Primeiramente, é bom que se defina o que é essa figura tão idolatrada pela nossa mídia tupiniquim e que a denomina de “mercado”. Dou um doce, desses feitos em restaurantes burgueses, de renome no mercado gastronômico, se o leitor responder, de pronto, sem maiores consultas livrescas, o que significa mercado. O nosso mercado, o mercadinho vulgar, sem grandes parafernálias conceituais, onde se compram feijão, açúcar, carne bovina, suína, ou a nossa rubiácea, dele temos conhecimentos pragmáticos. Até porque a necessidade nos obriga a ir até ele matar as nossas carências. Fica bem na esquina. Pra lá se vai, na certeza de que, se os preços estiverem bem controlados, o que pode ocorrer com a cesta básica, não há problema, podendo ou não influenciar no destino de nosso voto. Os preços podem fazer com que a gente mude de opinião, ora para direita ou esquerda.
Mas o mercado – essa figura fantasmagórica, cantada em verso e prosa pelos nossos analistas econômicos e políticos – voltou a manifestar os seus desejos eleitorais. Com a, diga-se, para não deixar dúvida, trágica morte de Eduardo Campos, presidenciável do PSB, li num dos nossos jornais que o “mercado torce para que a ex-senadora (Marina) seja candidata”.  Dentro da noticia, consta que “o mercado financeiro aposta que a presença da ex-senadora na disputa aumenta as chances de um segundo turno”. O mercado, que não tem nada de besta, é uma espécie de Django, rápido no gatilho, para defender seus interesses econômicos, não diz que o segundo turno, sonhado, almejado e querido, não é entre as candidatas, explicando melhor, entre a ex-senadora e a presidenta Dilma, mas entre Aécio Neves, que anda fraquíssimo das pernas, precisando de muletas, e a candidata do PT. Recorre ao discurso do fracasso. Lembrem-se da eleição de 2002, em que o esperto mercado levantou a seguinte questão, defendida por outro espertalhão, o arquimilionário e megainvestidor George Soros: “Ou Serra ou o caos”. Resultado: nem Serra, nem o caos. O mercado ficou com as suas previsões catastróficas e continuou a ganhar dinheiro. E muito.
Lembram de Mário Amato? Se não se lembram, faço questão de lembrar. Mário Amato é homem de mercado. Tem hoje mais de 90 anos de idade. Continua riquíssimo, graças a Deus. Melhor: graças ao mercado. Foi presidente das famosas FIESP e CNI – Federação das Indústrias do Estado de São Paulo e Confederação Nacional da Indústria. Em 1989, manifestando a voz soturna do mercado, em razão da eleição presidencial, disse: “Se Lula for eleito, 800 mil empresários deixarão o País.” Sempre a voz mórbida do mercado a espernear bravamente para preservar o seu dinheiro, alavancando o seu lucro. Tanto é verdade, e direi quase absoluta, que um economista, desses ligadíssimos ao mercado, propôs esta desumana equação para conter os preços: – O governo deveria fazer uma política focada na geração do desemprego, ou reduzir o ganho dos trabalhadores. Justificativa: o custo social está muito alto. É a crueldade mercadológica.
Mas, tentou-se definir o que é mercado. Pierre Rosanvallon, um francês, como o nome bem o diz, doutor em letras, ciências humanas e econômicas, um sujeito de reconhecida sagacidade, no seu livro O liberalismo econômico – história da ideia de mercado, diz que a noção de mercado realiza o ideal de autonomia dos indivíduos ao despersonalizar a relação social. Quer ele dizer que mercado é o modelo de uma organização anti-hierárquica, sem que haja qualquer intervenção na tomada de decisões. Desse conceito, deduz-se que ninguém deve mexer na vida do mercado. Ele é imexível, conforme neologismo que ficou muito popular num passado não tão passado. Assim, só as leis do mercado podem intervir no sacrossanto mercado. Se houver riqueza, as leis do mercado regulam e a distribuem. Se houver pobreza, do mesmo modo. Enfim, desnecessárias regras de regulação política e econômica. O mercado resolve tudo. Para o mercado, o programa bolsa família é um reles assistencialismo. Ele mesmo elimina as desigualdades. Deve-se ser paciente e esperar. 
Considerando todas essas inquietações do mercado, parece que as coisas não estão tão pretas assim. Pelo menos, na nossa pátria amada. O banco Itaú, a maior instituição financeira do Brasil, lucrou no segundo semestre deste ano a quantia de R$ 4,899 bilhões. Para quem reclama, não se trata de um lucro mixuruca. Bradesco, o segundo maior banco do país, não ficou muito pra trás e teve um lucro de R$ 3,778 bilhões.  A General Motors, apesar da choradeira do mercado (que chora de barriga cheia), anunciou um investimento no país de R$ 6,50 bilhões, nos próximos cinco anos. Talvez por isso, em que pese o mercado, preocupado em ter o seu candidato no segundo turno (e as últimas pesquisas estão negando essa pretensão mercadológica), o Brasil criou, sem tirar direitos sociais dos trabalhadores, no ano de 2013, 1,49 milhão de vagas no mercado de trabalho formal. Se bancos, que lucram tanto, empregassem e não se automatizassem na mesma proporção, a geração de empregos formais seria bem maior. Mas o mercado é o mercado. Deve ser livre, pouco importando a miséria social que semeie em torno de si. Seus interesses nem sempre coincidem com os dos falíveis eleitores.