Sentado à beira do caminho, um senhor observava tudo sem dar atenção especificamente a nada. Com o semblante caído, desencorajava a astúcia de querer ficar em pé, dando um certo vigor paralítico para suas pernas abatidas. Com uma barba branca espeça e um cabelo fuá, esganiçado pelo vento, me chamou para conversar, porém sem dizer uma palavra. Busquei ter um certo tipo de contato...em vão. Então puxei conversa, como uma pessoa que está na fila da lotérica. Puxei, para matar o tempo.
- Velho, você observa o céu, as nuvens. E não diz nada. Olha os carros passando, as pessoas andando, o relógio virando, e não diz nada.
Ele continuava em silêncio. Eu continuei.
- Esta época do ano, ela me remete a muitas lembranças gostosas. Mês de maio é absolutamente rico, por ser o mês de Maria para o catolicismo, e o dia das mães, para o mundo inteiro. Eu me pego sentindo o vento, o calor do Sol... olho para dentro de mim mesmo, e vejo como o tempo continua o mesmo. Isto se tiver como saber, como ele foi um dia, para afirmar que continua o mesmo. Queria andar por aí e de repente ver um Juçara Clube lotado. Queria andar e observar um Gelobom lotado de crianças e meu tio Roberto fazendo a alegria da galera. Queria chegar em casa, e ver meu pai servindo-se primeiro no almoço, não antes de obrigar a gente a fazer uma oração, por mais simples que fosse, um obrigado apenas, pela comida do dia. Queria ter a tarde toda para jogar bola, jogar um game, e depois comer uma pizza de rodízio com meus amigos. Na época era R$ 10, velho. Saudade de ver a minha família com mais tempo de se ver. De não termos mais dinheiro, porque gastamos com outra coisa, de ser uma conta de energia absurda ou abastecer um carro com a gasolina de promoção em R$ 3,99 e o gás com uma oferta de R$ 79,90.
É velho, tudo mudou. Mas o cheiro dos sentidos desta época são os mesmos dos quais eu tinha 15 anos, até mesmo de quando eu nasci, provavelmente. O gosto das coisas... e por que esquecemos disso tudo? Nos ocupamos com tudo a nossa volta. É o cotidiano infalível das responsabilidades. Não temos tempo para ter saudade. Não temos tempo para visitar mais ninguém. Nosso tempo é trabalho e ocupação, é, na maioria das vezes, a tristeza de uma realidade da qual todos nós precisamos passar para poder viver no mínimo dignamente. Velho, você está me escutando?
- Te escutei a vida toda. Observo as situações. Observo as pessoas. O gosto delas, a fúria interior delas, a paz espiritual necessária e tão esquecida. Eu faço com que o sentimento que você tenha nessa época não mude. Sei que você não quer voltar no passado. Quer apenas que, como o céu, as nuvens, o Sol, o curso do rio, as pessoas não precisem mudar. Você deseja que as pessoas continuem boas e solidárias. E que não mudem de acordo com a rotação que o sistema impõe.
- Velho, eu posso não querer voltar no passado, porque nós amadurecemos quando a vida é dura. E sem o passado, nós não saberíamos o que queríamos hoje. O que nós queremos. Eu quero ter sempre estas lembranças. No meu suspiro, eu inspiro sempre uma nova chance, de seguir em frente.
- Então siga. Porque eu não paro, apesar de estar sempre parado. Eu sou um livro sem fim, sem palavras, sem prefácio, sem novas edições.
Eu sou o TEMPO.
Ao escutar isso do Velho, eu escuto meu filho gritando: "Papai, acorda, já é de dia".
Obrigado, meu Velho. Você me mostrou em sonhos que eu não preciso mais sonhar.
Cronista e poeta
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