O Embrulhão

Capítulo XXVIII

Atualmente, em todos os telejornais, jornais impressos, revistas e noticiosos radiofônicos, o grande destaque são as discussões no Congresso Nacional com relação às “reformas” propostas pelo Governo Federal. Mas este assunto não é nenhuma novidade em IMGUINORAPULIS, haja vista que, há muito tempo já passado, o prefeito municipal DOTO LADRONESIO FURTADO, com o voto favorável de dez dos nove vereadores locais, ter conseguido aprovar o seu famoso “Embrulhão”. Não resta dúvida de que o prefeito teve que articular muito, com as más línguas chegando a afirmar que ele teve que dar várias cabeças de bode aos vereadores em troca do voto favorável. Mas disso ninguém tem prova, portanto não merece um comentário mais profundo e detalhado.
O “Embrulhão” era formado por vários projetos, muitos deles os mais absurdos, possíveis e imaginários, como um revogando a Lei da Gravidade; outro instituindo a Pena de Morte através da Cadeira Elétrica, e como no município não havia energia elétrica, era sugerido que o condenado ficasse sentado em cima de uma lamparina ou de uma vela acesa. Mas, entre todos estes projetos, o que provocou uma reação muito grande, uma verdadeira “Revolução Doméstica”, foi o de número 069, regulamentando e ditando normas a respeito da vida conjugal. Aliás, este foi o único projeto que não foi aprovado por unanimidade, pois dois vereadores se posicionaram contrários: o vereador ARLINDO BELO e a suplente EVA GINA DO REGO BRILHANTE, que tinha assumido a vaga devido a um pedido de licença do titular, vereador TONICO LEITOSO, que estava convalescendo de uma melindrosa intervenção cirúrgica no “idioma”. Quando da aprovação do projeto 069, aconteceu a maior manifestação pública já vista em IMGUINORAPULIS, com as mulheres, lideradas por EVA GINA DO REGO BRILHANTE e JACINTA PENA DO PINTO, incentivando e pregando a “abstinência sexual” pelo prazo de 90 dias. Até as mulheres das casas noturnas, como a sofisticada “FADOS & F....” e a popular “TRIÂNGULO DA FLOR”, resolveram fechar as portas, ou melhor, as pernas, em sinal de protesto.
Passei pela Secretaria da Câmara Municipal de IMGUINORAPULIS e solicitei uma cópia do referido Projeto de Lei, que agora transcrevo em todos os 8 artigos e parágrafos.
“Projeto de Lei nº 069
A Câmara Municipal de IMGUINORAPULIS aprova e eu, prefeito municipal, sanciono a seguinte lei:
Art. 1º – Por ser um ser infinitamente superior, em todos os seus aspectos, o marido é o chefe da família e todos os desejos devem ser entendidos como uma ordem.
Parágrafo Único – A esposa, na sua posição de insignificante e inferior, tem o dever e a obrigação de adivinhar todos os desejos do marido.
Art. 2º – Como é reconhecida em todo o mundo como uma pessoa falona e linguaruda, a mulher tem o direito de também expressar a sua opinião sobre qualquer assunto.
Parágrafo Único – Caso esta opinião não seja tão “burra”, como costumeiramente acontece, e seja do interesse do marido que ela se torne pública, o marido assume a sua autoria.
Art. 3º – À esposa é facultado o direito de pronunciar a última palavra do recinto e aconchego do lar, desde que estas palavras sejam “Sim, Senhor”, “Já Vou”, ou outras com o mesmo significado.
Art. 4º – A esposa, na sua condição de submissa, está terminantemente proibida de dormir de toucas, bobes, maquiagens e calcinhas, mesmo que sejam preta ou vermelha, rendada ou sem renda.
Parágrafo Único – Ao marido é permitido roncar a noite inteira ou  a fazer qualquer tipo de barulho noturno, até mesmo soltar “gases presos catingosos”.
Art. 5º – Em cada semana, o marido terá direito a duas noites totalmente livres para beber com os amigos e, se for do seu interesse, fazer saliências com amigas da esposa.
Parágrafo Único – Nestas condições é permitido à mulher ir conversar na calçada com a vizinha, desde que o assunto se limita ao “forno e fogão”, ficando expressamente proibido qualquer tipo de lamentação contra a atitude do marido, que por ser bem mais inteligente, é quem sabe de tudo.
Art. 6º – Para resguardar um bom preparo físico da esposa, esta não poderá trabalhar fora de casa, com as suas atividades se limitando aos pequenos serviços caseiros, tais como varrer e arrumar a casa, lavar e passar, cozinhar e costurar, e cuidar dos filhos do casal.
Parágrafo Único – Caso seja do consentimento do marido que a esposa trabalhe fora, todo o seu salário será entregue ao marido, para que seja administrado com a inteligência e a competência que só o homem possui.
Art. 7º – A esposa que tentar subverter a ordem e a disciplina, no que se relaciona ao cumprimento desta lei, está sujeita às penalidades, que vão de um simples “puxão de cabelo” até a 69 chibatadas.
Art. 8º – Esta lei entra em vigor a partir da data da sua publicação, revogando-se as disposições em contrário.
IMGUINORAPULIS, Aos 31 de fevereiro do ano de hum mil e novecentos e pouco.
Assinado: DOTO LADRONESIO FURTADO, Prefeito Municipal.

          Continua no próximo domingo.