Começo este texto no finalzinho da tarde de terça-feira, dia 23, às vésperas do julgamento do presidente Lula. Não sei ainda qual o resultado. Ouso dizer que da cabeça do juiz Moro tinha eu a certeza do que sairia: a sentença condenatória, cuja fundamentação precisou de 238 páginas, tendo sido muito comentada por juristas da direita e da esquerda, como ocorreu com análise feita na Conjur pelo advogado criminalista Fábio Tofic Simantob, que sublinhou o seu estudo com o seguinte título: "Como o réu é culpado, não é preciso provar a culpa". E conclui pela atipicidade das condutas imputadas ao acusado Lula. Em suma, afirma: "...pela atenta leitura da sentença, se extraem algumas conclusões. Nenhuma prova é citada no sentido de que Lula tenha aceito promessa de vantagem enquanto era Presidente da República. E ato ilegal algum lhe é atribuído, a não ser ato de nomear diretores para a Petrobras sem demonstração de conhecimento ou ciência dos mal feitos praticados por eles, e muito menos de algum ato, gesto ou conduta praticado pelo ex-Presidente no sentido de favorecer igualmente alguma empresa." No mesmo sentido, sem referir-se especificamente ao julgamento, também na revista Consultor Jurídico, o instigante jurista Lenio Luiz Streck sobre o que ele denomina "lavajatocracia" afirma que "o jurista lava-jato funciona como o novo tipo-ideal do Direito: aponta o culpado e depois sai buscando narrativa (pós-verdades) para cobrir o gap entre o fato e a versão construída finalisticamente. Em suma: forjou-se uma lavajatolatria. E isso pega. E vira violência simbólica."
Para quem tiver interesse intelectual, os dois textos referidos valem a pena ser lidos. São juridicamente esclarecedores, seja qual for o veredicto do TRF4, de Porto Alegre. E repito: escrevo antes do julgamento.
Mas, ao mesmo tempo em que escrevia, dava atenção ao que estava sendo debatido na TV do site www.brasil247, onde eram postas questões graves referentes às posturas anti-institucional da rede Globo, como sistema de comunicação sempre comprometido com os seus próprios interesses e do capital estrangeiro, notadamente norte-americano, em detrimento do que poderia ser melhor para classe mais desprotegida do povo brasileiro, que recebe dela as migalhas do pão e do circo, tipo Faustão etc. Um dos comentaristas chegou a tachar a Globo de câncer institucional do Brasil. Confesso que não sei se é tudo isso, porém qualquer coincidência pode assemelhar-se à verdade. Basta que se diga, e isso é um fato indiscutível, que a Globo, incluindo todas as suas mídias, tem participado de todos os golpes perpetrados na velha e nova República, entre os quais deve ser citado o de 64, donde ela saiu extremamente beneficiada e com o poder de fogo que hoje ostenta. Mais recente foi o impeachment e a participação de forma subliminar no processo de desconstrução de Lula. Agora, está dando ampla ressonância à reforma da previdência, outra vez em prejuízo da maior parcela de vulneráveis do povo brasileiro, já que rico não precisa de aposentadoria, cujo ganho se concentra no seu patrimônio, gerador de riquezas, à custa, ainda, dos empregados que trabalharão, aprovado o novo sistema, até morrer.
Mas, minha gente, diz o axioma popular que o apressado come cru, ou, ainda, que cabeça que não pensa corpo padece. Então, vamos com calma. Seja qual for a decisão do TRF4 (e já foi dada), haverá recurso, tanto para um lado como para o outro. Ou, mesmo, se for necessário, em caso de haver algum constrangimento que atinja ou ameace a liberdade do acusado, há o remédio constitucional chamado de habeas corpus. Esse direito fundamental ainda não foi objeto de alguma trama diabólica por parte desse pessoal. É sabido que de louco cada um de nós tem um pouco. E eles, mais que ninguém, sabem que a garantia do habeas corpus deve ser preservada. Também dela precisarão.
E, embora estejamos num momento histórico de exceção, caracterizado pelo exercício da presidência da República por um vice golpista, que, de forma escancarada, sem nenhum pejo, participou ativamente da trama do impeachment, como consequência, nessa situação anti-institucional, vive-se uma caricatura de um estado de Direito, com um parlamento fragilizado em face de deputados e senadores estarem enterrados até o pescoço em corrupção, devidamente comprovada. E esses parlamentares, que espelham a parte podre do Congresso sem postura ética, são convivas do vice golpista, e tramam com ele contra os mais lídimos interesses do povo brasileiro, haja vista as reformas trabalhista e previdenciária. E aí, como salvação de um Executivo fraco, aparece a figura morta e sepultada moral e eticamente de Roberto Jefferson, ressuscitada do túmulo dos conchavos espúrios, para alçar a filha a ministra do trabalho, ostentando esta uma folha corrida de desrespeito aos mais comezinhos direitos trabalhistas. Entra nesse embate o ativismo do Judiciário, firmado no princípio da moralidade (art. 37 da Constituição Federal), para dizer ao constitucionalista de fancaria, ora no Palácio do Planalto, que quem ocupa cargo da importância de um ministério a essa pessoa tem que ser imposto um dever ético, no mínimo de respeito às leis trabalhistas, até porque se trata obviamente do exercício da titularidade do Ministério do Trabalho. Qualquer estudante de Direito teria essa percepção, sem que houvesse a necessidade da intervenção do Poder Judiciário.
Mas... Como disse o condoreiro Castro Alves: "Stamos em pleno mar..." E eu: sem ir mais adiante, acrescento: De incertezas...
P.S. Meus sinceros sentimentos de dor pelo falecimento do amigo e acadêmico Arnaldo. Todos nós perdemos com a sua partida. Deus o receba no seu reino.
* Membro da AML e AIL
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