Aureliano Neto*

O que um tem a ver um com o outro? Nada. É, em essência, corpo e espírito, não têm nenhuma semelhança. E têm! - poderia assim afirmar. O colunável é aquela figura do cotidiano ou da semana, que está sempre retornando de algum lugar da Europa ou da terra do Tio Sam. Mais ou menos assim: - Fulano de tal dos anzóis Pereira acaba de retornar de um inesquecível périplo que fez à Espanha ou Itália, com prazerosa passagem pelos Estados Unidos, onde, ao lado de sua amada e belíssima mulher (mulher de colunável não pode deixar de ser bela e amada), pôs-se a par dos grandes lançamentos da moda internacional. E diz-s mais: - Chegaram e já estão recebendo os amigos para um requintado jantar em sua aprazível mansão. Pratos especiais da cozinha francesa. Por aí a coisa vai. Mas o colunável, por incrível que possa parecer, está sempre vindo de algum lugar. Por isso mesmo, há o colunável diário, o semanal e o mensal. O anual é aquele que perdeu a vez no cenário dos fatos. Só com muito custo está vindo de algum lugar, quando muito de Fernando Noronha, onde praticou exaustiva pesca submarina. Atualmente, tem uma nova espécie de colunável: trata-se daquele que não está mais vindo, encontra-se sempre por lar. É um viajeiro. Saltita com desenvoltura daqui para ali, como incansável transeunte do mundo. Não raro dia aparece em destaque, tendo ao lado o famigerado Coliseu, ou a torre Eiffel. Não deixa de ser uma glória. O certo é que colunável que se preza, tem que estar a viajar. A viagem é o seu encontro consigo mesmo. Não se trata de sociopatia. Ao contrário do que se possa imaginar que há alguma doença a carecer de cura. São pessoas que gozam de uma saúde, capaz de levar um laboratório de aspirina à falência. Nas fotos, bem destacadas, no alto da página, ladeados por alguma figura de alta importância no mundo econômico ou social, estão sempre a rir de alguma coisa. No meu frágil entendimento de incolunável, creio que o riso histriônico é do ócio. Isso mesmo, do não fazer nada, e, ainda, por nada lhe faltar, mesmo que um mísero dólar ou euro, na ânsia perdulária de poder ir, para logo estar vindo.
O que mais me entusiasma com o colunável é, nessa sua maratona de ir e estar sempre vindo, conseguir superar o trânsito do marinheiro embarcado, ou mesmo de qualquer comandante dessas nossas gigantes aeronaves que estão cruzar os oceanos de todo o mundo. Tanto que fiz algumas reflexões sobre o tema, entre as quais destaco esta preciosidade de pensamento: não sei se o que é mais cansativo é ser colunável e, por essa estafante e necessária missão, estar num permanente ir e, sobretudo, vir, ou ser, como os comandantes de boeings e airbus, que, por força do ofício e da necessidade de ganhar a vida, estão a vencer as dificuldades dos céus do mundo, a enfrentar as turbulências, num ir e vir quase que diária, mas, infelizmente, para os nossos louros pilotos, sem direito a fotos risonhas nas colunas sociais. Uma pena. Dever-se-ia dar um destaque a esses bravos e intimoratos comandantes, que teriam que ter lugar cativo nas colunas sociais, como belos espécimes desbravadores dos céus do universo.
Volto à questão inicial: o que tem a ver o colunável com o horóscopo? De início, respondi que nada. Depois, pensei melhor e concluí que há algumas afinidades. Cito a primeira delas: o horóscopo, faça chuva ou sol, sai todos os dias em nossas folhas. E o dia em que, por qualquer fatalidade, não sair, com certeza, será um Deus nos acuda para o secretário da redação do jornal. Fácil chegar-se a essa óbvia conclusão. Tem gente tão crédula que só abre a porta de casa para pôr o pé na rua se ler a previsão do seu signo. Se, por qualquer azar, desse que ocorre em um milhão de hipóteses, a situação descrita não lhe for das melhores, o dia está perdido. Tive um amigo, que já nem sei por onde anda, que seguia essa cruel rotina.
Outra semelhança entre o colunável e o horóscopo está no fato de que, dificilmente, as situações descritas nos signos dizem se vai ocorrer uma catástrofe. Bem ao contrário, o horoscopista, para os mais requintados, astrólogo, que não tem nada de besta, de outro modo o jornal não vende, faz as previsões mais dúbias e com possíveis vantagens para o interessado. A coisa funciona mais ou menos assim: - a Lua se associa com Urano, entre suas casas quatro e oito, e incentiva a harmonia em seus relacionamentos. Bom para ter um bom relacionamento doméstico, extensivo àquela pessoa que está bem próxima, com evidente possibilidade de conforto físico e espiritual. E costumeiramente conclui: - Há excelentes perspectivas para os negócios e amor. O sujeito lê tudo isso, com a euforia de que tudo pode acontecer de positivo, Na primeira esquina se depara com um assaltante que não está num dia de Lua com Urano. Lá se vai por água a baixo a tão auspiciosa previsão. O colunáve, um tanto horóscopo, é tratado com extremado otimismo. Nelson Rodrigues, o grande frasista, dizia que o ser humano é o único que se falsifica. É uma verdade. Nós temos a mania da fantasia. O cachorro há de ser sempre cachorro. O ser humano, não. Tem a cruel mania de fazer estelionato de si mesmo. Um pouco de ser o que não é, ou de querer ser além do que é.

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