O título é o que está acima, ainda com a exclamação. Mas poderia estar sem o sinal exclamativo. Apenas o titulo. Secamente o título. Não que eu tenha ficado surpreso, ou escandalizado com o fato em si. Não. Não foi bem isso. Muito menos com o desrespeito pelo uso da palavra desprezível contra uma pessoa que tem relevantes serviços para o povo brasileiro. Não os aquinhoados. Os menos. Pode ser que para alguns, ou muitos, não tenha.Respeito essa posição, muitas vezes contaminada pelo ódio preconceituoso. Mas, para alguns, ou muitos, tenha. Os fatos têm demonstrado essa dicotomia, própria de um regime democrático, em que duas funções de poder – o Executivo e o Legislativo – são instituídas pela disputa eleitoral. E só haverá Estado democrático de direito pelo voto, por via do legítimo processo eleitoral.

Ouvi num celular um policial, não sei se delegado ou se agente, dizendo que tinha mantido contato com o colega de Brasília, e este lhe dizia que o juiz Moro já estava fundamentando o decreto de prisão (de Lula), quando foi percebido que “o Moro” ia expedir o mandado de prisão, que sairia nos dois dias seguintes, ela (a Presidenta) correu, correu, página só (sic), mandou editar imediatamente numa edição nomeando o vagabundo (Lula). O teor, não literal, dessa conversa divulgada nos celulares, com mais detalhes, chega ao clímax do ódio com a grandfinale: - ela correu, correu, mandou editar imediatamente numa edição nomeando o vagabundo, referindo-se ao ex-presidente.
Vagabundo é o jargão policialesco usado, quando referido a qualquer infrator, ou suposto infrator. Não sei se essa mesma linguagem foi utilizada para os ricos donos de empreiteiras e também para outros políticos, como o deputado federal Eduardo Cunha, que, segundo dizem, (não sei, ouço falar) tem contra si provas robustas de recebimento de propinas e, até esta bendita data, nada foi feito contra ele, a não ser prosaicas referências por parte da mídia. Agora nem tanto. Cunha continua lépido e fagueiro. Talvez não seja vagabundo. Sempre esteve no andar de cima.
Como a palavra vagabundo me suscita váriossentidos semânticos,fui ao pai dos burros. No bendito livrinho, encontrei que vagabundo é quem vagueia, quem anda sem sentido, e mais contundentemente: sujeito de maus costumes, salafrário. Aí me veio à lembrança que, em junho de 1998, o nosso não vagabundo Fernando Henrique Cardoso, ainda chamada FH sem o C, que há décadas não dá aulas, e só faz palestras cobrando também o olho da cara, chamou os aposentados de vagabundos. Não sei se por que perambulavam por aí, ou se por serem salafrários. Essa aversão aos vagabundos aposentados entrou para história, que, com certeza, não será contada em nossos livrinhos escolares. Nem repetida neste momento. Só vale o plano real, que o nosso sociólogo se apropriou descaradamente de Itamar Franco, mineirinho mulherengo que foi para o Sambódromo e levou uma dessas doidivanas, rotulada de atriz, que foi fotografada de baixo para cima sem a famosa indumentária íntima. Itamar morreu, ainda assim, sem o estigma de ser vagabundo.
Não falo nem de Aécio, que não deve ter lido nem Branca de Neve, que foi flagrado numa blitz, recusou submeter-se o bafômetro, mas com certeza é um homem trabalhador. Não merece o estigma de vagabundo. Por ser tão trabalhador, resolveu fazer um aeroporto público/privado em terras familiares, gastando do erário de Minas mais de 10 milhões de reais, com acesso privado, e, no final, ficou o dito pelo não dito. Trata-se de um trabalhador, que viajou mais para o Rio de Janeiro do que para Minas, onde era governador. O lazer de fim de semana era o seu momento de descanso dos árduos trabalhos na direção do Estado. Resultado: perdeu as eleições nos dois turnos para a execrada Dilma, que, quem sabe na linguagem policialesca, deve ser vagabunda. 
Mas deixemos essa turma pra lá. Sabem?!. Houve uns cansados trabalhadores braçais, baladeiros da noite, que encontraram Chico, o nosso Buarque de Holanda, e não titubearam, tacharam-no de vagabundo. Pobre do Chico, que sequer tem jeito de Carlitos, o vagabundo de nossos sonhos, que vem desde A Banda fazendo suas músicas e escrevendo seus livros. E até mesmo, pasmem, fez uma música para exorcizar o vagabundo, cuja letra se inicia de forma imperativa: Vai trabalhar, vagabundo / Vai trabalhar, criatura / Deus permite a todo mundo / Uma loucura. Chico, rotulado de vagabundo, pede, manda, clama que o vagabundo deixe de ser vagabundo e o manda até se enforcar. Ainda assim, vem essa turma de trabalhadores do ócio, cansados de nada fazer, chamá-lo de vagabundo.
No contexto atual, a palavra vagabundodenota um autoritarismo com forte acepção preconceituosa. Os ditadores sempre dela lançaram mão, como demonstração de mando. Em 1968, a ditadura militar demitiu Vinícius de Moraes do cargo de embaixador. Ato foi assinado pelo plantonista da época, general Costa e Silva, que, em linguagem autoritária, própria dos ditadores,determinou: “Demita-se esse vagabundo.” E o poetinha saiu por todo esse Brasil e o mundo inteiro vagabundeando e cantando os seus eternos amores. Ele ficou, e os opressores dos vagabundos foram para lama da história.