*Adalberto Franklin
Até 12 de junho de 1852, todo o atual oeste maranhense, desde a margem esquerda do rio Turiaçu, até as margens do rio Gurupi, era território pertencente à Província do Pará, em toda a extensa faixa que ia do litoral até as margens do Tocantins, a montante, até o antigamente denominado “seco do Curuá”, seção de corredeiras defronte à hoje cidade de Campestre. Era ali a tríplice fronteira de Pará, Maranhão e Goiás.
Desde a primeira metade do século XIX, o governo do Pará planejava estabelecer missões e aldeamentos ao longo do rio Tocantins, para povoar o extenso “deserto” que existia desde o território da Carolina até Cametá, reduzindo assim as dificuldades que enfrentavam os navegadores goianos que faziam comércio com Belém, tanto pela falta de povoamento quanto pelas diversas corredeiras e cachoeiras existentes. Entre Carolina e a confluência do Tocantins com o Araguaia, nessa época, havia apenas o presídio militar de São João do Araguaia, no encontro desses dois rios. Afora isso, apenas aldeias de índios timbiras, muito arredios e valentes, como os krikatis e os gaviões, que dominavam toda a margem direita do Tocantins; tanto que esse lado do rio era evitado pelos navegadores, que sempre margeavam o lado goiano nessa área.
A frente de expansão litorânea, que fundou São Luís e ocupou a região mais próxima ao litoral, sequer tinha conhecimento da região sudoeste da Província. A frente sertaneja, que povoou os sertões maranhenses a partir de Pastos Bons, esbarrou nas proximidades do rio Farinha, impedidos pelos timbiras, e não conseguiu, a partir da Chapada (depois Grajaú), avançar pelos sertões até as nascentes do Grajaú nem do Pindaré. O sudoeste ficou, portanto, ocupado somente pelos indígenas, até a metade do século XIX, quando a confederação timbira, sediada na aldeia Governador, foi derrotada pelos criadores de gado.
Em 29 de janeiro de 1849, o conselheiro Jerônimo Francisco Coelho, que assumira a presidência da Pará em agosto do ano anterior, recebeu um “aviso imperial” ordenando-o de “remover aqueles obstáculos impostos pela natureza à livre navegação e comércio do Tocantins”, motivo porque “preparou logo uma expedição encarregada de fundar uma colônia militar no centro das cachoeiras, a qual teria o nome de Santa Teresa”.
A expedição organizada por Jerônimo Francisco Coelho partiu um junho do mesmo ano, composta de onze embarcações e muitos colonos, era comandada pelo tenente-coronel reformado Ayres Carneiro, tendo como capelão o frade carmelita baiano Frei Manoel Procópio do Coração de Maria, então com 35 anos, contratado pelo governo paraense por indicação do bispo da Bahia, devido à sua comprovada experiência no tratamento com os indígenas. Procópio ia “incumbido de missionar e aldear onde for mais conveniente, e segundo a oportunidade das circunstâncias, as tribos que habitam não só as margens do Tocantins, mas as do seu confluente Araguaia, até onde chegam as extremas da Província com a de Goiás”.
A colônia militar de Santa Teresa foi estabelecida no Remansão, abaixo das cachoeiras de Itaboca, hoje submersas pela represa de Tucuruí, em período de estiagem, em outubro. Em dezembro, uma grande cheia inundou toda a área e a maioria dos colonos morreu de “sezão”, febre malárica. Os sobreviventes retornaram para Belém, de onde foram mandados para a colônia Araguari, em formação. Umas poucas, por ordem do presidente da Província, seguiram com o tenente Constâncio Dias Martins, o frei Manoel Procópio e alguns soldados, “para fundar uma nova colônia em São João do Araguaia”, onde já existia um presídio militar.
