O momento é de muita tristeza para o nosso velho sanfoneiro, que sempre esteve de pé e à ordem, pronto para dedilhar na sua sanfona de 20 baixos, músicas interessantes como Milho Dibuiado, Vai Comendo Atrás, Beijo de Língua, Negue, Boate Azul, Amor Proibido, Amor de Rapariga e tantas outras melodias.
Sempre atencioso com os telefonemas recebidos e presente para abrilhantar aniversários, casamentos, descasamentos, crisma, batizado, padrinhos de fogueira, jantares, sem qualquer frescura, estava lá para tocar e cantar.
O transporte para carregar a velha sanfona, o zabumba e o triângulo, era a sua bicicleta cargueira, com os pneus mais lisos do que careca de ancião.
A solidariedade foi assim uma extensão de sentimento em relação ao sofrimento dos outros.
Aquele homem pacato não tinha sequer uma dentadura boa. Mandamos fazer uma revisão geral, para que o contumaz sanfoneiro tivesse uma melhor aparência na apresentação de seus mini-shows, que fazia quando era chamado.
Já de posse e uso de sua nova perereca, bastante resistente, ao ponto de abrir com os novos dentes tampas de garrafas.
Mas o destino é circunstanciado de sinas, fados, sorte, futuro, fatalidades. Pelo sim ou pelo não, veio sofrer as consequências como obra de um desses sinônimos.
Residência de sanfoneiros, pouco aquinhoados, tem a definição e localização perto de galinheiros, chiqueiro de porcos, bodes, com isso, fica vulnerável ao ajuntamento de várias espécies de roedores e tantos outros predadores.
Na transitoriedade da vida, tendo como profissão a habilitação de pedreiro, e nos momentos lúdicos da pregressa labuta, vai tocar sua sanfona.
Infelizmente, pegou uma gripe bem catarral, ao ponto de tomar banhos de vários tipos de ervas, algumas delas até consideradas brabas, como a malva, para debelar esse difúcio perturbativo.
Assim ficou quase trinta dias, arriado no fundo de sua velha tipoia; comendo somente peixe voador feito com pouco sal, por recomendação de seus ancestrais.
Todavia, guardou sua sanfona em cima de um guarda roupa, dentro de um “cofo”, como proteção de insetos, pragas e roedores.
Daí se tira e se faz o remelexo de quanto esse profissional gosta e ama sua sanfona de 20 baixos.
Quando se ateve do restabelecimento de sua saúde, procurou logo tirar de cima do guarda roupa sua velha sanfona.
Com esmerada atenção, foi desmanchando o cofo com todo carinho em busca de seu instrumento musical.
Ah, amigo! O velho acordeonista, quando tirou de vez o seu ganha-pão daquele recipiente, saíram de dentro dela mais de cinco ratos grandes e pequenos, uma ninhada, como se fala.
“Meu Deus! Minha Virgem Maria! Caramba! E agora? O que faço para recompor meu instrumento?”, resmungou.
Sua pressão arterial foi lá para a baixa da égua. Saiu de casa puto, foi até o botequim e pediu um rabo de galo, cachaça mais São João da Barra, e largou nos peitos, para esquecer aquele momento angustiante.
Só resta agora pedir a nossa santinha padroeira Santa Teresa D’Ávila para clarear a sensibilidade de seus fãs, para todos juntos comprarem outra sanfona, e ouvir a música de seu carro chefe “Milho Dibuiado”.
Depois de adquirir uma nova sanfona, recomendá-lo para não deixar de ter em casa sempre veneno para rato. De preferência, “Mil Ratos”, é tiro-e-queda.
Tenha um ótimo domingo!
Comentários