Causo XV - “Um diagnóstico bem conservador!”
Tempo de campanha eleitoral, principalmente nos pequeninos e longínquos municípios brasileiros, é uma época quente, de muitas brigas e confusões. Os candidatos aos cargos eletivos municipais – prefeitos, vice-prefeitos e vereadores – e seus seguidores e simpatizantes, quando poderiam conquistar os votos dos eleitores através das propostas de trabalho e nas discussões das ideias, preferem apelar para a baixaria, agredindo e atacando os seus adversários, e na maioria das vezes com denúncias inverídicas e com ofensas a honra, a moral e a dignidade dos concorrentes.
Aliás, tal expediente não é característica única dos municípios interioranos. Quem não se lembra do ano de 1989, quando a equipe de produção do então candidato a presidente da República Fernando Collor de Melo apresentou ao povo brasileiro, através do programa eleitoral gratuito no rádio e na televisão, uma mulher que dizia ter sido abandonada pelo outro candidato, Luiz Inácio Lula da Silva. Graças a este expediente mesquinho e abominável, Fernando Collor de Melo foi eleito presidente, enquanto Lula amargava a sua primeira das três derrotas, antes de chegar ao Palácio Alvorada.
Mas há também casos em que, para ganhar um votinho, o candidato vai às últimas consequências. Lembro-me que no estado do Ceará, por ocasião da apuração dos votos, que ainda não era através da urna eletrônica, um juiz eleitoral mandou anular um voto dado a um certo candidato, porque apesar de ter escrito corretamente o seu nome e o seu número, o eleitor ainda escreveu na cédula os nomes “baitola e corno”. O referido candidato brigou com o juiz e exigiu que aquele voto fosse validado, justificando com este maravilhoso argumento: “Doutor, este é o voto mais consciente que eu recebo. Este voto é de gente que me conhece desde pequenininho, e sabe de tudo sobre a minha pessoa!”.
O “causo” narrado a seguir é um dos exemplos marcantes desta baixaria, e quem não acreditar na sua veracidade pode procurar o ex-diretor do SENAI em Araguaína, ex-diretor do Colégio Integrado de Araguaína, ex-deputado estadual, ex-secretário da Indústria e Comércio no governo Moisés Avelino, e atual presidente municipal do PMDB, professor João Leite Neto, que assim como eu, teve a oportunidade de ler o “Diagnóstico” tema desta narrativa.
Em uma pequena cidade do interior, a campanha eleitoral para os cargos de prefeito e vereadores estava em plena efervescência, com dois candidatos concorrendo ao poder executivo municipal. De um lado um político tradicional da região, que inclusive já chegara à Assembleia Legislativa do estado, e do outro, representando a oposição, um dos homens mais íntegros e honestos deste Brasil, uma verdadeira reserva moral, não havendo nada que pudesse vir a manchar a sua reputação. Por mais que procurassem, até mesmo chegando ao ponto de contratar uma agência de espionagem da capital, em momento algum os seus adversários encontraram o menor deslize, a menor mácula no comportamento do candidato, que vou chamá-lo apenas pelo nome de “Seu José”. Enfim, ela era a própria dignidade em forma de pessoa.
Mas os adversários de “Seu José”, que por sinal estava com uma grande vantagem em todas as pesquisas de opinião pública, não perdiam as esperanças e foram buscar na capital do estado um destes marqueteiros capaz de vender a alma ao diabo para conquistar os seus objetivos. E tal marqueteiro passou a comentar a espalhar por toda a cidade que o candidato “Seu José” era realmente um homem sério, mas em compensação a sua única filha, uma jovem solteirona, era perniciosa à sociedade local, pois mantinha casos amorosos com os pais de família, além de aliciar para a prática do sexo as crianças e adolescentes. “Ela está sempre à espera de todos com as pernas abertas”, dizia o marqueteiro pelos quatro cantos da cidade. Portanto, naquela pequenina cidade esta instituída a baixaria do mais alto nível.
“Seu José”, ao tomar conhecimento dos comentários, decidiu tomar uma atitude drástica, qual seja a de levar a sua filha Maria da Conceição até um médico para que lhe examinasse e constatasse se ela era virgem ou não. Vale ressaltar que na época e na cidade, a questão “virgindade” era um caso sério, sendo inclusive motivo para bárbaros crimes praticados. Maria da Conceição relutou em se submeter a tais constrangimentos, mas diante de tantos apelos por parte do seu pai e da sua mãe, acabou por concordar em fazer o tal exame, com uma única exigência: que fosse feito não pelos jovens médicos que residiam na cidade, mas sim por um velho “farmacêutico cirurgião parteiro” conhecido pelo nome de Doutor Sebastião, com quase 90 anos de idade, sendo que mais de 60 anos foram dedicados aos doentes da cidade e de toda a região. Aliás, foi ele quem fez o parto do nascimento de Maria da Conceição, sendo também o seu padrinho de batismo. Por toda esta sua dedicação, o Doutor Sebastião era uma pessoa querida e respeitada pela população.
Tudo acertado, lá vai Maria da Conceição, acompanhada do “Seu José” e de seu esposa, rumo ao consultório do Doutor Sebastião, que estava localizado do outra lado da praça principal da cidade. Lá chegando, o “farmacêutico cirurgião parteiro” cumprimenta afetuosamente o trio, conversam sobre algumas amenidades e manda Maria da Conceição entrar em um pequeno quarto, vestir uma camisola de cor branca, deitar na maca e aguardar para ser examinada. Tudo feito, respeitosamente ele inicia a perícia, e ao concluir divulga o laudo médico. Estava assim escrito, em letras bem nítidas, embora um tanto quanto trêmulas, talvez devido à própria idade avançada do Doutor Sebastião. Eis, na íntegra, o laudo médico assinado pelo ilustre esculápio:
“Ezaminando (realmente, com a letra z) as partes fudetorias da Dona Maria da Conceição, não constatei sinais de defloramento. Constatei, sim, uma ronxa roxa, em redor da crica, que tudo leva a crer, ser sinal de p...!”.
Até hoje, na cidade, a população que tomou conhecimento do dito laudo médico, está em dúvidas sobre o que o Doutor Sebastião quis dizer com a tal RONXA ROXA.
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