Em 1950, a partir de São João do Araguaia, Frei Manoel Procópio inicia contatos com os índios da região. Primeiramente os Apinagés de Goiás, conseguindo aldeá-los por cerca de um ano, mas desfazendo-se o aldeamento depois de desentendimentos entre os indígenas e o religioso. Depois da fracassada tentativa de aldeamento dos índios de Goiás, o frade carmelita inicia contato com os então temidos timbira da margem direita do Tocantins – gaviões e caracatigês (krikatis). Depois de visitar as aldeias dos gaviões, consegue aldear 800 deles no lugar Frades (hoje povoado do município de Cidelândia, nas margens do Tocantins). Depois, visita todas as aldeias dos caracatigês e convence-os a formar dois aldeamentos, um nas proximidades da embocadura do riacho Cacau e outro na do riacho “Embira Branca” (provalmente, o hoje denominado Barra Grande).
Com a formação desses três aldeamentos, Procópio, acompanhado de alguns soldados paraenses e de duas famílias de colonos, deixa São João do Araguaia, vindo estabelecer-se nas margem direita do Tocantins, entre os dois aldeamentos dos krikatis, fundando assim a povoação de “Santa Teresa do Tocantins”, que três anos antes tentara fundar no Remansão. Era o dia 16 de julho de 1852.
Não sabia Frei Manoel Procópio – e nem poderia saber, devido à demora das comunicações naquela época – que 34 dias antes aquele território, até então pertencente à Província do Pará, pelo Decreto Imperial de 12 de junho, que estabeleceu novos limites dessas províncias, havia sido incorporado à Província do Maranhão, ficando o rio Gurupi como novo limite divisório. Isso o missionário somente veio a saber tempos depois, e por cerca de dois a povoação ainda se manteve sob controle paraense, e Procópio e os soldados pagos pelo Tesouro daquela Província.
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Carismático, frei Manoel Procópio conquistou com facilidade a confiança dos indígenas e logo construiu uma capela, dando início à catequese dos índios e colocou a povoação sob a proteção de Teresa d’Ávila, santa espanhola doutora da Igreja.
O povoado cresceu rapidamente, devido também à chegada de fazendeiros oriundos de Grajaú e de Carolina, que ficara trinta anos sob sob controle e litígio territorial com Goiás.
Os governos das províncias do Maranhão e Pará chegaram a um acordo sobre a limitação de suas áreas e, através da Lei nº 772, de 23 de agosto de 1854, Santa Teresa ficou definitivamente incorporada ao Maranhão.
O crescimento e o ponto geográfico favorável motivaram a elaboração da povoação à categoria de Vila, em 27 de agosto de 1856, quatro anos depois da chegada de Procópio. A elevação de Santa Teresa à categoria de vila entusiasmou seus habitantes, que vislumbravam rápido crescimento e aceleração de seu progresso. Em seu livro O Sertão, a historiadora Carlota Carvalho diz que a Vila de Santa Teresa possuía nessa época uma única rua, de oitenta e quatro casas, parte coberta de telhas, edificadas ao longo do rio, que terminava num largo ou praça esboçada com poucas casas, um quadrilátero onde havia a igreja Matriz. Mas a condição de Vila dada a Santa Teresa revoltou a povoação de Porto Franco, pois seus habitantes não aceitavam permanecer na condição de povoado enquanto sua vizinha e recém-formada Santa Teresa conquistara a condição de Vila. Foram três anos de intensas disputas políticas.
E por força política, a Lei Provincial nº 524, de 9 de junho de 1859, mudou a sede da Vila para Porto Franco e Santa Tereza voltou a ser povoação. Lutador pelo progresso da terra, frei Manoel Procópio recebe a ajuda do coronel Amaro Baptista Bandeira e dos capitães Didier Baptista Bandeira, Atanazio Manoel Parente, Domingos Pereira da Silva e outros, além do apoio das câmaras municipais de Carolina, Boa Vista (Tocantinópolis) e Chapada (Grajaú). Firmam compromisso de construírem, com recursos pessoais, uma casa destinada à Câmara Municipal (naquela época não havia prefeito, quem dirigia a vila era o presidente da Câmara), quartel, fórum, como também a conclusão da Igreja Matriz que havia sido ameaçada, mas estava paralisada, condições exigidas para reconquistar o posto. Com todo esse apoio e ainda sob a proteção da imperatriz Teresa Cristina, foi firmado um compromisso com o presidente da Província do Maranhão e, através da Lei Provincial nº 631, de 5 de dezembro de 1862, a povoação de Santa Teresa passou a chamar-se Vila Nova da Imperatriz, em homenagem à sua real protetora.
