Não sei por que, todas as vezes que encontro a palavra oligarquia, me vem de imediato à mente, com reiteração obsessiva, a palavra confraria. Aí fico num zanzar mental: oligarquia, confraria; confraria, oligarquia. Dessa minha obsessão mais fonética que semântica, tento encontrar razões que justifiquem essa associação. Talvez a causa esteja deslocada no tempo. Pensei, em singela especulação, que confraria fosse alguma espécie de governo de amigos, como até mesmo me afirmara um velho conhecido, numa rápida troca de ideias. Mas, após algumas insistentes perquirições, cheguei a uma conclusão simplista, que me foi dada pelo Dicionário Escolar da Língua Portuguesa. Ora, vejam bem?!, um simples e inofensivo dicionário, editado em nova ortografia, portanto com alguma idade avançada, e disposto a tirar-me da mais intrincada dúvida linguística. Lá encontrei a seguinte definição que me agradou: Confraria - Associação de pessoas com a mesma profissão, os mesmos hábitos e as mesmas ideias. Stop! Bastou-me. E fiquei por aí mesmo, quanto ao significado do vocábulo.
Mas, lembrei-me de um tango, daqueles bem antigos, que fala em confraria do vermuth (sic), do conhaque e do traçado. É um tango, como todos o são, repleto de tragédia. Os milongueiros da terra de Maradona e de Messi, que voltou ao pedestal da Copa, gostam dessas lamúrias. Beber, dançar e amar, ao som de Gardel, na sofrência dos apaixonados incompreendidos, cuja história é sempre amarga e triste. Por aqui, há um pessoal que se reúne no carnaval, com o sugestivo nome de Confraria do Copo. O copo, em si, tem pouco a ver com a confraria, não é tão fundamental, pois apenas justifica o encontro da turma. A bem da verdade, o essencial não é o copo, e sim o que dele é copiosamente sai. A confraria, pelo que se sabe, é essencialmente etílica. Quando no Sioge, estávamos sempre em confraria, ou do vermute, ou da cachaça. E ainda havia a turma dos cantantes, depois que viravam alguns copos: Ferdinando, Lobão, Paulo Ramos e Virgílio, este o nosso seresteiro. Dizem que não tinha afinação com o regional. Com todo respeito que me é exigido, estava mais para cantor de banheiro. Mas, Ferdinando era o nosso Orlando Dias. Facialmente, bem parecido com o cantor das grandes canções chorosas. Apenas para ilustrar: Lobão foi pra Rádio Ribamar. Programa de calouro. Resolveu cantar Iraci, sucesso de Calos Gonzaga. O regional atento. Lobão, serelepe, não chega nunca ao final. Fatalidade cruel: esqueceu como terminar a música. Ia e vinha como disco furado. Pelo meio, o regional parou a música. Na confraria, onde todos se reuniam, o comentário era geral. Os amigos solidários com o intérprete do esquecimento.
Confraria, confraria é algo ameno. Os amigos se associam pelas ideias, e interesses gravitam em torno das utopias. Porém, o que me chama a atenção não é a confraria, é a oligarquia. De fim patrimonialista. Em tempo eleitoral, fala-se muito nela. Os dicionários de política dizem que é o poder de uma pequena minoria de pessoas (oligos), que pretendem ser muitas vezes as melhores e que, na verdade, são as mais poderosas. Constitui uma forma de governo em que o poder se concentra num pequeno grupo de pessoas, as quais se distinguem pela nobreza, pela riqueza, pelos laços familiares, ou, ainda, pela amizade, numa troca de benesses.
No Brasil, há feudos de oligarquia. Existem as oligarquias que dão certo e outras, infelizmente para as castas que as compõem, que dão com os burros nágua. Em nosso Estado, fala-se na oligarquia Sarney, cujo modelo tem servido de exemplo para outras famílias, nem sempre alcançando êxito. Esse modelo de exercício do poder se prolifera no Brasil inteira. Basta que se faça um exame do mapa eleitoral dos pretensos candidatos. São famílias, há séculos, encasteladas no poder. E vai passando, ou mesmo não passando, de pai pra filho e de filho pra pai, netos, bisnetos, ou todo um acervo de parentada e fiéis amigos de todas as horas e de todos os momentos.
Se concebermos um sentido semântico mais flexível à oligarquia, como forma de expressão de poder, as igrejas, em nome de um deus meio penso, que pende mais para um lado do que outro, estão construindo suas oligarquias confessionais, ora elegendo um vereadorzinho aqui, ora um deputado ali, ou um senador mais adiante, e assim vão formando as suas oligarquias da fé, que, na dimensão em que está se sucedendo, chegar-se-á a um regime plutocrático, sob o ponto de vista do exercício do poder de uma casta bem-aventurada.
Assim, são muitas as oligarquias setorizadas. Quando não é o marido, é a mulher que é candidata, ou um irmão biológico, ou de fé, ou uma irmã, ou o filho ou filha ou, ainda, um compadre, ou, na pior das hipóteses, o amigo de confiança. Às vezes, o amigo de confiança, da cozinha da casa, depois de se refestelar no banquete da oligarquia, deserta. Vai cantar em outra freguesia. Melhor falando: vai compor a sua oligarquia, que ninguém é besta. E aí o discurso muda. Pior de tudo: as oligarquias vão se proliferando, mais do que filho em casa de pobre. Ressalve-se: antes da chegada do Bolsonaro, que já avisou que vai acabar com essa festa de parição.
Há, ainda, o moderno oligarca. E o antiquíssimo. Parece uma praga. Como dizia Gonzagão, é de pai pra filho. O pai é deputado, o filho é candidato a alguma outra coisa. Ou o pai é prefeito, a filha é deputada. Se formos à baixada, a história é a mesma; no sertão, nada muda; enfim, repetindo Gonzagão. é de pai pra filho e de filho pra pai. O roto fala do esfarrapado. Conheci um prefeito, jovem líder promissor, que tentou iniciar uma oligarquia familiar, elegendo a mulher, mas não teve muito sucesso. Como se diz no jargão popular: o tiro saiu pela culatra. Então, há oligarquia pra todo gosto. Se quisermos nos livrar delas, temos que ficar de olho no padre, ou melhor, os tempos são outros, de olho no pastor e de olho no benfazejo dízimo, já que Deus é Pai de todos nós. Amém, ou, como quiserem, aleluia! P.S.: Entro de férias neste mês de julho. Notícia triste: o falecimento de Jãnio Arley, velho companheiro do Jornal e da Rádio Imperatriz. Meus sentimentos de pesar aos seus familiares.
* Membro da AML e AIL.
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