Esta crônica não é bem uma crônica, mas uma coleta de opiniões, retiradas daqui e dacolá, numa demonstração do clima sombrio em que vive a Nação brasileira, após o resultado do último pleito presidencial, que culminou com a vitória da presidenta Dilma Rousseff, e também a comprovar que o vice é quase sempre um assessório inútil, porém transfigurar-se em triste personagem histórica de Joaquim Silvério dos Reis, indivíduo pernicioso e perigoso, estando à espreita para passar perna no titular do cargo e, derrubando-o pelas manobras mais escusas, assumir o poder a qualquer preço, ainda que seja para enlamear a sua biografia. Justiça seja feita, não me refiro a Itamar Franco, que a história contada e vivida à época do impeachment de Collor de Mello, deflagrado em 1992, que levou o então presidente à renúncia, não reproduz nenhuma conduta de deslealdade para com o governante que com ele foi eleito.

Mônica Bergamo, na sua coluna da Folha de São Paulo, Ilustrada, página C2, de 4 de dezembro de 2015, escreve: “Eduardo Cunha resolveu deflagrar o impeachment depois de também detectar sinais de que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, poderia pedir ainda nesta semana ao STF (Supremo Tribunal Federal) o afastamento dele da presidência da Câmara dos Deputados.” Diz mais a colunista da FS: “Um aliado de Cunha admite que o presidente da Câmara, nesse sentido ‘vacilou’. ‘Ele queria propor a abertura do impeachment na terça, mas decidiu esperar mais um dia na esperança de que Jaques Wagner virasse os votos do PT na Comissão de Ética que vai julgá-lo.” Percebendo que estava sendo enrolado por Jaques Wagner, afirma Mônica Bergamo, refez o calendário e revelou a sua decisão com exclusividade a uma revista semanal (que pode ser Veja, Isto é, ou Época, possivelmente a primeira, por motivos óbvios) e precipitou o andamento do processo de cassação de Dilma. Conclui a jornalista da Folha: “Eduardo Cunha acredita que, num eventual governo de Michel Temer, poderá, com as bênçãos dele, refazer acordos na Câmara e escapar da cassação.”
Temer, o vice, é constitucionalista. Pelo menos é autor de um livro de Direito Constitucional e deu palestra recentemente no Instituto Brasiliense de Direito Público, do qual o ministro do STF Gilmar Mendes, considerado pela mídia líder do PSDB na Corte Suprema, é um dos sócios. Fechou-se em copas e nada falou a respeito do procedimento de Eduardo Cunha. Ao contrário, em plena “crise”, foi “divulgada” uma carta que relata o ressentimento do vice com a presidenta. E dele não partiu até o momento nenhum gesto de nobreza, ainda que para enganar o eleitor que elegeu, para defender o governo que é dele e do qual ele participa, tendo sido legitimamente eleito.
André Singer, também na Folha, p. A2, Opinião, em 12 de dezembro de 2015, escreve, num texto rigoroso, sobre “a traição de Temer”, que, aliando-se a Eduardo Cunha, um corrupto despudorado e apoiado por Paulinho da Força, outro processado por corrupção, preferiu desestabilizar as instituições democráticas, sendo patrocinador do golpe de destituição da presidenta. Singer, nessa passagem de sua coluna semanal, extravasa a sua decepção com o vice de Dilma: “A incrível atitude de Michel Temer nesta semana, entretanto, me faz repensar todo o esquema. Sem qualquer razão de fundo, a não ser a óbvia ambição de poder, ele abandonou a companheira de chapa na hora em que ela mais precisava dele. Como não há qualquer divergência política que justifique o afastamento, uma vez iniciado o trâmite do impeachment, o vice inventou uma série de desculpas esfarrapadas. (...) E o vice traiu, também, a si mesmo.”
E esse golpe tem o apoio aberto do PSDB, com manifestação explicita de Aécio Neves, abraçando-se comemorativamente ao corrupto Cunha, e de José Serra, que já deu entrevista à Folha, colocando-se à disposição para colaborar com o governo de Temer. Dois políticos derrotados, que trilham o único caminho de chegar ao governo, já que, vencidos sucessivamente nas urnas presidenciais, assumiram a postura da UDN de Lacerda, que, de dar tanto golpe, foi golpeado no curso do golpe de 64, morrendo no ostracismo da história. Concluo citando Vladimir Saflate, que, em texto publicado na FS, p. C12, de 11 de dezembro de 2015, faz esta peremptória afirmação: “O vice tem como seu maior aliado o presidente da Câmara: um chantagista barato acostumado, quando pego em suas mentiras e casos de corrupção, a contar histórias grotescas de fortunas feitas com vendas de carne para a África e contas na Suíça com dinheiro depositado sem que se saiba a origem.” Só isso é o bastante. Fico por aqui.