Afirma a historiadora Carlota Carvalho que nessa época, apesar de sucessivos avanços e recuos, a Vila fez comércio bem desenvolvido e teve a oportunidade de tornar-se sadia, bizarra e confortável e fazer boa estrada. Veio então o período do caucho, com a descoberta da árvore que o produz – a castilhoa – através dos irmãos Pimentéis e o reconhecimento do que eram pelo ex-sargento Francisco Coelho.
A notícia da nova riqueza provocou intensa movimentação no porto e aumentava a cada dia o comércio da Vila, trazendo gente de todo o Brasil e uma onda de imigrantes de todo o Nordeste e cidades do Maranhão buscam a região. Foi a primeira grande implosão de progresso de Imperatriz. Nesse primeiro período de vida, Imperatriz caracterizou-se pela marcante figura de frei Manoel Procópio, que depois de concretizar a fundação da povoação e vê-la tornar-se Vila, retornou para sua terra, a Bahia, deixando Imperatriz entregue aos seus habitantes.
A história política de Imperatriz é marcada por conturbações e tragédias.
O município esteve sob interventoria durante 15 anos ininterruptos. Além disso, a cidade carrega sob si o peso do descaso do governo do Estado desde seu início. Por sua distância da Capital e seu isolamento, Imperatriz sempre se viu marginalizada pelos governantes maranhenses, que não lhe dedicavam a atenção condigna de sua importância. Em conseqüência disso, durante muito tempo foi chamada de “Sibéria Maranhense”.
O primeiro prefeito de Imperatriz foi Gumercindo de Sousa Milhomem, que assumiu o cargo tão logo a Vila tornou-se cidade, em 1924. Foi substituído por Manoel Rolim da Rocha, que permaneceu até 1930, deixando o cargo em função da revolução. Assumiu como prefeito revolucionário Antônio Araújo, que teve como maior preocupação a normalização da situação do Município. Este passou o cargo a Martimiano Miranda, que traçou o plano de construção da rodovia MA-70, ligando Imperatriz a Santa Luzia. Deixou o cargo, no entanto, em 1933, sem que seu projeto fosse levado à frente. Fortunato Bandeira foi o substituto de Miranda, mas não teve boa atuação e o povo se revoltou, embora Fortunato, quando Imperatriz ainda era Vila, fora um Intendente com boa atuação.
Novamente assume a prefeitura Gumercindo Milhomem. Foi sucedido por José Manoel Alves Júnior, de Pindaré Mirim, que passou mais tarde o cargo a um seu conterrâneo, Antônio Miranda. Com um governo curto, foi sucedido por Leandro Nunes Bandeira. Em seguida, assumiu Urbano Rocha, que antes das eleições de 1945 passou o cargo a Félix Garcia de Oliveira. Até então, os prefeitos não haviam sido escolhidos pelo voto da população.
Em 1945, foi eleito Simplício Alves Moreira. No mandato seguinte, ocupou a Prefeitura novamente Urbano Rocha. Em sua gestão, Imperatriz comemorou seu centenário e ganhou iluminação elétrica. Urbano Rocha foi assassinado 2 de junho de 1953. Tomou posse, então, o vice-prefeito Simplício Moreira. Este inaugurou a rede de energia elétrica, que estava prestes a ser inaugurada antes do assassinato de Urbano. Simplício estimulou a educação, construiu estradas – uma delas a carroçável até Grajaú, ligando a cidade ao restante do Estado, e adquiriu o primeiro caminhão para a prefeitura. Em seguida, assumiu a Prefeitura Antenor Fontenele Bastos, que imediatamente construiu a praça da Concórdia, frente ao então prédio da Prefeitura.
A praça depois passou a chamar-se Castelo Branco, depois praça da Cultura e atualmente praça Renato Moreira, enquanto o prédio da antiga prefeitura é hoje a sede da Academia Imperatrizense de Letras. Antenor renunciou ao cargo e assumiu Raimundo de Morais Barros. Em 1961, João Menezes de Santana assumiu, mas em 25 de maio de 1964 foi cassado pela ditadura militar.
