Uns – e não são poucos – dizem que sim. Outros, muito fiéis ao sentido transcendental desse sentimento, afirmam que não. A dúvida sobre esse ser ou não ser do amor tem provocado as mais acaloradas discussões, sobretudo no campo filosófico, psicológico ou, mesmo, da religiosidade. Antes de recorrer aos nossos consagrados poetas, que podem nos dar uma mãozinha na solução desse intrincado problema existencial, quero dizer-lhes que sou adepto dos que pensam na eternidade do amor, enquanto quem ama estiver trocando passos, ainda que trôpegos, nessa terra de amores e de muitos desamores. Mas não sofro do fanatismo irracional, a ponto de condenar quem transforma esse nobre sentimento num recurso novelístico como estratégia de conquistar o incauto ou incauta para o harém.
Paulo Mendes Campos, um misto de cronista e poeta, na crônica O amor acaba, não deixa pedra sobre pedra, para afirmar que o amor acaba, “numa esquina, por exemplo, num domingo de lua nova, depois de teatro e silêncio (...) e acaba o amor no desenlace das mãos no cinema, como tentáculos saciados, e elas se movimentam no escuro como dois polvos de solidão; como se as mãos soubessem antes que o amor tinha acabado (...) nos roteiros do tédio para o tédio, na barca, no trem, no ônibus, ida e volta do nada para o nada (...) na janela que se abre, na janela que se fecha (...) às vezes o amor acaba como se fora melhor nunca existido (...) no álcool (...) em todos os lugares o amor acaba (...) por qualquer motivo o amor acaba; para recomeçar em todos os lugares e qualquer minuto o amor acaba”. Inconformado com esse discurso que decreta a finitude do amor, Alcione Araújo, em outra crônica diz: O amor começa. E começa ‘com o olhar que se ergue inocente do jornal e encontra dois olhos iluminados que esperam”. E também começa “ao se virar a esquina e estacar, súbito, diante de um rosto, que não é apenas rosto, mas a serenidade de um oásis, exalada de um sorriso”, ou ainda quando “se chega antes da hora marcada e ouve-se a reclamação pelo atraso”. E eu direi, na simplicidade que deve ser o amor: o amor começa quando se ama. Quando o “eu te amo” está no olhar e no gesto, e não novelizado pela expressão de um simples e precário dizer, como se fosse um prestar contas.
O amor acaba? Ou apenas começa? Paulo, um dos seguidores de Cristo, ao escrever aos coríntios, afirma, com extrema veemência, que o amor jamais acabará. Porém, o amor de Paulo se assenta em alguns pressupostos diferenciados das nossas humanas limitações. É paciente. Benfazejo. Não é invejoso. Não se incha de orgulho. Não faz nada vergonhoso. É desinteressado. Não se azucrina. Muito menos se alegra com a injustiça sofrida pelo outro. E, ainda por cima, fica alegre com a verdade. Segundo Paulo, o amor tudo perdoa, tudo crê, tudo espera e tudo suporta. Concebe o amor numa dimensão universal, despido de qualquer roupagem do egoísmo. Por isso mesmo, eterno, porquanto destituído do vício da vulgaridade.
Numa visão telúrica, Vinícius de Moraes, o poeta do Soneto da Fidelidade  e das paixões, que tanto cantou o amor, da experiência de suas nove mulheres, disse-o ser eterno enquanto dure, e, a partir dessa premissa, ressaltou o sentido efêmero de amar ou ser amado, ou seja: ratificou a eternidade transitória. Um amor paradoxal, porquanto passageiro.
Mas e o amor de mãe é eterno enquanto dure? Ouso responder que não. Só a morte tem o poder de liquidá-lo. E, ainda assim, em parte, porque este amor tem a força da eternidade. Fica. Esse amor tem a ousadia de desmentir o poeta Vinícius. A mãe ama com a alegria e a força das amantes exacerbadas, com a sofrência da perda do último mortal da face da terra e dilaceradamente, na defesa da proteção do filho, mesmo que o filho amado lhe vire as costas no momento de sua maior carência e aflição. É o sentido do eterno. E quanto dura?!
Mas amar a mulher amada é algo passageiro ou é eterno, enquanto dure? Se for passageiro, fugaz, o amor acaba num mero desentendimento. Restarão apenas as consequências jurídicas do desenlace. Mas uma coisa é sentir o amor, que se sustenta na materialidade, como a atração sexual, que infelizmente se vai diluindo e desaparecendo com o tempo, porque ninguém é de ferro. Outra coisa é viver o amor; é o querer amar; é o querer estar com a pessoa amada, independentemente da cama ou do transitório orgasmo. Por isso, a farsa do amor de fachada, explosivo de carinho em público e violento na intimidade. Ou o da mesa de bar, saturado de futilidades passageiras. Todas essas fantasias se vulgarizam com exíguo tempo da inexorável separação. Os que se amam, se admiram nos defeitos (com as célebres ressalvas) e nas virtudes (sempre enfatizadas). O amor se eterniza, sempre, no dar e no receber, liberto da autossuficiência do orgulho – esse veneno desagregador.
Caminhando pela vida, conheci alguns amigos e amigas que tinham uma facilidade imensa de amar. Num simples olhar,  já se contaminavam pelo vírus do amor. E amavam. E como amavam!! Esgotavam-se todas as suas possibilidades de amar. E mudavam de amor. De tanto que amaram, vivem só, na fatídica solidão do excesso de amar.
Outras pessoas, menos aquinhoadas dessa compulsão, demonstravam certa dificuldade de amar. Mas, quando amavam, eram de uma volúpia e fidelidade inesgotáveis. Nada semelhante a Romeu e Julieta, cujo amor foi brutalizado pela tragédia. Não. Nada igual. Eternizaram o seu sentimento de amor, seguindo o cânone cristão de que o que Deus uniu o homem não separa. E vivem, segundo afirmam, com certa veemência, muito felizes, aguardando o amor acabar, mas parece que este insiste na efêmera eternidade de mantê-las unidas.
P.S. Por este mês de julho, entro de férias. Retorno em agosto.