Aureliano Neto*
Estive, por longo tempo, afastado deste espaço, que há mais de dois anos venho ocupando dominicalmente, procurando, numa conversa corriqueira e fácil, manter com os leitores um diálogo sobre os mais diversos assuntos. De um momento para outro, sem prévio aviso, nem para mim mesmo, foi obrigado a afastar-me. Nem tempo tive de manter contato com o meu amigo editor Coló, para preavisá-lo das impossibilidades. Então, sumi. Motivo: adoeci, e adoeci gravemente, tendo passado mais de vinte dias em UTI, de São Luís e, posteriormente, de São Paulo, onde me encontro convalescendo. A luta para recuperação da saúde tem sido dura. Graças a Deus, com a ajuda da família e dos amigos, que têm feito correntes de orações. A família tem se constituído no meu ponto de apoio. Jacirema, minha mulher, e os filhos, incansáveis. De outro modo, não sei se teria atravessado o Rubicão. Mas estamos aqui. Oxalá, voltando à nossa conversa aos domingos. 2011 chega ao final. Estamos a ingressar em 2012. Um novo ano, que o Brasil inaugura como a sexta economia do mundo, desbancando o Reino Unido e caminhando celeremente, afirmam os economistas, para quinta posição.
O mundo está a viver grandes mudanças. A queda das seculares ditaduras messiânicas ou não nos países árabes é um indicativo dessas transformações. O povo luta pelo exercício da liberdade. Ao lado disso, vê-se na Coreia do Norte o simulacro do funeral do ditador Kim Jong-il, em cenas mostradas pela televisão oficial, em que há desmedido excesso de lamentações. Algo inacreditável, mas as cenas são reiteradamente mostradas pela televisão oficial. Em outro momento, na embate pela liberdade, no Líbano, o povo não teve complacência de Kadafi. Matou-o de um modo cruel, sem dar ouvidos ao seu pedido de clemência. O seu corpo ficou exposto, como uma espécie de troféu e, ao mesmo tempo, demonstração de que o mal fora definitivamente extirpado. E o avanço libertário, nesses países, continua. A mim parece que até a queda de uma imaginária Bastilha.
Pois é, um pouco de mim, como justificativa da ausência, e também um pouco do que está ocorrendo no mundo, com reflexo a ser sentido no ano de 2012.
Em terras brasileiras, os assuntos de fim de ano são quase inexpressivos. A não ser o mais recente, que teve como um dos protagonistas o jogador Adriano e, no outro lado, a passageira ou acompanhante Adriene, que insistia que fora jogador que, sentado no banco de trás, manuseara a arma, que, disparando, atingiu a sua mão. Bem, esse fato teve tratamento de destaque como se Adriano tivesse cometido um gravíssimo crime e, conforme disse o delegado da investigação, em entrevista dada às televisões, algumas pessoas já estavam com a sentença condenatória pronta e assinada, e só aguardavam o momento de publicá-la. Mas, na hora agá, ouvidas as testemunhas, que afirmavam que Adriano estava no banco carona da frente, feita a reconstituição e acareação, ante as evidências irrefutáveis, a "vítima" não teve outra alternativa a não ser desmentir-se. E foi o suficiente para o fato escafeder-se do noticiário, uma vez que o que interessava, era imputar-se a culpa a Adriano, que, como é de todos sabido, já tem dedo queimado.
A par disso, ou por falta de assunto ou porque o debate exige maior atenção, estabeleceu-se uma crise entre o Supremo Tribunal Federal e a Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça, em face de decisões dadas pelos Ministros Marco Aurélio e Ricardo Lewandowski, estabelecendo limites constitucionais para atuação do CNJ. Primeiramente, deve ser dito, sem deixar nenhum resquício de dúvida, que inexiste crise ou disputa entre CNJ e Supremo Tribunal Federal. O STF é o guardião da Constituição Federal. É o órgão que, havendo dúvida quanto à aplicação do texto constitucional, dá a palavra definitiva sobre constitucionalidade ou inconstitucionalidade, ou, ainda, como deve ser aplicada a norma infraconstitucional em vista do preceito insculpido na Carta Republicana. Por outro lado, deve ser enfatizado, que o próprio Supremo, em decisão do plenário, já afirmou, de forma peremptória, que o CNJ é "órgão eminentemente administrativo", não exercendo qualquer atividade jurisdicional. Desse modo, não há entre STF e CNJ conflito de qualquer natureza, a não na cabeça de alguns idiotas. Deve ser dito: o Supremo, no que diz respeito à guarda e interpretação da Constituição, é o Supremo. Por isso, Supremo. O CNJ é apenas um órgão administrativo que integra o Judiciário. Não é, por si só, o Judiciário, como está pretendendo ser. Aliás, esse é o seu grave problema.
Uma revista semanal (Veja, n. 2249), num texto, em que trata do excesso do CNJ, com referência a essa caça doentia às bruxas, mesmo por meras suposições, faz a seguinte dedução: "O perigo para a democracia, porém, é tornar um mero cidadão suspeito só por ser juiz." Ninguém quer, nem se afirmou isso em lugar nenhum, que um juiz incorreto, ímprobo, não seja fiscalizado e, coligidas as provas, mediante o devido processo legal, seja punido. Mas, por outro lado, um juiz intimidado, atemorizado, em face da sua atividade jurisdicional, é, do mesmo modo, um grave problema para o livre exercício da jurisdição e para o Estado de Direito. Se CNJ deve exercer a fiscalização no varejo. As Corregedorias devem restringir as suas atividades a meras administradoras de fóruns. Ou, de outro modo, não suba o sapateiro além das sandálias.
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