De logo aviso: o tema do qual vou tratar nada tem a ver com a agradável vista do nosso rio Tocantins e muito menos com o veto a projetos de lei oriundos de nossa Câmara Municipal. Tanto que a vista e o veto do título estão adstritos ao Supremo Tribunal Federal, referido aqui de forma íntima de STF. Antes da vista, vamos ao veto. Veto é o poder conferido ao chefe do Executivo – presidente da República, governador de Estado ou do Distrito Federal e prefeito municipal – para obstar que a proposta legislativa se converta em lei. Esse direito tem prazo de exercício de 15 dias e, quando manifestado, deve ser de forma expressa, formal e fundamentada. Pode ter motivação jurídica e política. O veto suspende, no todo ou em parte, a conversão do projeto legislativo em lei. Todavia, ocorrendo o veto, o Legislativo, examinando-o, tem, através do voto secreto de seus membros e por maioria absoluta, o poder de rejeitá-lo. Decorrido o prazo, havendo o silêncio do chefe do Executivo, dá-se a sanção tácita, e o projeto converte-se em lei.

De forma resumida, sem querer assumir função professoral, aqui a ensinar processo legislativo, temos, nessa ligeira moldura, o veto. Vetar é obstar.
Discutir essas questões é interessante para uma cidade. Muitas vezes um veto ou uma sanção têm profundas influências nas nossas vidas. Portanto, influi a vida de uma cidade, sobretudo ao encampar questões conflituosas, que clamam por atenção de todos nós. Não se trata de atentarmos para o preço do peixe ou da carne, ou ainda do chuchu ou do tomate. Se bem que, em época bem recente, já tivemos a inflação do tomate, numa entressafra que abalou a valorização dessa hortaliça, tão ao gosto do povo brasileiro, fazendo com que os preços fossem às alturas.
Dois assuntos de grande importância nacional – e um deles, como não poderia ser de outra forma, com repercussão internacional – têm chamado a atenção de alguns brasileiros preocupados com os destinos de suas vidas e do mundo. O primeiro deles é a despedida da passarela da nossa queridíssima Gisele Bündchen, após exaustivos serviços prestados ao mundo e à nação brasileira. É certo que a nossa Gisele ganhou muito dinheiro. Mas é algo de absoluta naturalidade. Numa das suas últimas entrevistas, tiveram a indelicadeza de perguntar-lhe quais os livros estava lendo. Com a naturalidade das nossas misses de antigamente, respondeu que não tem conseguido chegar ao fim dos livros a que se propõe a ler. Não disse quais. Nelson Rodrigues, se vivo fosse, num esgar de perplexidade, diria: – É verdade! É verdade! É verdade! E, com certeza, faria de imediato referência à estagiária da PUC, seu personagem idiossincrático de suas inesquecíveis crônicas.
O segundo assunto diz respeito ao veto. Não um veto qualquer. Veto com jeito de coisa grande, pois está inserido nos julgamentos do Supremo Tribunal Federal. Ainda assim, não é um veto veto. É um veto, com cara de vista, porém com finalidade de veto. Para que haja compreensão desse imbróglio todo, vou me fazer entender.
Conforme regimento interno do STF, os ministros, por ocasião dos julgamentos, têm pedido vista dos processos e não os devolvem para julgamento, mantendo-os paralisados por anos. Alguém teve o topete de dizer que essa conduta não é republicana. Nada mudou. Ficou o dito pelo não dito. Em 1998, o então ministro Nelson Jobim pediu vista de um processo referente a uma ação direta de inconstitucionalidade, proposta contra uma lei editada no mesmo ano que disciplina o contrato de trabalho temporário. O ministro Jobim aposentou-se. Na sua vaga assumiu a ministra Cármen Lúcia, e, até esta bendita data do ano da graça de Nosso Senhor Jesus Cristo, o pedido de vista se tornou um veto impossibilitando que o STF decidisse sobre a inconstitucionalidade ou não da lei impugnada.
São inúmeros os pedidos de vista que se transformam em veto, obstando assim que a nossa Corte Suprema de Justiça decida sobre temas que interessam a todos nós. O pior de tudo é que o CNJ, que é pau pra toda obra, quando se trata de tribunais e juízes, não faz nada. Nem pode fazer. Melhor: ninguém pode fazer nada. O regimento interno do STF determina que os autos, quando há pedido de vista, devem ser apresentados até a segunda sessão ordinária subsequente do julgamento. Esse prazo é solenemente desrespeitado pelos nossos ministros. Pergunta-se: quem vai obrigá-los? É ditadura do pedido de vista.
O mais recente pedido, com jeito brasileiro de veto, foi a do ministro Gilmar Mendes quando do julgamento da ação direta de inconstitucionalidade que se insurge contra o financiamento de campanhas políticas por empresas privadas. Foi pedida vista dos autos quando a votação já estava de 6 a 1 pela inconstitucionalidade do financiamento privado. O seu voto em nada alteraria o resultado. A vista é mantida, com a finalidade de veto, por mais de ano. Publicamente declarou o ministro que essa questão é do Congresso, mas não vota. Apenas veta a decisão a ser dada pelo Supremo Tribunal Federal, obstando, em desrespeito às regras regimentais, que se chegue à decisão final. Prevalece, sem qualquer sanção, a ditadura da vista como veto. Um exemplo nada edificante, que desqualifica o STF.