Após a cassação de João Menezes, Imperatriz foi governada pelo vice-prefeito, até janeiro de 1965, assumindo nessa época o presidente da Câmara de Vereadores, Álvaro Álvares Pereira. Este governou até 18 de abril de 1967, quando entregou o cargo ao interventor Raimundo Bandeira Barros. Dez meses depois houve eleições, quando foi eleito o coronel Eurípedes Bernardino Bezerra. Três meses depois da posse; no entanto, Eurípedes Bezerra, por divergências políticas com os vereadores, renunciou. O vice-prefeito, Raimundo Souza e Silva, assumiu então o cargo. Concluiu a praça Castelo Branco e abriu o bairro Nova Imperatriz, hoje um dos mais populosos da cidade.
Em 31 de janeiro de 1970, tomou posse Renato Cortez Moreira assume o cargo de prefeito. Seu vice, Dorgival Pinheiro de Sousa, foi assassinato em 1971. Moreira foi sucedido por José do Espírito Santo Xavier, que em novembro do mesmo ano em que tomou posse, 1973, cassado, entregou o cargo ao interventor Antônio Rodrigues Bayma Júnior. Este passou a chefia do Executivo ao também interventor tenente-coronel Carlos Alberto Barateiro da Costa, que por sua vez o entregou a Elbert Leitão Santos, o último da série de interventores dos anos 70.
Nas eleições de 1976 foi eleito prefeito o médico Carlos Gomes de Amorim, que governou de 1977 a 1983. Sucedeu-o José de Ribamar Fiquene, que completou seu mandato em 1988. Eleito no ano anterior, Davi Alves Silva assume o cargo em 1989 e termina seu mandato em 1992, quando elege seu sucessor, o ex-prefeito Renato Cortez Moreira. Este, porém, é assassinado em outubro de 1993, assumindo o cargo o vice-prefeito, Salvador Rodrigues. Acusado de malversação, Salvador é afastado em janeiro de 1995, após o movimento chamado “Revolução de Janeiro”, quando a sociedade civil imperatrizense promoveu uma grande manifestação, ocupou a Prefeitura e exigiu da governadora Roseana Sarney a intervenção no município. O empresário Ildon Marques de Souza foi nomeado interventor, permanecendo até abril de 1996. Dorian Meneses sucedeu-o como interventor, entregando o cargo em 1º janeiro de 1997 ao próprio Ildon Marques, na condição de prefeito eleito. Em janeiro de 2001, o até então deputado estadual Jomar Fernandes, eleito em outubro de 2000, assumiu a Prefeitura. Em outubro de 2004, Ildon Marques novamente foi eleito prefeito e assumiu o cargo no primeiro dia de janeiro de 2005; seu mandato se extendeu até 1º janeiro de 2009, quando entregou o cargo ao prefeito eleito nas eleições de 2010, o então deputado federal Sebastião Madeira, médico, que cumpre mandato até o final de 2012.
Metrópole regional – Atualmente, Imperatriz tem menos de 10% do seu território original. Dela desmembraram-se, ao longo desse tempo, os municípios de Montes Altos, João Lisboa, Açailândia, Cidelândia, São Francisco do Brejão, Vila Nova dos Martírios, São Pedro d’Água Branca, Davinópolis e Governador Edison Lobão. Sua população atual é de 247.553 habitantes (IBGE, 2010). É a mais importante cidade do interior do Maranhão e está classificada entre as 100 mais populosas cidades do Brasil. É o maior centro de abastecimento regional e prestação de serviços, influindo fortemente na economia do norte do Tocantins, sul do Pará e de todo o Estado do Maranhão, um mercado de aproximadamente 1.800.000 habitantes. O seu Produto Interno Bruto (2005) é um dos 25 maiores do Nordeste, incluindo as capitais.
*Adalberto Franklin é pesquisador de história regional e membro da AIL; autor de “Breve história de Imperatriz” e “Apontamentos e fontes para a história de Imperatriz”, dentre outros.
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