No filme ...E Deus criou a mulher, com Brigitte Bardot, há uma passagem em que o personagem vivido por Bardot, Juliette, dialogando com um dos seus jovens assediadores, este lhe fala da necessidade do futuro, no sentido de viver o presente para chegar a ele com a vida construída para ser feliz. Juliette, duvidando desse porvir, porquanto não queria esperar o futuro, mas viver o presente, rebate com veemência destruidora: - Ah!, o futuro só estraga o presente! Se pensarmos bem, há muitas pessoas que estragam o presente vivendo exclusivamente para o futuro. Em resumo, só pensam no futuro. Ah!, o meu futuro!, ah!, o futuro dos meus filhos!, afirmam e reafirmam, com se tivessem uma bola mágica de cristal a lhes dá a certeza de que no futuro o sacrifício do presente será compensado. E esse sacrifício, com alguma característica masoquista, é para que, martirizando-se agora, seja-se feliz no futuro, nem sempre certo, mas apenas uma possibilidade duvidosa. Então, as pessoas poupam vida e o dinheiro, vivendo na pobreza e enriquecendo as instituições financeiras, porque a única felicidade está no futuro. E a vida se esvai. Outras deixam de amar no presente, reservando a força desse sentimento para amar, à exaustão, no futuro. Os mais radicais deixam de amar os filhos, quando necessitam de tanto amor, para tê-los como um grande investimento para futuro. E aí, meu caro amigo, quando chega o futuro - e às vezes ele chega, apesar dos pesares -, não há mais tempo para amar. Os filhos já estão criados e vivendo novos amores.   
Confesso que não sei se o futuro, como diz Juliette, personagem de Bardot, só estraga o presente. Mas quero admitir que ela não deixa de ter um tanto de razão, ainda em filigrana. Talvez essa minha crença seja pelo fato de que eu sempre vivi, com todas as forças, o presente. O futuro veio como algo natural que o tempo nos reserva, nem sempre repleto de alegrias, nem sempre contaminado por tristezas, ou algum outro sentimento mórbido. Sou daqueles otimistas com o presente e sem grandes preocupações com o futuro, que pode não ser tão certo para atender às expectativas daqueles que poupam no presente para viverem a certeza de um futuro incerto. De tudo uma convicção: a vida presente é certa, o futuro é uma incógnita. Marcel Pagnol, dramaturgo e cineasta francês, ao falar sobre a busca da felicidade, uma obsessão de todos nós, e motivo dessa preocupação patológica com o futuro, nos diz que "a razão pela qual algumas pessoas acham tão difícil serem felizes é porque estão sempre a julgar o passado melhor do que foi, o presente pior do que é e o futuro melhor do que será". Essa obsessão em desvalorizar o presente e valorizar ao extremo o futuro é a certeza ou a aposta em viver uma vida feliz, já que não temos o poder de fazer com que o passado possa ser literalmente refeito, como o vivemos. O passado passou, eis uma verdade acaciana. Ocorre que, na maior parte das vezes, se vive a felicidade do passado sem o saber. Voltaire, esse grande iluminista francês, quem sabe esteja certa quando afirma que "os homens que procuram a felicidade são como os embriagados que não conseguem encontrar a própria casa, apesar de saberem que a têm". Pois é. A felicidade é atemporal. Está bem do nosso lado. Bem dentro de nós. No sorriso, na flor, na boa vontade, no amor, no simples gesto do acolhimento, na vontade de viver, no sentido de ser, no quarto na casa, no quintal, na sala, na sombra da árvore, na conversa com o amigo que agente ouve e nos ouve, no beijo dado com sofreguidão ou ternura na amada ou no amado, no aperto de mão, na palavra amiga, enfim no simples viver, e agente quer mais, muito mais, e assim não percebe a presença provocante da felicidade, nem sempre denunciada no sorriso aberto. Freud, que representou um momento revolucionário do ser humano, ao inventar a psicanálise e desvendar o inconsciente, ensina que "a felicidade é um problema individual. Aqui, acentua Sigmund, nenhum conselho é válido. Cada um deve procurar, por si, tornar-se feliz". Mas Freud é Freud. Prefiro Quintana, esse poeta injustiçado, que não chegou à Academia, que tem outra percepção: "O segredo é não correr atrás das borboletas. É cuidar do jardim para que elas venham até você." Eis a essência de tudo: cuidar do jardim! Cuidar de nós mesmos. Cuidar da casa. Ter cuidado e cuidar de nossos sentimentos. Ah!, Quintana, quantos Mários Quintanas deveriam existir para nos aconselhar a cuidar do jardim da felicidade, já que, cuidando, as borboletas chegam trazendo nas suas asas coloridas pelo amor a tão desejada felicidade?!
Mas quem sabe a verdade não esteja na simplicidade poética de Carlos Drummond de Andrade, que, sem rebuscamentos, esclarece-nos que "há duas épocas na vida, infância e velhice, em que a felicidade está numa caixa de bombons". Drummond, meu caro Drummond, se essa não é a solução de todos nossos problemas existenciais, poderia ser uma rima. Isso me toca tão profundamente: - a felicidade da caixa de bombons! Essa felicidade não está no passado, nem no presente, e muito menos no futuro. Está bem dentro de nós. Na simplicidade do que fomos e somos e do que sentimos. Nem sempre o amor nos faz feliz, já que pode conter alguma tragédia de não ser tão amor ou ser exageradamente amor. Por isso, Vinícius, esse artista que amou todas e tantas, em Dialética, confesse a tristeza de não ser feliz: "É claro que te amo / E tenho tudo para ser feliz / Mas acontece que eu sou triste..." Por isso mesmo, o cancioneiro não se cansa de exaltar que a tristeza não tem fim, felicidade sim. Ainda assim, sou insistente, fiquemos felizes e espantemos a tristeza, embora a felicidade seja uma gota de orvalho, mas ela é mais poderosa que a tempestade de todas as tristezas.