Absorto, como sempre o faço, estava fazendo a leitura da revista CartaCapital, que tem à frente esse bravo e combativo jornalista Mino Carta, e inteirava-me dos fatos que as outras semanárias escondem. Fiquei sabendo que a nossa pátria amada se encontra em depressão econômica, embora o meu bolso já tivesse sentido o impacto cruel dessa situação que tem atingido milhões de brasileiros, ora desempregados, ora subempregados, ora na informalidade, e ora no ora, ora. Fiquei ainda sabendo que o ministro do STF, Alexandre de Moraes, determinou a baixa às instâncias judiciais, de Minas Gerais, o inquérito que envolve o senador tucano Aécio Neves, seguindo o rastro do ex-governador tucano Eduardo Azevedo, cuja ação de improbidade, depois de desaforada, tramitou na jurisdição estadual, por cerca de onze anos, e só agora, parece (?!), chegou ao fim. Já a de Lula, se se fizer um comparativo do seu tempo de tramitação, considerando todos os recursos processuais utilizados, durou um quase nada, somado à decisão do TRF. E, segundo dizem (os nossos jornais), após esse conturbado julgamento, voltou o TRF a assumir a lerdeza de uma tartaruga cansada.
Mas não é bem disso que quero falar. Uma outra notícia, ao lado da página da CartaCapital, me chamou a atenção. Dizia o tópico Legado e delegado: "O ministro da Secretaria do Governo, Carlos Marun, da tropa de choque de Eduardo Cunha, tem feito ameaças a torto e a direita. 'Nenhum candidato terá apoio do MDB se não defender o legado de Temer'." O autor do texto jornalístico, na atroz duvida que de inopino o assaltou, pergunta: - Qual é o legado, ministro Marun?
Na mesma dimensão, essa dúvida me consumiu e teima em provocar a minha perplexidade. Mas não farei menção à Polícia Federal, como o jornalista sugeriu, até porque sei que certas pessoas são inatingíveis, talvez pelo feliz fato de não ter aparecido no caminho de alguma delas um tríplex. Mas deixa isso pra lá.
Para entender a ameaça do ministro Marun, figura folclórica e de têmpera bajulatória, sempre presente nos momentos históricos de exceção, como é o caso agora - e algumas se notabilizaram na ditadura civil-militar de 64 - se faz necessário ter-se uma levíssima percepção do que seja legado. Trata-se de uma expressão que vem do Direito romano, cuja grafia latina é legatus. Representa aquilo (bens) que a pessoa deixa para alguém em testamento, sendo este um ato solene de última vontade, que institui herdeiro, dispondo sobre seu patrimônio. Assim, o beneficiário, a ser apoiado, seria esse possível herdeiro instituído, que defenderia o legado de Temer. Aí, sem nenhum preconceito, pois faço apenas uso de uma figura de linguagem, é que a coisa fica preta. Como encontrar resposta para a simples pergunta formulada pelo escriba de CartaCapital? Se não for difícil, em que pese a ameaça do ministro Marun, é deveras impossível.
O Brasil tem milhões de desempregados. Será esse o legado a ser defendido? Fez-se uma reforma trabalhista, sem dialogar com os trabalhadores, para atender à elite capitalista. E nada de positivo saiu dessa reforma, a não ser a informalidade. Esse também é o legado a ser defendido? Os grupos econômicos continuam ganhando oceanos de dinheiro, numa economia financeirizada, sem nenhuma contrapartida ao emprego e ao salário. Como defender esse legado? A indagação que se impõe é: quem quer ser herdeiro ou legatário dessas crueldades do desgoverno Temer? Bem. Algum sádico, que goza com o sofrimento dos outros, ou algum masoquista, que sente prazer em sofrer.
A mim veio a lembrança de dois fatos. O primeiro deles é que o carvão voltou a ser utilizado pelas nossas pobres famílias, em vista do aumento avassalador do gás. Ah!, suspiro, tempos idos, em que saía de casa para comprar o carvão de varinha. O gás ainda era um produto para os privilegiados. Talvez aí esteja o legado: uma volta saudosista ao passado. Temer está a realizar a reforma do tempo: transformando trabalhador em escravo e ativando as nossas vetustas carvoarias. O outro fato, só pra finalizar, é que o legado a ser defendido, para ter o apoio do MDB (cuidado, hem?!, esse MDB é apenas um engodo, nada tem a ver com o bravo MDB de Ulisses Guimarães), é fazer a defesa da reforma da casa de sua filha, a eminente psicóloga Maristela Temer, que pagou, mas não sabe a quem nem quanto. Para sorte de Maristela, é apenas uma casa, e não um tríplex. Conclusão: esse é um legado e tanto, para constar na plataforma do candidato. E haja apoio!
* Membro da AML e AIL.
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