É recomendável descontextualizar, para que se possa compreender (mas isso quem quiser; por favor, ninguém é obrigado a tanto) a irresponsabilidade criminosa, política, jurídica e histórica, com mais essa mancha a toldar o Estado brasileiro, vitimado durante a sua curtíssima vida democrática por sucessivos golpes, inclusive com golpe sobre golpe, como ocorreu na posse de João Goulart, que teve a imposição goela adentro do sistema parlamentarista, e, no curso da ditadura militar-civil e midiática de 64, quando do afastamento de Costa e Silva, por ter sido acometido de derrame cerebral, o vice-presidente Pedro Aleixo, que era civil, foi vetado de assumir pelas forças armadas, dando-se o golpe dentro do golpe.
Então, comecemos:
Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro, subsidiária da Petrobras, que foi demitido do cargo sob suspeita de repassar propina de empresas contratadas para políticos do PMDB: – Romero, então, eu acho a situação gravíssima. Romero Jucá, ministro do planejamento do governo provisório de Michel Temer: – Eu só acho o seguinte: com Dilma não dá, com a situação que está. Machado: – Aquele pessoal que resistiu acordou e vai dar merda (...) Tem que ter um impeachment. Jucá: – Tem que ter impeachment. Não tem saída. (...) Tem que mudar o governo pra poder estancar essa sangria. Machado: – A solução mais fácil era botar o Michel. Jucá: – Renan que está contra, porque não gosta do Michel, porque o Michel é Eduardo Cunha. Gente, esquece o Eduardo Cunha, o Eduardo Cunha está morto. Machado: – É um acordo botar o Michel, num grande acordo nacional. Machado: – O Renan é totalmente “voador”. Ele ainda não compreendeu que a saída dele é o Michel e o Eduardo. Na hora que cassar o Eduardo, que ele tem ódio, o próximo alvo, principal, é ele. Então quanto mais vida, sobrevida, tiver o Eduardo, melhor pra ele. Ele não compreende isso não.
E o diálogo dos dois condestáveis da República, um deles o notório Romero Jucá, ambos envolvidos em grandes e suntuosas falcatruas, vai em frente, urdindo o golpe. Cada um quer salvar a sua pele, e o impeachment da presidenta Dilma é a salvação dessa corja de safados e de tantos outros safados. Não escapa ninguém. Sigamos acompanhando esse revelador diálogo golpista.
Jucá: – Tem que ser um boi de piranha, pegar um cara, e a gente passar e resolver, chegar do outro lado da margem. Aí indaga-se: Que boi de piranha? Que cara? Com certeza, o Cunha, utilizado para fazer a travessia. Ele seria útil até o momento final da autorização do impeachment na Câmara Federal. No Senado, teria o controle da bancada do PMDB, comandada pelo golpista Jucá, e dos aliados do PSDB. Segue-se:
Machado: – A situação é grave. Porque, Romero, eles querem pegar todos os políticos. Jucá: – Acabar com a classe política... Machado: – E o PSDB não sei se caiu a ficha já. Jucá – Caiu. Todos eles Aloysio (Nunes, senador), Serra, Aécio. Machado: Caiu a ficha. Tasso (Jereissati) também caiu? Jucá: – Também. Todo mundo na bandeja para ser comido. Machado: – O primeiro a ser comido vai ser o Aécio. O Aécio não ganha p... nenhuma. Jucá: – Não, esquece. Nenhum politico desse tradicional ganha eleição, não. Machado: – O Aécio, rapaz... O Aécio não tem condição, a gente sabe disso. Quem que não sabe? Quem conhece o esquema de Aécio? Eu, que participei de campanha do PSDB... Jucá: – É, a gente viu tudo.
Uma pequena parada. Talvez quem não saiba nada sobre o Aécio é o juiz Moro, o Ministério Público Federal e a Polícia Federal, porque seu nome tem sempre sido citado em delações premiadas, com a acusação de recebimento de propina. Mas Dilma, por não compactuar com as falcatruas, pagou o pato. O pato da Fiesp, que participou ativamente do impeachment da presidenta.
E o diálogo golpista fica mais sério: Jucá: – Conversei ontem com alguns ministros do Supremo. Os caras dizem ‘ó, só tem condições de... sem ela (Dilma). Enquanto ela estiver ali, a imprensa, os caras querem tirar ela, essa p... não vai parar nunca. Machado: – Um caminho é buscar alguém que tem ligação com Teori (Zavascki), mas parece que não tem ninguém. Jucá: – Não tem. É um cara fechado, foi ela (Dilma) quem botou...
Dedução: Romero Jucá não sabia que estava sendo gravado, de outro modo não soltava a língua como soltou. Planejou com Eduardo Cunha, Michel Temer e o pessoal do PSDB o golpe. Manteve contato com ministros do Supremo. Assim ele diz. Quais? Exclui apenas Teori Zavascki, um jurista sério, sem vinculação partidária, e de conduta ilibada, requisitos morais em desuso nos tempos atuais, e o impeachment saiu logo em seguida, com a queda da ficha dos líderes do PSDB. Numa democracia séria e num Estado de direito, sem preponderância dos interesses dos grupos econômicos, o impeachment, desde a sua origem, seria anulado pelo Supremo, por atentar contra um dos poderes da República, bastando, para isso, uma mera e simples petição de, no máximo, vinte linhas. Mas...
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