidade histórica - o que mais tarde, já no governo de sua filha, Roseana, teve o reconhecimento universal através do título de Patrimônio Cultural da Humanidade. A ponte permitiu, ao mesmo tempo, o surgimento da São Luís moderna e dinâmica junto às praias.

Ele fez também a Barragem do Bacanga que, abriu à urbanização, imensas áreas entre a cidade histórica e o Porto do Itaqui. Asfaltou toda a cidade e procurou fazer uma administração moderna e eficiente. Fez a primeira linha de ferryboats do estado, ligando São Luís à Baixada e também a Baixada ao Estado do Pará, por meio do asfaltamento da MA, conectada à BR 316. E foram asfaltados os ramais rodoviários para Rosário, Itapecuru, Santa Inês, Bacabal, Coroatá, Codó, Coelho Neto e Caxias, quando foi completado o asfaltamento da São Luís-Teresina. Abriu a rodovia Santa Luzia-Açailândia, que depois foi transformada em BR e asfaltada. E falava da necessidade dessa rodovia para dar apoio à construção da Ferrovia de Carajás. Foi asfaltada a rodovia estadual, ligando Itaúna a Pinheiro e São Bento. Criou a Caema (Companhia de Águas e Esgotos do Maranhão), em consonância com o Planasa (Plano Nacional de Saneamento), iniciando a oferta de água tratada no estado em larga escala. Criou a Cemar (Companhia Energética do Maranhão), que modernizou a distribuição da energia elétrica no estado. Abriu uma infinidade de hospitais e, na Educação, criou a UEMA (Universidade Estadual do Maranhão) e o curso de Engenharia Civil, entre outros. Criou também a TV Educativa, tentando massificar a educação, um avanço imenso para a época que ainda não possuía a tecnologia de ensino a distância hoje disponível.

A administração do estado se modernizou muito no período, houve um avanço geral e Sarney, quando deixou o governo, tinha um enorme prestígio com a população que reconheceu o seu trabalho no governo.

Como presidente, deixou implantado e inaugurado, em grande festa,  um trecho da Ferrovia Norte Sul, o mais importante para o Maranhão,  pois conectava a Ferrovia dos Carajás em Açailândia, cortando todo o estado até Porto Franco e também, pronta e construída, a ponte sobre o Rio Tocantins, em Estreito, garantindo a continuidade da ferrovia, pois o objetivo era ligá-la ao sistema ferroviário do Sul do país e, consequentemente, ao Porto de Santos. Essa obra muito combatida por grandes interesses estabelecidos no Sudeste do País, a tudo enfrentou, e hoje se aproxima de sua conclusão sob aplausos gerais. Quando isso acontecer vai, não só beneficiar o Maranhão, mas também o país. Só por essa iniciativa, Sarney deveria ser reverenciado por todos. No seu governo, também quis federalizar a UEMA, mas inexplicavelmente houve reação corporativa contra, de dentro da própria UEMA, e Sarney abandonou a ideia, que teria sido muito boa para a universidade.

Um político intelectual - Sarney sempre foi um intelectual. Leitor voraz, escritor, poeta, conhecedor da história brasileira e mundial, fez grandes amizades durante toda a sua vida, no Brasil, no continente Sul Americano e na Europa. Decano da Academia Brasileira de Letras e da Maranhense, é também articulista e escreveu durante muito tempo para a Folha de São Paulo.

Cumpriu na política, uma carreira brilhante e insuperável. Foi eleito, por várias vezes, Deputado Federal e Senador. No Congresso, foi o parlamentar com o maior número de anos exercendo mandato como congressista. Foi Governador do Maranhão, Presidente da República e quatro vezes Presidente do Senado. Não há, na atualidade, nenhum homem público com a experiência política e de vida do que Sarney, que hoje não disputa mais cargos eletivos. Desde que chamado a contribuir com o Maranhão e o Brasil, ele colabora e se manifesta nas diversas fases de nossa República. Mesmo tendo mantido relacionamento institucional com os presidentes do conhecido período militar brasileiro, ele convocou a Assembleia Nacional Constituinte e, durante seu governo, foi promulgada a Constituição Cidadã, que implantou no Brasil um dos mais completos e avançados instrumentos jurídicos de justiça social do mundo.

O governador do Piauí, Wellington Dias, com grande inteligência, formou um conselho informal, integrado por ex-governadores, que se reúne ocasionalmente em torno dele, onde muitos problemas e também grandes oportunidades são discutidas. Isso tem rendido muitos frutos ao estado que vem crescendo no meio de todas as dificuldades. Se Sarney fosse chamado a opinar, sobre a conjuntura nacional e estadual, com a credibilidade e o respeito que goza, nacionalmente, e com as amizades e credibilidade que possui, em todas as rodas de poder, inclusive fora do Brasil, o Maranhão teria muito a ganhar. Na política - assim como na vida - a experiência de quem atravessou diferentes períodos da história nacional possui valor inestimável. 

José Sarney agiu no governo de acordo com o que era consenso na época. Era voz corrente, com muitos adeptos até hoje, de que a infraestrutura, por si só levava ao crescimento e ao desenvolvimento econômico e social do estado e de sua população. Ele, com muita competência política, dotou o estado de uma grande infraestrutura. Mas o mundo mudou muito, veio a globalização e sucessivas crises econômicas que deixaram as pessoas mais expostas, principalmente as com deficiência na Educação Básica que levam à desigualdade social e à vulnerabilidade. A infraestrutura é fundamental e, sem ela, não há crescimento econômico e empregos. Mas não é só isso, hoje se sabe.

Colocar nos ombros de Sarney a responsabilidade pela atual pobreza que toma conta da maioria da população do estado é injusto sem considerarmos outros fatores e variáveis. Mesmo na Presidência da República, que o destino colocou em suas mãos, quem dominava a economia era o PMDB, que impunha sempre a nomeação de cada ministro por área. Ele recebeu o país quebrado, com altíssima e indomável inflação, em uma difícil transição do Regime Militar para a Democracia - que exigiu muita a habilidade política, trabalhando em um governo montado por Tancredo, um esforço sobre-humano de apaziguar todas as correntes políticas, aglutinando os que só pensavam em revanche. Muitos poucos conseguiriam fazer o que ele fez. As dificuldades políticas foram tão grandes que não lhe permitiram fazer a segunda etapa do Plano Cruzado, para poder dar ao PMDB a hegemonia absoluta na política brasileira. Eu fui auxiliar de Sarney, tanto no Governo do Maranhão, como também quando ele exerceu a Presidência e testemunhei grande parte dessa história. Assim fica o registro.

Feliz aniversário, Presidente José Sarney!

*Ex-governador do Maranhão