Nelson Bandeira
Numa cidade, especialmente num bairro quando é desorganizado, como exemplo o "Mercadinho", é osso duro de roer para a administração pública. É mais provável você assistir ao diabo tocando corneta em feira livre do que encontrar alguém do governo municipal se preocupando com aquele jacá de problemas.
Mas, em contrapartida, lá você assunta e vê o que não quer; embora encucado, com a maneira ardilosa como as pessoas praticam seus negócios, pelo viés da imoralidade.
Tudo que é tipo de xarope e garrafada feitos de cascas de madeiras e folhas de árvores se encontra lá, para curar doenças, feiuras, impotência, perda de memória, obesidade, fazer "gay" virar homem, e por aí vai.
Você quer saber de novidades políticas, ações religiosas, traições, vá à barbearia localizada na rua Ceará, entre as ruas Benedito Leite e Luís Domingues. O barbeiro é conhecido como a famosa "língua de sardão", mas muito ágil na tesoura.
Este profissional, trabalhando, é afiado para conversar sobre política, crenças e futebol, é como se estivesse fazendo uma tarefa terapêutica, tanto que o cliente dorme igual cobra de igarapé na cadeira da barbearia.
Num belo e não lembrado dia, na barbearia que não tem nome e é conhecida pelo tamanho da língua do proprietário, fala de si e de todos.
O freguês chega com um bigode daquele bem cheio, semelhante aos desses caras da equipe do descobridor dos setes mares, dizendo para o rei da tesoura que tinha R$ 2,50 para tirar o bigode, sendo que o serviço completo sai por R$ 5,00.
O barbeiro vestiu o infortunado cliente, com aquele pano tradicional, com cheiro de mofo, com concentração de suor de pescoço e sovaco, passando aquela pasta espumante na cara do indigesto freguês.
Massageando com as mãos, com aquele cheiro de incenso de igreja, sedando o paroquiano na cadeira, sempre conversando e barbeando como sogra cantando para fazer o neto dormir.
Quando terminou o trabalho, acordou seu cliente. O depilado, olhando para o espelho, espantando-se pelo que viu, perguntou: "Que diabo é isso, só uma banda do bigode?!". "Sim, senhor".
"É correspondente somente ao valor de Dois e Cinquenta, tão logo consiga o restante completaremos o trabalho de retirada do resto de seu bigode", informou solenemente o experiente barbeiro.
"Oxente! Você não tem coração?!", choramingou o cliente. "Não. Barbeiro é como ortopedista, tira só o que é necessário, no retorno se conclui os serviços. Dependendo muito do estado espiritual do cliente".
- Quer dizer que aqui se faz qualquer negócio? Alongou o infeliz.
- Por enquanto, sim. A tendência é de piorar.
"O barbeiro nos deixa de cara limpa, nos deixa apresentáveis".
Tenha um ótimo domingo.
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