Depois de dois domingos sem deixar um rastro de palavras por aqui, por falta de tempo mesmo, e não falta de amor ou vontade, fiquei imaginando o que escreveria para hoje. E para hoje, o que temos é saudade. Mas não me voltarei apenas para o tema saudade, vou me ater à parte mais falada do assunto, este assunto que se refere à morte precoce do cantor Cristiano Araújo e que vitimou também a sua namorada, Allana Moraes. Ambos jovens, 29 e 19 anos, respectivamente. Dentre estes jovens cantores que surgiram há alguns anos no mundo sertanejo, muitos são enganadores, feitos pela indústria da música com o pensamento de apenas vender ritmo e melodia, e não em construir carreiras. A maioria dos artistas do novo mundo sertanejo tem uma música hit, estoura, faz shows durante um ano e some. Não são letras. Não são clássicos do sertanejo. Não se tornam clássico do sertanejo. Cristiano Araújo era, dentre os poucos nomes que se salvam dessa nova geração, um artista de futuro, que provavelmente teria muita coisa boa ainda para nos presentear. Não falo de Bará Bere, música sem nexo do cantor que estourou nas rádios. Falo das outras letras, da poesia, dos casos de amor que ele cantava. Chegando num possível auge da carreira, aos 29 anos, deixou um bom legado, porém curto, para as gerações futuras, e será esquecido, porque não teve tempo de se tornar eterno. Falando da carreira de cantor e, como era um cantor solo, não terá ninguém para continuar sua obra inacabada.
O país inteiro ficou chocado com a notícia. Muitos não o conheciam, afinal ele estava numa ascensão, porém a maior parte do Brasil já o via como um dos maiores nomes do sertanejo atual, tendo tudo para crescer ainda mais. Muita gente fez piada com a comoção envolvendo a morte do cantor. Muita gente fez graça com o fato de o velório e enterro terem tido uma cobertura altíssima por parte de várias emissoras. Daí você imagina o quanto o rapaz já tinha uma história e muito bem reconhecida. A exposição desnecessária do corpo do cantor na funerária, com o corpo sendo preparado para o enterro, foi uma bizarrice. O vilipêndio praticado contra o cadáver teve consequências duras. Suas fotos foram espalhadas, assim como o vídeo. Uma cena fiel a qualquer filme trash. Triste, muito triste.
Considero no mesmo nível de tristeza a crônica feita pelo renomado (?) funcionário da Globo, Zeca Camargo. Zeca afirma, com total concordância da minha parte, o abismo cultural em que vivemos, a falta de cultura de um país que se afunda em certos tipos de música, que não nos engrandecem como pessoas. Mas concordo até aí. A crônica segue com infelizes afirmações sobre o cantor Cristiano Araújo e sobre o mundo sertanejo. Zeca Camargo é de uma displicência provocativa tão absurda que chega a pôr em dúvida qual realmente é a sua intenção com o texto: aparecer ou desaparecer. Compara a cultura do país de uma forma abrangente com desenhos de pintar para criança. Mentes vazias que pintamos como queremos, o que dita o momento. Ele acerta, mas erra ao mesmo tempo. Uma crônica, para ser feita com precisão, precisa de informações. Depois de apuradas as informações, existe a opinião, que é onde entra a concordância ou não do leitor. Na crônica de Zeca, não há informações, é um texto feito meio revoltado com a situação atual do país musicalmente, mas peca em saber que os maiores nomes hoje da atualidade são os sertanejos, clássicos ou não. Faltou respeito da parte de Zeca Camargo. Respeito, hombridade e, principalmente, solidariedade com a dor da família das vítimas e dos fãs do cantor morto. Quando pediu desculpas pelo que falou, dizendo ser mal interpretado, o cronista disse ainda “Cristiano Ronaldo”... sinceramente? Cabe até processo. Isso é chacota.
Cristiano Araújo se mostrava um bom letrista, tinha um caminho grande pela frente na música e na vida, ao lado da namorada, Allana. Deus guie esses trabalhadores nas estradas da vida, que buscam de forma incessante o sucesso e a fortuna a qualquer custo, sabendo que, além disso, estão apenas lutando pelo pão de cada dia. Fica aqui meu agradecimento ao cantor Cristiano Araújo pela alegria que levava a um povo tão sofrido, que sofre com tantos problemas políticos e outras questões sociais. Seja com letras comerciais ou letras poéticas. Ao nosso querido Zeca Camargo, existem tantos outros assuntos para se escrever e publicar ao vivo na Globo News... que infelicidade.
Que não goste da música. Que não goste de sertanejo. Mas não era necessário mandar essa crônica agora. Muita gente ainda chora, e talvez não vá entender o que você quis dizer.
Por isso chegará na sua casa uma coletânea do Cristiano Araújo mandada por mim. Não para você apreciar. Mas para entender um pouco que é preciso conhecer uma história, mesmo que curta, antes de publicar asneira. Aumente o volume, Zeca.
Não vai dar pra escutar os xingamentos que vem lá de fora.
Edição Nº 15349
O dia em que Zeca vilipendiou com palavras
Phelippe Duarte
Comentários