Ah!, Leminski, esse poeta que me encanta e canta nos versos os meus sonhos e devaneios. Que vontade insana de ser Leminski. Impossível! Não posso, embora queira encarná-lo. Fica apenas a vontade. Em um pequeno poema, esse imenso poeta expressa todos os sentimentos do mundo atual: “Vazio agudo / ando meio / cheio de tudo.” O futuro, quem sabe, continua sendo futuro. Só nos resta escrever. E esse poeta curitibano que canta o sentido da escrita adverte: “Escrevo. E pronto. / Escrevo porque preciso, / preciso porque estou tonto. / Ninguém tem nada com isso. / Escrevo porque amanhece, / e as estrelas lá no céu / lembram letras no papel, / quando o poema me anoitece.” Pois é. O poema tem essa sublime força de viver, anoitecer e não morrer. É eterno. Tudo morre. Menos o poema e o poeta. Quiçá seja por isso que Cora Coralina, em Vintém de cobre, meias confissões de Aninha, nos conclama, como a profetizar o embate entre o bem e o mal, esta verdade poética: “Não te deixes destruir... / Ajuntando novas pedras / e construindo novos poemas. / Recria tua vida, sempre, sempre. / Remove pedras e planta roseiras e faz doces. Recomeça. / Faz de tua vida mesquinha / um poema. / E viverás no coração dos jovens / e na memória das gerações que hão de vir.”
Chego de São Paulo, onde estive em tratamento de saúde. Segundo os médicos, coisa sem muita importância. Mas carece de alguns cuidados. A diabetes é um mal que corrói as nossas entranhas. Minha impressão: as cidades grandes, como se chamavam em tempos passados - lembram?! -, andam desumanizadas. Cada um por si e ninguém por ninguém. É uma arena, onde os gladiadores entram imbuídos de ceifar a vida do inimigo, que irá obrigatoriamente enfrentar, para os aplausos e a satisfação orgástica do endinheirado que paga para ver o sangue derramado e a morte do perdedor. Há premente necessidade de se fazer da vida um poema, para que, de longe ou bem de perto, se possa um dia abençoar ou saudar o inimigo com a ternura da solidariedade.
Viver ainda é conviver. Ninguém vive consigo mesmo, ou ama a si mesmo. A referência de todos os sentimentos é o outro. Andei e perambulei por vários lugares. Metrô, ruas, avenidas, shoppings, lojas, livrarias, teatro, hospitais, consultórios médicos, tentando apaziguar as dores que decorrem das nossas sofrências. Vi um mundo roborizado. Alguém que passa apressado por a gente falando às alturas, aos berros; outro incessantemente dedilhando o celular. Cada um vivendo a sua vida virtual. Para descansar os pés inchados do caminhar, sentei-me numa das poltronas de uma área de espera. Todos os outros lugares ocupados. Sem uma reles exceção, cada um, patologicamente, absorto dedilhando o seu celular, como gesto integrante de sua necessidade orgânica e psíquica. É, quem sabe – preciso reler com urgência – o Admirável Mundo Novo. Volto a Cora Coralina, a minha obsessão do viver humanamente. E ela nos diz: “A estrada da vida / pode ser longa e áspera. / Faça-a mais longa e suave. / Caminhando e cantando / Com as mãos cheias de sementes.” 
Ah!, e volto à interjeição (ainda existe interjeição?!), para recorrer à lua de Leminski e tornar o mundo mais mundo, mais sentimento, menos áspero: “A lua foi ao cinema, / passava um filme engraçado, / a história de uma estrela / que não tinha namorado. / Não tinha porque era apenas / uma estrela pequena, /dessas que, quando apagam, / ninguém vai dizer, que pena! / Era uma estrela sozinha, / ninguém olhava pra ela, / e toda luz que ela tinha / cabia numa janela. / A lua ficou tão triste / com aquela história de amor,  / que até hoje a sua insiste: / - Amanheça, por favor!”
Vou fazer como a lua de Leminski. Irei ao cinema, para ver um filme engraçado, para livrar-me dos gritos esganiçados das ruas e da solidão virtual dos restaurantes e das mesas de bar, já que, em que pese a sala escura do cinema, prefiro molhar-me na chuva e o chilrear dos pássaros no nascer do sol de todas as manhãs. Até porque as relações estão menos humanas e mais devotadas aos animais. Uns criam gato; outros, macacos. E muitos criam cachorros. Salomé, que não tem nenhuma relação com Herodes, está no colo de sua dona, uma empresária bem sucedida, que enfatiza se afeto: - É como cuidar de uma criança. Ah!, se fosse. Que bom seria para quantas abandonadas nesse mundo de Deus e do homem. E vida se vai do celular aos animais humanizados, e o mundo cada vez mais desumanizado. Não há culpa nem culpados. É apenas o sentimento do mundo.